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Pesquisa indica que imprensa brasileira reconhece ganhos das Leis de Cotas

Apesar de defender em editoriais que cotas sejam baseadas apenas em fatores socioeconômicos, a Folha foi o jornal que mais publicou trechos favoráveis ou sem posicionamento evidente

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São Paulo

Um relatório elaborado por pesquisadoras da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná, indica que a imprensa brasileira reconhece as conquistas da Lei de Cotas. Foram analisadas publicações de nove veículos, entre os quais a Folha.

Cerca de 89% das 103 publicações foram feitas entre janeiro e novembro de 2021 (último mês de análise). As demais têm datas que variam de julho de 2017 a outubro de 2020. A maior parte das publicações de 2021 se deu nos meses de outubro (16) e novembro (35), sendo este o mês da Consciência Negra, cujo ponto facultativo é o dia 20, que tem, inclusive, a maior soma de publicações (9).

Para analisar de forma qualitativa as amostras, ou seja, como a Lei de Cotas foi abordada, se positiva ou negativamente, os pesquisadores concentraram esforços nas publicações de janeiro a novembro de 2021, descartando 28, entre as quais estavam as de períodos anteriores e outras que tinham formatos como podcasts ou se tratavam de textos ficcionais.

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Campus da Uerj, no Rio; universidade estabeleceu uso de cotas nos anos 2000 - Adriano Vizoni - 16.ago.17/Folhapress

Entre todos os veículos, a Folha foi a que mais teve publicações no período. Foram 21 reportagens. O segundo veículo com mais produção sobre a Lei de Cotas foi o portal G1, seguido pelo R7 e pelo UOL.

Para o supervisor do estudo e pesquisador da ABPN (Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as), Delton Aparecido Felipe, movimentos negros brasileiros veem a imprensa como um terreno de disputa importante para promoção do debate sobre pautas sociais e raciais.

"Nós temos a imprensa como um terreno de disputa, de luta por ideias. Devemos reconhecer a mídia jornalística, porque ela tem um impacto e é um dos lugares por onde as pessoas se informam sobre as questões sociais. A imprensa profissional continua tendo o seu papel fundamental nesse debate [sobre cotas]".

Para analisar as reportagens, os pesquisadores selecionaram os trechos das reportagens que tratam de cotas (107) e de outros assuntos relacionados (34), como diversidade e representatividade, por exemplo. Os trechos selecionados foram classificados como sendo favoráveis, contrários ou sem posicionamento explícito.

"Cabe destacar que a classificação dos trechos como favorável, contrário ou sem posição explícita tem um caráter de arbitrariedade de modo que, como dissemos antes, o intuito foi tentar precaver possíveis argumentos que são mobilizados numa discussão favorável ao tema, mas isolados podem fomentar, contraditoriamente, posições opostas", diz o relatório.

Dos 107 trechos analisados e que tratam diretamente sobre cotas, 60,7% traziam argumentos interpretados pelos pesquisadores como sendo favoráveis às cotas. Apenas 10,28% dos trechos traziam argumentos contrários e 28,9% não tinham posicionamento evidente.

Quando as leis 12.711 (cotas no ensino superior público) e 12.990 (cotas nos concursos públicos federais) são diretamente citadas, os trechos favoráveis representam 64%. Outros 9,3% são contrários e 26,7%, sem posicionamento evidente.

Todos os trechos de reportagens e textos de opinião de colunistas ou convidados da Folha foram categorizados como favoráveis ou sem posicionamento evidente.

Ao ser questionado se achava paradoxal as publicações positivas do jornal em relação a cotas raciais e à posição do jornal em editorias de que as cotas sejam baseadas apenas em fatores socioeconômicos, Delton Aparecido afirma que os movimentos negros esperam da Folha um posicionamento direto a favor das cotas com critério racial.

"Quando a Folha não se posiciona abertamente como ela fez antes, ao dizer ser contrária as cotas raciais, fica aquela sensação para os diversos movimentos sociais de que a Folha tende a não ser antirracista da forma como esses movimentos desejam. No entanto, temos que admitir que nos últimos anos a Folha tem aberto mais o seu espaço para intelectuais e jornalistas negros. Isso tem favorecido a ampliação do debate sobre as questões sociais, não somente sobre as cotas, mas sobre as questões raciais."

Além da análise de posicionamento sobre cotas, os pesquisadores investigaram os argumentos dos trechos destacados, ao que chamaram de "chaves de leitura".

A principal chave de leitura aborda revisão ou atualização da Lei de Cotas, com 16% do total, seguida por trechos explicativos ou de contextualização (11%), falta de efetividade de cotas e/ou política de permanência (11%), reparação histórica e/ou representatividade (11%) e efeito das cotas no acesso às universidades, pós-graduação ou concursos públicos (10%).

A criação do Ifer (Índice Folha de Equilíbrio Racial) em 2021 contribuiu para a quantidade de reportagens do jornal sobre cotas raciais e assuntos relacionados. Isso porque um dos pilares do índice criado pela Folha e desenvolvido pelos economistas Sergio Firpo, Michael França e Alysson Portella, do Insper, é a educação, que foi tema da série de reportagens A Cor da Desigualdade no Brasil, produzida com os dados inéditos obtidos.

Em junho de 2021, o Ifer mostrou que 23 unidades federativas haviam se tornado mais racialmente equilibradas entre 2014 e 2019 e que o Brasil pode atingir um nível de equidade entre negros e brancos no ensino superior em pouco mais de uma década caso o ritmo de aumento na inclusão racial se mantenha.

Sobre o Ifer, Delton Aparecido diz que produtos como esse, assim como reportagens que discutem cotas raciais, colaboram significativamente com a sociedade ao reforçar que "o objetivo das cotas raciais é combater o racismo e que, ao combater o racismo, também se colabora para a diminuição das desigualdades".

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