Entenda passo a passo da operação que deixou ao menos 23 mortos na Vila Cruzeiro

Polícia Militar diz ter sido atacada durante ação de inteligência contra criminosos que se deslocariam para a Rocinha

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Rio de Janeiro

Embora ainda pairem muitas dúvidas sobre a operação deflagrada pelo Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) da Polícia Militar do Rio de Janeiro e pela Polícia Rodoviária Federal na Vila Cruzeiro, na zona norte da capital fluminense, informações divulgadas pelas forças de segurança e relatos de moradores ajudam a dar contornos iniciais sobre o que realmente ocorreu na terça-feira (24).

Entenda o passo a passo da 2ª operação mais letal da história recente do Rio de Janeiro, que resultou na morte de ao menos 23 pessoas:

Moradores levaram corpos de homens baleados ao Hospital Getúlio Vargas, na zona norte do Rio de Janeiro, após operação da Polícia Militar na Vila Cruzeiro - Eduardo Anizelli/Folhapress

A Polícia Militar e a Polícia Rodoviária Federal se referem à operação como uma ação de inteligência que vinha sendo construída há semanas. As forças de segurança tinham informações de que um comboio com dezenas de traficantes do Comando Vermelho deixaria a Vila Cruzeiro e se deslocaria pela cidade até a favela da Rocinha, na zona sul, comandada pela mesma facção criminosa.

Segundo a polícia, a operação não teve como motivação o cumprimento de mandados de prisão, embora alguns dos suspeitos fossem considerados foragidos. O objetivo, ainda de acordo com as forças de segurança, seria interceptar o comboio fora da favela e prender os criminosos em flagrante.

A ação começou por volta das 3h30 de terça-feira (24). Segundo a polícia, havia uma equipe de inteligência na entrada da Vila Cruzeiro, à paisana, para monitorar a movimentação dos criminosos. Também havia um aparato montado do lado de fora da favela, com 11 carros blindados, para interceptar os traficantes. Não foi informada a localização desse grupo.

De acordo com a polícia, o comboio contava com mais de 50 traficantes, parte deles vindos de outros estados como Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Pará e Rio Grande do Norte.

O plano inicial, porém, teve que ser abortado. A corporação diz que a equipe que estava à paisana na entrada da favela foi atacada pelos criminosos por volta das 4h. Por isso, ainda segundo a Polícia Militar, teve início uma operação de emergência para cessar esse ataque.

Cerca de 80 agentes da PM e mais 26 da Polícia Rodoviária Federal participaram da ação. Eles entraram na favela por um ponto onde não havia barricadas e foram subindo o morro enquanto trocavam tiros com os traficantes.

Ainda de acordo com a polícia, conforme os criminosos recuavam, os confrontos iam "entrando" na comunidade, até chegar a uma área de mata que liga a Vila Cruzeiro ao Complexo do Alemão.

Foi ali, na altura da Pedra do Sapo, que começou um forte confronto com os criminosos, de acordo com o boletim de ocorrência lavrado pela Polícia Civil. Dez homens morreram e o caso foi registrado como morte por intervenção de agente do Estado. O endereço "rua Ministro Moreira de Abreu, 515" foi indicado como o local das mortes.

A Polícia Militar afirmou que apreendeu 13 fuzis, 12 granadas, 4 pistolas, 10 carros e 20 motos que fariam parte do comboio.

A operação e os confrontos se estenderam ao longo do dia na terça-feira. O número de mortos foi subindo ao longo do dia, conforme corpos e feridos chegavam no Hospital Estadual Getúlio Vargas, localizado na região.

No total, foram confirmadas pelos policiais até o momento 23 mortes decorrentes da ação —há outras três mortes que inicialmente foram ligadas à ação, mas a Polícia Civil depois afirmou que elas não estavam conectadas.

No início da tarde de terça, 22 entidades e movimentos sociais divulgaram uma nota pedindo às polícias o imediato cessar-fogo, dizendo que mães e familiares estavam mobilizados a entrar na mata em meio ao tiroteio no desespero de localizar seus parentes, e ativistas de direitos humanos estavam no meio do fogo cruzado.

Moradores relataram indícios de assassinatos, inclusive com o uso de facas. Eles afirmaram que havia homens feridos na mata, trocando mensagens com a família desde a madrugada, mas sem possibilidade de sair diante do risco de serem mortos pela polícia mesmo após a rendição.

A vereadora Tainá de Paula (PT) afirmou que viu o corpo de um homem, estirado no meio da favela, com diversas perfurações e um pó branco semelhante a cocaína espalhado pela boca. A Folha teve acesso a fotos do corpo, envolvido em uma manta e deitado sobre o chão, com sangue na região do nariz e um pó branco sobre a boca e o queixo. As imagens não foram publicadas para preservá-lo.

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