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Descontentes com apps, passageiros optam por táxi em São Paulo

Aplicativo Vá de Táxi registrou aumento de 12% nas chamadas de fevereiro para março

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São Paulo

No fim dos anos 1980, Angélica emplacou o hit "Vou de Táxi". Na letra, ela avisa que vai encontrar com alguém, que está "morrendo de saudade" e que, é claro, o trajeto será feito de táxi.

Décadas depois do lançamento da música, ir de táxi caiu em um certo desuso. Isso porque a chegada de aplicativos de transporte mudou os costumes de quem costumava chamar um carro fazendo sinal nas ruas de São Paulo ou ligando para um ponto próximo.

Em SP, passageiros voltam a usar mais táxis. Na foto, passageiro faz sinal para chamar motorista na avenida Paulista
Em SP, passageiros voltam a usar mais táxis. Na foto, passageiro faz sinal para chamar motorista na avenida Paulista - Ronny Santos/Folhapress

No início, a comodidade e o baixo preço das corridas fizeram com que os aplicativos se tornassem mais interessantes para os passageiros. Porém, o recente aumento do valor das corridas e o constante cancelamento de motoristas têm levado passageiros a retornar ao táxi.

De acordo com dados do aplicativo Vá de Táxi, de janeiro para fevereiro deste ano houve crescimento de 15% no número de chamadas recebidas. De fevereiro para março, foi registrado novo aumento, desta vez de 12%.

Gloria Miranda, CEO da Vá de Táxi, atribui o quadro à queda de qualidade da concorrência, como a Uber. Ela diz que o aplicativo notou nos últimos meses um aumento de 5% a 8% das chamadas, o que a empresa relaciona à retomada de atividades presenciais e à insatisfação com o serviço prestado por concorrentes.

"Antes, a diferença entre o táxi e os apps girava em torno de 10% no preço. Hoje, está em 2%", diz Miranda. "A tarifa dinâmica deixa a corrida muito cara porque toda hora está chovendo ou [tem] trânsito em São Paulo."

O contador Murilo Moraes, 33, diz que passou a usar táxi em novembro de 2021, quando ele tentou chamar um motorista do Uber por cerca de uma hora e meia. Ele lembra que a corrida, pelo aplicativo, sairia por R$ 40 e, com o táxi, custou R$ 25.

"Subiu o preço da gasolina e os motoristas acabam escolhendo as melhores viagens. Como faço muito trajeto curto, ficou ainda mais difícil conseguir um carro", explica o contador, que vive na zona oeste de São Paulo.

Ele, que usa o serviço para viagens de lazer, afirma que deve continuar usando o serviço mesmo com o reajuste da tarifa dos taxistas de até 48,5%, que entrou em vigor neste sábado (2).

"Vou continuar usando porque não cancelam", diz. O valor inicial da corrida (bandeirada) passa de R$ 4,50 para R$ 5,50 (22,2%), e o custo por quilômetro rodado vai de R$ 2,75 para R$ 4 (45,4%) nas categorias táxi comum, especial e preto.

O autônomo Wesley Mendes, 23, passou por situação semelhante à de Murilo. Ele, que vive na zona sul paulistana e costumava usar o Uber para trabalhar ou ir à casa de algum amigo, tentou chamar um motorista pelo aplicativo para voltar para casa após um evento, em dezembro.

O preço que apareceu na tela o assustou. A ida até o local em que estava saiu por R$ 30, mas, como estava tarde e chovia, a volta custaria R$ 80. Cansado, ele aceitou o preço, porém tentou por cerca de uma hora conseguir um carro e nenhum motorista aceitava a chamada.

"Na mesma época, eu tinha comprado uma passagem de ônibus para Minas Gerais que havia custado R$ 90, quase o mesmo preço daquela corrida", diz ele. Depois das tentativas, ele encontrou um táxi e recebeu a informação de que o percurso que faria não passaria de R$ 30.

"Ultimamente, o táxi tem sido a minha primeira opção", afirma Wesley. Ele afirma não ter sentido diferença no bolso, pois, na maioria das vezes, o preço costuma ser semelhante.

Presidente do Sindicato dos Taxistas Autônomos (Sinditaxi), Luiz Carlos Capelo diz que, desde janeiro, tem notado um aumento de passageiros para sua categoria.

"Com os shows, hotéis cheios e exposição, a tendência é crescer", afirma ele, que considera ser difícil de calcular o aumento do fluxo. "Acabou a balinha, acabou a aguinha, o passageiro está enxergando a real situação do aplicativo e está retornando ao táxi."

Ailson Ferreira Costa, que é taxista há cerca de cinco anos e trabalha em um ponto na Vila Leopoldina, na zona oeste da capital, nota que a demanda de passageiros cresceu pouco antes do Natal.

Ele cita uma vantagem do táxi: o uso da faixa de ônibus, uma vez que o trânsito da cidade volta a atingir patamares pré-pandêmicos.

Apesar da alta demanda recente, Costa afirma que só será possível analisar se os passageiros vieram para ficar após o reajuste da tabela de táxi. "Não sabemos como vai ficar essa dinâmica ainda. Teremos uma noção melhor na semana que vem", diz.

Não são apenas pessoas físicas que têm migrado para o táxi. Coordenadora administrativa da Central Rádio Táxi, Juliana Leite relata que a cooperativa, que conta com mais de 400 veículos, tem recebido nos últimos meses empresas que antes forneciam aos funcionários apenas corridas de aplicativos.

"Os aplicativos entraram no mercado de transporte com as tarifas muito baixas, mas, hoje, as tarifas acabam sendo iguais e sem a segurança do táxi", avalia ela.

Para o consultor em mobilidade e transporte Sergio Ejzenberg, a troca de aplicativos por táxis afeta a vida de quem tem poder aquisitivo mais favorável.

"Do ponto de vista da mobilidade urbana, essa troca não muda em nada porque seguimos usando automóveis para viagens", diz Ejzenberg. A seu ver, para se pensar na mobilidade com segurança e com baixo custo, é preciso investimento do setor público no transporte coletivo.

Procurada, a Uber, principal empresa citada pelos entrevistados desta reportagem, afirma que a demanda caiu abruptamente devido às orientações de isolamento social com a pandemia. Em meio à vacinação e à retomada das atividades presenciais, segundo ela, pessoas que antes não usavam a Uber no dia a dia passaram a optar pelo aplicativo.

A empresa afirma que, com o cenário de demanda crescente de usuários, "clientes estão tendo que esperar mais tempo por uma viagem porque, especialmente nos horários de pico, há momentos em que há mais solicitações do que motoristas parceiros disponíveis para atendê-los".

Sobre a alta dos valores das corridas, a empresa esclarece que, em razão do aumento constante dos combustíveis, vem "intensificando esforços para ajudar os motoristas parceiros a reduzirem seus gastos, com parcerias que oferecem desconto em combustíveis, assim como tem reajustado os preços das viagens para aumentar os ganhos dos parceiros".

Além disso, a companhia afirma que lançou, em 2020, a modalidade Uber Taxi, hoje em funcionamento só na capital paulista. "O usuário pode pedir um táxi cadastrado na prefeitura por meio do app da Uber, da mesma forma como está acostumado a pedir viagens nas outras categorias."

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