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Polícia apreende crianças e adolescentes suspeitos de integrar gangue que age na Paulista

Meninos têm 11 e 12 anos e atuam no entorno da estação Trianon-Masp do metrô; dois maiores de idade também foram presos

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Menores de idade atacam rapaz na avenida Paulista Danilo Verpa/Folhapress

São Paulo

Grupos formados por crianças e adolescentes têm praticado roubos e furtos na região da avenida Paulista. Eles andam em turmas com oito ou nove meninos e abordam, principalmente, mulheres. Em geral, arrancam correntes e cordões dourados ou enfiam as mãos nos bolsos das vítimas em busca de carteiras e celulares.

Na manhã desta sexta-feira (8), quatro garotos de 11 e 12 anos foram apreendidos pela Polícia Militar após um desses ataques. Dois rapazes maiores de idade que estavam com o grupo também foram levados para a delegacia. Segundo a polícia, os menores de idade já tinham sido apreendidos antes e os maiores têm ficha criminal.

Foram encontrados um celular, correntes douradas, trouxas de maconha e R$ 180 em dinheiro.

O delegado Fábio Matsuo, do 4º DP, afirmou que os meninos foram apreendidos após denúncia de um motoboy que testemunhou o momento em que eles furtaram o celular de outro garoto na rua Vergueiro.

Três foram encaminhados para a Fundação Casa acusados de roubo e um aguardava a chegada dos responsáveis para ser liberado por ser menor de 12 anos, idade mínima para ser apreendido. Os adultos foram autuados por tráfico de drogas por portarem trouxas de maconha, segundo o delegado da 4ª DP.

A reportagem da Folha passou quatro dias na avenida Paulista e flagrou uma série de ataques praticados por garotos. Após os roubos e furtos, se a vítima reage, outros quatro ou cinco meninos se juntam para intimidar com xingamentos e ameaças de pedradas.

Na tarde desta quinta-feira (7), um menino de 10 anos arrancou a corrente de uma estudante que passeava pela Paulista e que não quis se identificar. O namorado da vítima conseguiu correr atrás do garoto, que ficou encurralado atrás de uma banca de jornal.

Outros meninos com idades entre 12 e 17 anos, que integram os mesmos grupos, apareceram e fingiram não conhecê-lo. Eles encenaram uma bronca no mais novo e o convenceram a devolver o colar e pedir desculpas.

O garoto, então, enfiou o dedo na boca, tirou o pingente em formato de coração que tinha escondido debaixo da língua e o devolveu à estudante. Ele também pediu desculpas.

Em seguida, pediu para o namorado da estudante lhe pagar um pastel de carne com queijo. Ele comeu o pastel e continuou em frente à estação Trianon-Masp.

Nos últimos três meses, houve aumento de crianças e adolescentes que vivem no vão livre do Masp, segundo a Prefeitura de São Paulo. "Na região do Masp, circulam em torno de 20 crianças e adolescentes por dia, com idades entre 10 e 17 anos", informou a administração em nota.

Conselheiros tutelares que atuam na região dizem que a avenida Paulista é escolhida por eles por causa do fluxo de pessoas com poder aquisitivo e também pela segurança. Em frente ao vão livre, há uma base da PM e câmeras de vigilância. Nenhum deles é da região central, segundo um conselheiro, o que dificulta o encaminhamento que deve ser feito em abrigo próximo da família.

O grupo de meninos está sempre acompanhado de pelo menos um adulto, que os observa de longe. Eles se reúnem nas ruas paralelas à avenida Paulista, para onde os meninos correm após cada ataque. Os jovens escondem as correntes e os pingentes furtados dentro da boca.

Essa dinâmica foi relatada pelo funcionário de uma lanchonete que não quis se identificar. Ele contou que chega a presenciar até 20 ataques praticados por menores de idade por dia, a maioria na parte da manhã, quando o policiamento na avenida é menor, segundo o atendente.

O funcionário também contou que os meninos ficam à espreita das vítimas nas escadas de acesso das estações de metrô, onde não têm câmeras de segurança.

No fim de cada manhã, após praticarem os furtos, eles andam até a praça da Sé, onde vendem os objetos na feira do rolo que acontece diariamente no local.

No percurso até a praça, passam pela avenida Vergueiro e param para comprar refrigerantes e esfirras em lojas de fast food.

A Folha apurou que a maioria vem de bairros nas zonas norte e leste e dorme em barracas no vão livre. Pelo menos três deles relataram a assistentes sociais que estão há mais de três anos nas ruas após terem perdido os pais.

Outros passam a semana na avenida Paulista e só voltam para casa no fim de semana para levar o dinheiro arrecadado com esmolas, furtos e venda de balas. "Geralmente, essas crianças vêm de relações familiares fragilizadas", diz Carlos Júnior, membro do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. "Há também a ausência escolar, pois não há busca ativa por esses menores", continua.

Nesse contexto, Júnior explica que a rua acaba tendo o papel de formação dessas crianças. "As crianças querem viver coletivamente, e a rua dá essa liberdade", diz.

Segundo o advogado Ariel de Castro Alves, membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o problema dos menores de idade infratores é agravado pelo fato de não haver uma abordagem social específica para eles. "Crianças nessa situação têm quase sempre uma família em situação de risco, por isso, a intervenção tem que ser específica e levar isso em conta", diz.

No primeiro trimestre do ano, segundo a prefeitura, foram feitos na região 61 encaminhamentos de crianças e adolescentes para abrigos. Mas, assistentes sociais contam que eles fogem poucos dias depois e voltam para as ruas.

Após receber denúncia do Masp, o Ministério Público abriu inquérito no último dia 29 para investigar a falta de encaminhamento de crianças que vivem no vão livre. No inquérito, há um boletim de ocorrência registrado em 11 de março, quando 15 crianças foram levadas ao 4º DP por suspeita de furto na região da Paulista.

De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), menores de 12 anos não podem ser encaminhados para a Fundação Casa. "Só pode apreender os maiores de 12 anos se houver crime de violência ou se for reincidente nos furtos, crime não violento", diz Castro Alves.

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