Mortes: Pai dos 'rios voadores', desvendou as chuvas na Amazônia

Eneas Salati morreu enquanto dormia, aos 88 anos

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São Paulo

Apaixonado por água, o engenheiro agrônomo Eneas Salati tem o nome gravado em importantes estudos sobre hidrologia e climatologia.

Eneas pesquisou a origem da salinização das águas subterrâneas do Nordeste brasileiro e depois seguiu para a Amazônia, segundo a engenheira ambiental Eneida Salati, 62, sua filha.

No Cena (Centro de Energia Nuclear na Agricultura), ligado à Esalq-USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo), Eneas trouxe do exterior o primeiro espectrômetro de massa da América Latina.

Eneas Salati (1933-2022) e a esposa Theresinha Zurk Salati
Eneas Salati (1933-2022) e a esposa Theresinha Zurk Salati - Arquivo pessoal

O pesquisador foi cofundador do centro em meados de 1968 e lá construiu o Laboratório de Espectrometria de Massa para Elementos Leves.

Em seu currículo também constam projetos sobre distribuição de energia solar no estado de São Paulo e no Brasil.

"Eneas foi o homem que desvendou os mistérios das chuvas na Amazônia. Seus primeiros trabalhos foram desenvolvidos no final da década de 1970 com uma tecnologia naquele momento nova. Ele usou os conceitos de reciclagem de umidade, como a vegetação evapora, transpira e contribui com a chuva local e desenvolveu a metodologia para identificar a assinatura dessa chuva", afirma o climatologista José Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais).

José foi inspirado a estudar o clima na Amazônia após ler um artigo de Eneas Salati. Na época, ainda era estudante. Quando veio ao Brasil, nos anos 2000, foi trabalhar com o pesquisador em suas linhas de pesquisa.

Depois Eneas começou a trabalhar com os rios voadores. "A atmosfera também tem vapor de água. Se você convertê-lo em líquido, esse líquido é transportado pelos ventos fortes da Amazônia, os que vêm do Atlântico, se encontram nos Andes e depois viram para o Sudeste. É como se fossem rios, pela velocidade de ventos muito alta. Esse volume é muito similar ao do rio Amazonas. Aí veio a ideia de rios —pela velocidade e pelo volume de água; voadores porque está no ar", explica.

Nascido em Mombuca (a 157 km da capital paulista) e registrado em Capivari (a 137 km da capital), Eneas era o caçula entre dez filhos.

"Ele cresceu na área rural e depois veio para Piracicaba. Aprendeu a ler muito cedo e ensinou as sobrinhas que tinham idade aproximada a sua. A família era grande. A infância dele foi feliz", conta Eneida.

Engenheiro agrônomo pela USP, onde também fez doutorado e obteve livre-docência, dirigiu o Cena de 1981 a 1985, o Instituto de Física e Química da USP, em São Carlos, de 1976 a 1979, e o Inpa em dois momentos: de 1979 a 1981 e de 1990 a 1991.

O pesquisador também foi diretor técnico da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável, assessor do Banco Interamericano de Desenvolvimento e consultor do Banco Mundial e da International Finance Corporation. Ao longo da carreira, publicou 146 trabalhos.

Eneas era espírita. Considerado um homem bondoso, equilibrado e atencioso, gostava de ajudar o próximo. Ao longo da trajetória, influenciou e serviu de inspiração a muita gente.

"Ele tratava todos de igual para igual. Acho que tratava as pessoas como os filhos. Vinha do coração", diz Eneida.

Preocupado com a palavra, sempre conscientizou os filhos sobre a importância de saber como ela reagiria nas pessoas. Orientava a nunca julgar e criticar antes de saber as razões do outro.

Eneas Salati havia sido diagnosticado com doença de Alzheimer leve há alguns anos. A saúde começou a debilitar após um tombo. Morreu dormindo, no dia 5 de fevereiro, aos 88 anos. Deixa a esposa, quatro filhos, netos, bisnetos e um trineto.

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