Batalha de rimas gera duelo entre prefeitura e MCs em São Bernardo (SP)

Organizadores reclamam de repressão da GCM; prefeitura afirma que lei não permite equipamento de som

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São Paulo

Desde 2013, um grupo de jovens se reúne toda terça-feira na praça central de São Bernardo do Campo para realizar uma batalha de rimas. Mas, desde que eles voltaram às atividades presenciais, a presença de agentes da GCM (Guarda Civil Municipal) tem dificultado a realização do evento.

A Batalha da Matrix, como é conhecida, é um tradicional evento da região que atrai cerca de 1.000 pessoas uma vez por semana, a partir das 19h30, para acompanhar um duelo de rimas. No final da noite, há sempre um vencedor.

Em destaque, dois jovens estão em cima de um pequeno palco com duas caixas de som. Um deles segura um microfone. Ao redor, há uma multidão.
Prefeitura de São Bernardo do Campo tenta impedir a realização da Batalha da Matrix, tradicional batalha de rimas da cidade; evento acontece desde 2013 na praça central, em frente à igreja da Matriz. - Adriano Vizoni/Folhapress

Segundo Eder Alexandre, 34, um dos organizadores, em dezembro a organização enviou um ofício para a prefeitura informando que iria retomar as atividades e foi notificada que não estava autorizada a realização do evento. A princípio, a volta seria em janeiro, mas, por causa do agravamento da crise sanitária, ela foi transferida para abril.

"Neste primeiro contato, a Secretaria de Segurança simplesmente negou e falou que não autorizaria o evento. Sem explicação, há apenas um email do comandante da GCM dizendo que na reunião o secretário falou não", afirma Eder Alexandre.

"A Secretaria de Cultura disse que apoia o evento, mas também não quis se comprometer e não deu nenhuma autorização legal", completa.

Procurada, a Prefeitura de São Bernardo afirmou que o uso da praça é livre e que os agentes da GCM vão ao local apenas para impedir o uso de drogas e a venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos. Disse ainda que a legislação municipal veta o uso de caixas de som nesse tipo de evento.

Mesmo sem o aval da prefeitura, no último dia 12 de abril, os organizadores resolveram retomar os encontros, e desde então a GCM ameaça apreender o equipamento de som.

"Esta história é antiga e já teve vários contextos, mas hoje em dia eles [GCM] estão argumentando que a gente não tem autorização para ligar o sistema de som e usar a energia elétrica", afirma Lucas Fonseca do Vale, 30, produtor cultural e um dos fundadores da batalha.

Segundo Eder Alexandre, a Batalha da Matrix só quer exercer o direito de ocupar o espaço público. "É um direito que existe na Constituição Federal e a gente luta por ele", afirmou.

O embate com a prefeitura é antigo e já passou por diversas gestões municipais, segundo Eder Alexandre. Em 2016, após uma forte repressão, os dois lados chegaram a um acordo e foram estabelecidas algumas regras, como o limite de horário, até as 22h —que tem sido cumprido desde então.

Mas, com a retomada este ano, todas as noites do evento têm sido tensas. "Eles alegam que tem violência tráfico de drogas, menor bebendo e usando droga, só que a gente já expôs uma tentativa de ter um plano de utilidade para esta praça e eles simplesmente negligenciam isso", afirma Vale.

"Eles sempre trataram a gente como um movimento de bagunça e não um movimento cultural", afirma Diogo de Brito, 33, produtor cultural e também fundador da batalha.

Segundo ele, a Batalha da Matrix nunca foi contra a GCM, e eles entendem a importância da presença dela para a segurança dos participantes e ouvintes. "Sempre procuramos um diálogo para trabalhar junto e não ter tráfico de drogas, por exemplo. A minha mãe vem para a batalha e eu não gostaria que ela fosse assaltada quando estivesse saindo", concluiu.

Procurada, a Prefeitura de São Bernardo informou em nota que a utilização de praças é livre . "A realização de eventos, no entanto, depende da autorização da administração municipal, conforme previsto em lei. Sobre o evento Batalha da Matrix, que ocorre há anos na cidade, a prefeitura presta apoio, por meio da Guarda Civil Municipal, com intuito de evitar o consumo de bebidas alcoólicas por menores de idade e o uso de drogas, como ocorria no passado", disse.

"A GCM mantém sua presença justamente visando esse controle, uma vez que materiais com apologia ao uso de maconha foram distribuídos no local. A corporação também não autoriza a utilização de equipamentos de som, como forma de evitar transtornos aos moradores do entorno", afirmou.

A Folha também questionou a gestão municipal sobre a abordagem de jovens no último evento ocorrido na noite de terça-feira (26) e a prefeitura informou que "os indivíduos foram levados à delegacia após serem flagrados consumindo drogas".

"A administração reafirma seu interesse em dialogar, como já foi feito, com oferta de outros espaços públicos que não levem desconforto à vizinhança ou ao trânsito do entorno", completou.

Eder Alexandre, um dos responsáveis pelo evento, disse que o cartaz com apologia à maconha não foi distribuído pelos organizadores e que eles não compactuam com nenhum tipo incentivo ao uso de drogas.

"Acreditamos que esses problemas são problemas de saúde pública. Inclusive, a batalha atua nessa prevenção com rodas de conversa com psicólogas e assistentes sociais, que são levados até a batalha para tentar administrar este problema", afirmou.

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