Branquitude deve renunciar a privilégios, afirmam especialistas

Desigualdade racial foi tema do encontro Folha e Companhia das Letras

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Rio de Janeiro

Para combater a desigualdade racial, pessoas brancas devem renunciar a seus privilégios. É o que defendem os participantes do debate sobre desigualdade racial promovido pela Folha e pela editora Companhia das Letras, que ocorreu na última terça-feira (5).

Para Cida Bento, colunista da Folha e autora de "O pacto da branquitude" (Companhia das Letras), pessoas brancas sustentam um acordo não verbal para se manter nas melhores posições sociais. Esse acordo, que a psicóloga chama de "pacto da branquitude", reduz as oportunidades de pessoas não-brancas, que têm mais dificuldade de acesso à educação e ao mercado de trabalho.

Relatório do IBGE de 2021 mostrou que pessoas negras são maioria em empregos informais e de renda média menor, como no setor da agropecuária, construção e serviços domésticos. A pesquisa indicou que brancos ocupam ramos de salário superior, como o setor financeiro e da saúde.

Folha promoveu debate sobre desigualdade racial na última terça (5). Para os especialistas, brancos precisam renunciar aos seus privilégios para combater verdadeiramente a desigualdade racial no país
Folha promoveu debate sobre desigualdade racial na última terça (5). Para os especialistas, brancos precisam renunciar aos seus privilégios para combater verdadeiramente a desigualdade racial no país - Freepik

A falta de oportunidades gera uma sociedade para poucos, que naturaliza as dificuldades, segundo o economista Mário Theodoro. "Quando o país mergulha na branquitude, mergulha em um conjunto de valores nos quais a maioria não se encaixa."

O economista, autor de "A sociedade desigual", publicado pela Editora Zahar, defende que a falta de diversidade prejudica a elaboração de políticas públicas, que são feitas por um grupo de maioria branca que não reflete a realidade racial do país.

Em 2018, cerca de 24% dos 513 deputados federais eleitos se autodeclaram pretos ou pardos, segundo levantamento da ONG Transparência Partidária feito a pedido da Folha. O dado contrasta com o panorama geral da população, que, de acordo com a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do último trimestre de 2021, é de maioria negra, com cerca de 55% de pretos ou pardos.

Nas últimas eleições, em 2020, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) aprovou medida para que partidos distribuíssem o dinheiro público das campanhas proporcionalmente entre candidatos negros e brancos.

Na quarta-feira passada (30), a Câmara dos Deputados aprovou anistia a partidos que não cumpriram a determinação do TSE de repasse de verba a candidatos negros e mulheres nas eleições de 2020. A medida foi descumprida pela maioria dos partidos, como foi mostrado pela Folha.

Segundo Cida Bento, o respeito à legislação das candidaturas de pessoas pretas e pardas é fundamental para garantir a inclusão, apesar do movimento de partidos contra a medida.

Por outro lado, os especialistas veem aumento de outras iniciativas que visam reduzir a desigualdade racial. Cida Bento, que tem experiência como profissional de recursos humanos, afirma que instituições públicas e privadas têm tentado diversificar o quadro de funcionários, de maioria branca, com incentivos a profissionais negros.

A psicóloga diz que sempre observou um acolhimento especial para candidatos brancos em processos seletivos. "Hoje, aumenta o número de pessoas que dizem que não podemos continuar desse jeito."

Bento se coloca a favor das ações afirmativas nas organizações que promovem a inclusão de pessoas pretas, pardas e indígenas. "Uma coisa é fazer palestras sobre o que é racismo. Outra é ter metas para avaliar as medidas da instituição para incluir pessoas negras e indígenas. As cotas definem metas a serem alcançadas; senão, as empresas fazem mais do mesmo."

Segundo Mário Theodoro, as cotas seriam o único instrumento que o Brasil tem para lutar contra o racismo. Apesar disso, as mudanças que ocorreram nos últimos anos são insuficientes, defendeu.

O economista afirma que as políticas públicas de redução das desigualdades devem sempre considerar a questão racial porque, caso contrário, as diferenças sociais entre brancos e negros podem aumentar.

Theodoro acredita que, a partir de 2016, houve um retrocesso na atenção do Estado às questões raciais, mas as pressões do movimento negro podem trazer essa pauta à tona. Segundo o economista, as eleições presidenciais deste ano devem ser definidoras nesse aspecto.

"Essa é uma das eleições mais polarizadas que já tivemos. Se um lado pode estar interessado no retorno das pautas raciais, o outro pode achar que isso é ‘mimimi’", afirmou Theodoro.

O evento completo está disponível no canal no YouTube da Companhia das Letras. O debate foi mediado por Victoria Damasceno, editora de Equilíbrio da Folha.

O pacto da branquitude

Preço: R$ 39,90 (152 págs.); R$ 27,90 (ebook)
Autor: Cida Bento
Editora: Companhia das Letras

A sociedade desigual

Preço: R$ 79,90 (448 págs.); R$ 39,90 (ebook)
Autor: Mário Theodoro
Editora: Zahar

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