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'É coisa de preto', diz vereador Camilo Cristófaro durante sessão na Câmara de SP

Fala foi captada pelo sistema de som; em reunião, vereador disse ter dito frase a um amigo negro

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São Paulo

A vereadora Luana Alves (PSOL) acusou o vereador Camilo Cristófaro (PSB) de proferir uma frase com cunho racista durante sessão da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Aplicativos na Câmara Municipal de São Paulo, na manhã desta terça-feira (3).

A Folha recebeu da assessoria de Luana o trecho do vídeo da sessão no qual é possível ouvir a frase "é coisa de preto, né". A reunião foi interrompida em seguida, após a frase ter sido escutada no sistema de som da Câmara. Depois prosseguiu.

Às 12h20, Cristófaro disse à Folha que a denúncia não procedia. Logo no início da sessão, Luana pediu que a equipe técnica da Casa disponibilizasse o áudio.

"Me mostre uma prova. Não existe", escreveu o vereador à reportagem. "Não existe absolutamente nada, 70% dos que me acompanham são afros. E me orgulho deles", completou Cristófaro.

Segundo a assessoria de imprensa da vereadora, Cristófaro usou a expressão "coisa de preto" em uma frase em que falava da sujeira nas calçadas.

À tarde, em reunião presencial do colégio de líderes da Casa, Cristófaro admitiu ter dito a frase a um amigo chamado Anderson Chuchu e pediu desculpas. Segundo o vereador, ele aludia à dificuldade de polir veículos na cor preta.

Afirmou também ter carinho pelas vereadoras Luana e Elaine Mineiro (PSOL) e citou Pelé e o piloto de F1 Lewis Hamilton como ídolos.

"Eu estava com o Anderson Chuchu, que é o chefe de gabinete da Subprefeitura de Ipiranga, e é negro. É negro, é negro. Comentei que, no domingo, fizemos uma limpeza lá e, quando cheguei, falei assim: 'Isso daí é coisa de preto, né'. Falei para o Chuchu, que é meu irmão", disse o vereador.

"Queria primeiro, se alguém se sentiu ofendido e deve se sentir, eu peço desculpas por um contexto de uma brincadeira que eu fiz com ele, e que ele faz comigo. É uma brincadeira nossa, tanto é que ele é um cara que frequenta a minha casa, uma pessoa que me orgulha", disse o vereador.

Vereadora Luana Alves, do Psol, acusa vereador de pronunciar frase racista - Ronny Santos/Folhapress

Antes de o vereador confirmar ser o autor da frase, a vereadora Luana afirmou que o ato foi "extremamente racista". "Eu não queria acreditar que essa fala existiu, mas infelizmente existiu. Conversamos ali atrás, e pedi à secretaria da mesa as notas taquigráficas. Foi acordado que todos são testemunhas de ações posteriores que venham a decorrer dessa fala infeliz do vereador", completou Luana.

Adilson Amadeu (União Brasil), que preside a CPI dos Aplicativos, solicitou que Cristófaro fosse à Câmara para esclarecer o episódio.

Cristófaro participava de forma virtual da sessão, enquanto Luana compõe a bancada da CPI dos Aplicativos.

A vereadora Elaine Mineiro (PSOL), que integra bancada coletiva Quilombo Periférico, afirmou que registraria boletim de ocorrência. Elaine e Luana também dizem que vão registrar queixas à Corregedoria da Câmara.

"A gente estava dando início a sessão, e vazou um áudio do vereador, muito provavelmente Camilo Cristófaro, em que ele fala da calçada e era coisa de preto. Na hora a gente fica surpresa, muito doída, mas não é a primeira vez que isso acontece na Câmara Municipal de São Paulo", disse Luana.

"Nosso mandato vai entrar na Corregedoria para pedir punição a este vereador. A gente não admite fala, comportamento racista e em especial na casa do povo", afirmou Luana.

Até o início desta tarde, a Corregedoria não havia recebido queixa do caso.

Em nota à Folha, o presidente da Casa, Milton Leite (União Brasil) afirmou que o episódio será apurado pela Corregedoria. "É com uma indignação imensa que lamento mais uma denúncia de episódio racista dentro da Câmara de Vereadores de São Paulo, local democrático, livre e que acolhe a todos", afirmou Leite. "Como negro e presidente da Câmara tenho lutado com todas as forças contra o racismo, crime que insiste em ser cometido dentro de uma Casa de Leis e fora dela também."

Em fevereiro deste ano, o órgão decidiu que o vereador Arnaldo Faria de Sá (PP), que se referiu ao ex-prefeito Celso Pitta como "negro de alma branca", deveria receber uma advertência, descartando assim penas como suspensão e cassação do mandato.

O relator do caso, vereador Aurélio Nomura (PSDB), sugeriu a punição sob alegação de que não houve dolo no uso da expressão racista. O parecer de Nomura foi aprovado na corregedoria por quatro votos a três.

Logo após a declaração de Faria de Sá, Leite reagiu e que "não vai tolerar atos de racismo como o registrado".

Outros casos

Essa não é a primeira vez que Crisófaro se envolve em confusão. Em 2019, ele chamou o vereador Fernando Holiday (Novo) de "macaco de auditório", no plenário da Câmara.

"Gostaria de falar que lamentavelmente o senhor Fernando Holiday usa das redes sociais, que ele é o grande macaco de auditório das redes sociais, que ele usa dando risada dessa Casa, explodindo as redes sociais, porque a população adora ver sangue, maldade, mentira, fake, onde ele acusa os seus colegas de vagabundos", disse Cristófaro, na ocasião.

De acordo com a assessoria do vereador Gilberto Nascimento (PSC), que preside a Corregedoria, o caso referente ao parlamentar Holiday deverá ser votado nas próximas semanas.

Em 2017, a então vereadora e atual deputada estadual Isa Penna (PSOL) disse que foi empurrada e agredida por Cristófaro em um dos elevadores do prédio da Câmara Municipal.

De acordo com Isa, o vereador a xingou de "vagabunda", "terrorista", "cocô de galinha" e insinuou ameaças dizendo que ela não deveria ficar surpresa se "tomar uns tapas na rua".

Em seguida, já fora do elevador, Cristófaro se aproximou da colega de plenário e lhe deu "um empurrão de leve", de acordo com Isa. O vereador negou na época e diz que não ofendeu ninguém.

Há também acusações de agressões contra o vereador feitas por um funcionário da Subprefeitura do Ipiranga, que teria levado um soco em julho de 2020, e outra realizada por um assessor do vereador Eduardo Suplicy (PT). No primeiro caso, Cristófaro diz que foi um empurra-empurra e que apenas se defendeu diante do funcionário da subprefeitura. Em relação à queixa do assessor de Suplicy, o vereador afirmou, na ocasião, que a acusação era mentirosa e o funcionário "queria aparecer, queria mídia".

No dia 13 de março, a gestora pública Lucia de Souza Gomes, 47, registrou um boletim de ocorrência no 26º Distrito Policial, no Sacomã, em São Paulo. Ela acusa o vereador Cristófaro de tê-la ofendido verbalmente.

No boletim de ocorrência, ela narra que, ao tentar se aproximar do prefeito Ricardo Nunes (MDB) durante a inauguração de uma obra, o vereador Camilo Cristófaro disse que, se ela queria aparecer, "que fique pelada na revista Playboy" [sic].

A gestora pública, então, teria respondido que "o prefeito era para toda a cidade e não para algumas pessoas". Depois, ainda segundo o relato, ouviu o vereador chama-la de "vagabunda".

Cristófaro nega a versão da mulher e diz que não há provas contra ele.

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