Rodrigo Garcia prepara troca nas polícias para "chacoalhar" segurança de SP

Novo governador avalia colocar amigo coronel na PM e ganhar terreno em área que Doria derrapou

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São Paulo

A agenda de Rodrigo Garcia (PSDB) como novo governador de São Paulo, na tarde dessa sexta-feira (1º), em São José do Rio Preto (438 km da capital), está carregada de recados importantes para a área da segurança pública: o tucano tentará um movimento de aproximação com as polícias e, também, tem clara predileção por um nome para assumir o comando da Polícia Militar.

Garcia entregará viaturas na região comandada pelo coronel Fábio Rogério Candido, apontado dentro e fora da corporação como principal nome para assumir o comando-geral no lugar do coronel Fernando Alencar Medeiros, no cargo desde março de 2020. O oficial formado em 1993 é tido como amigo de longa data do tucano e, assim, um homem de total confiança do novo mandatário.

De acordo com integrantes da cúpula da corporação, diante dessa possibilidade de troca, coronel Alencar teria bloqueado a agenda dele a partir deste sábado (2). Também teria suspendido alguns atos administrativos, como promoção de dois coronéis, para deixar essa decisão para novo ocupante do cargo. Seria um gesto de elegância com o sucessor.

Governador Rodrigo Garcia entrega novas viaturas da Policia Militar, em São José do Rio Preto - Pablo Jacob/Divulgação/Governo de São Paulo

Interlocutores de Garcia ouvidos pela Folha afirmam, porém, que essa mudança não estaria ainda programada, pelo menos por ora. Mas pode ocorrer ao longo dos meses para que o novo governador tenha um evento público de destaque –importante em sua campanha de reeleição.

A não ser que o pedido de saída parta do próprio Alencar, como vem sendo aconselhado por alguns: deixar o comandante quando está em alta, com a marca de ter implantado mudanças importantes na corporação e com o sentimento de dever cumprido. Evitaria o dissabor de ser tirado.

O nome de Candido não é, porém, consenso dentro da corporação, muito menos fora dela. Aqueles que consideram o PM um bom nome o classificam como inteligente, bem preparado e favorável às pautas de direitos humanos –incluindo a redução da letalidade policial.

O coronel Fábio Rogério Candido, da região de São José do Rio Preto, apontado como principal nome para assumir comando-geral da PM de SP - @coronel_fabio_candido

Seria apoiador do programa de câmeras corporais, o "Olho Vivo", que fez desabar os índices de letalidade policial –principalmente na Rota (tropa de elite), uma das unidades mais letais da história da PM. Teria, assim, o apoio de um colega de turma, coronel Robson Cabanas Duque, gerente do programa, outro nome também considerado forte da corporação e também cotado para o comando-geral.

Mas é justamente nesse o ponto, da letalidade policial, que estão as maiores preocupações de quem defende a não escolha do coronel Candido.

Candido é visto como "sindicalista" por ser um dos idealizadores da associação Defenda PM, criada para lutar pelos interesses de oficiais da Polícia Militar no país. A associação tornou-se, porém, nos últimos anos, um grande reduto de bolsonaristas, que atacam os próprios oficiais contrários a isso.

Em 2020, por exemplo, o então presidente Elias Miler da Silva publicou mensagens aos associados condenando críticas públicas ao presidente Jair Bolsonaro (PL).

"Bolsonaro está sendo instrumento de Deus para libertação do povo brasileiro do PT, da esquerda e da corrupção que assola o país, e os homens de bem devem e podem criticá-lo, devem fazer sugestões, mas nunca ser instrumento de discurso para a volta dos destruidores [sic]", disse.

Entre os principais críticos das câmeras de corpo está o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL), filho do presidente. "A escolha de um representante da Defenda PM sinalizaria a intenção do governador Rodrigo Garcia em compor com o grupo mais conservador da Polícia Militar de SP, que tem muitos de seus membros simpáticos ao presidente Jair Bolsonaro e ao seu candidato, Tarcísio Freitas", disse Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

"É uma forma de reaproximar governo e polícia. Só espero que isso não implique em retrocessos nos avanços na modernização da PM de SP, como as câmeras corporais, já que existem setores resistentes à nova tecnologia na corporação", afirmou ele.

Garcia foi aconselhado por integrantes do próprio secretariado a não indicar Candido por conta disso. O melhor seria, ouviu o governador, deixar o discreto Alencar, que conta com o respeito de oficiais e de praças. Uma eventual mudança seria melhor para depois das eleições, se for vitorioso.

A decisão deverá ocorrer nos próximos dias. Até porque o novo governador manifestou a interlocutores interesse de dar um "chacoalhão" na segurança pública e trabalhar para reduzir a sensação de insegurança crescente, principalmente na capital, com roubos em série.

O atual comandante-geral da PM de SP:, coronel Fernando Alencar Medeiros, no cargo desde março de 2020 - Governo do Estado de São Paulo

Isso também colocaria em risco o cargo do próprio secretário, o general João Camilo Pires de Campos. Segundo interlocutores, Garcia vê problemas no trabalho do comandante da pasta porque estaria deixando as "rédeas soltas" na pasta. A ideia seria buscar alguém mais atuante, ainda não encontrado.​

Também foi orientado, porém, a não fazer essa mudança agora. Uma crise na segurança após uma eventual mudança na pasta levaria para o colo de Garcia toda a responsabilidade dela, até porque a saída de Campos provocaria a queda de outros nomes --como do secretário-executivo Youssef Abou Chahin.

O novo governador não quer problemas nessa área. Pelo contrário, quer fazer uma aproximação com as polícias, principalmente com as bases, e tentar ganhar campo em uma área que João Doria (PSDB) nunca conseguiu. Mesmo com reajuste e investimentos importantes na área, o candidato a presidente do PSDB não é benquisto entre policiais. Principalmente da PM.

Garcia passará a falar com os policiais de ponta, por isso encolheu a entrega de viaturas. Vai ampliar conversas nas companhias ou pelotões, e menos com as cúpulas.

Civil

Com relação à Polícia Civil, ainda conforme interlocutores de Garcia, o governador não estaria interessado em mudanças imediatas. O delegado-geral Ruy Ferraz Fontes seria mantido, pelo menos por ora, também sob a mesma justificativa de haver motivos urgentes para isso.

O delegado-geral de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, que está no cargo desde novembro de 2018 - Divulgação/Polícia Civil

Fontes também está conduzindo, por outro lado, programas considerados importantes, como a implantação de um novo sistema operacional (SPJ) que promete a mudar substancialmente a forma de atendimento de ocorrências no estado e de investigações com uso de inteligência artificial.

Um nome mal colocado poderia afetar parte das mudanças, principalmente aquelas de combate à corrupção --um dos principais problemas da Polícia Civil de SP.

Foi justamente para a cadeira do delegado-geral de São Paulo que surgiu o maior número de especulações sobre possíveis sucessores e, também, lobby de correntes políticas do estado –incluindo uma suposta tentativa de intervenção do vereador da capital Milton Leite (DEM) na escolha de nomes. O vereador nega tal movimento. "Não me envolvo nessa área. Não tenho atuação nesse campo."

Entre os nomes cotados para o cargo estariam o delegado Albano David Fernandes, atualmente no DHPP (homicídios), e a delegada Elisabete Sato, delegada-geral-adjunta, considerada como a mais forte para assumir a vaga, por ter confiança e respeito dentro e fora da instituição.

Assim como Alencar, o delegado Ruy Ferraz Fontes também disse a interlocutores que está com sentimento de dever cumprido e está tranquilo para qualquer decisão de Garcia.

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