Wilma Lacerda foi a primeira pintora surrealista a valorizar a imagem das pessoas negras em suas obras, segundo escreveu a então embaixatriz do Senegal em 1979 em dedicatória no livro "Senegal Today", de Mylène Rémy, dado de presente à Lacerda.
Pessoa de riso fácil, Wilma nasceu em 1944 no Recife, Pernambuco. "Ela sempre desenhou, não é possível falar dela sem falar de arte", diz a economista Cynthia Cisneiros, 62, irmã de WIlma.
Wilma começou a estudar artes plásticas cedo e, no fim dos anos 1960, deixou o estado para abrir um estúdio em Búzios, na Região dos Lagos. Foi também no Rio de Janeiro que se casou. Viveu uma década ao lado do companheiro. Divorciou-se e não voltou a se casar.
"Ela era uma mulher livre, que gostava da liberdade, de viver. Às vezes, [nem] sequer sabíamos onde ela estava até ela nos mandar um cartão nos dizendo", explica Cynthia.
Wilma foi aluna de Ivan Serpa (1923-1973), pintor conhecido pelo figurativismo e pela arte concreta, escolas pelas quais transitou na carreira. Seus traços, diz a irmã, são tão suaves que não dá para ver a pincelada.
Cynthia conta que a irmã se apaixonou pelas vertentes das culturas negras a que teve acesso no Senegal e nas suas muitas idas à Bahia, onde desenvolveu muito do seu trabalho na tentativa de combater o racismo por meio da valorização dos povos negros. A artista também pintou a denúncia da fome no Rio Grande do Norte.
"Tenho muito orgulho da minha tia. Ela tentou de todas as maneiras combater o racismo exaltando a cultura negra da época. Era difícil achar uma pessoa branca não racista na época", diz o programador João Pedro Galvão, 30, filho de Cynthia e sobrinho de Wilma, de quem era muito próximo.
Sua arte foi capa do Catálogo Telefônico de Brasília e chegou ao Vaticano.
Wilma tem obras em galerias e museus dos Estados Unidos, Reino Unido, Espanha, França, Bélgica, Japão, China e Austrália.
Ao longo da carreira, Wilma também manteve ateliês no Lago Sul de Brasília, onde morou por alguns anos após se divorciar, na cidade alta de Olinda e na praia de Boa Viagem, no Recife.
Segundo a irmã, o crítico de artes plásticas brasileiro Jacob Klintowitz classificou Wilma como integrante do que chamou de a trindade do surrealismo nacional, ao lado dos pintores Walter Levy (1905-1995) e Roni Brandão (1935-1991).
O grande amor de Wilma, durante toda a vida, foi a arte. "Ela gostava muito de teatro, chegou a encenar algumas peças. Gostava muito de poesia e manteve relação com alguns escritores pernambucanos, estava sempre lendo e escrevendo", diz a irmã.
Wilma morreu no último dia 27 de abril aos 78 anos, no Recife, em decorrência da doença de Alzheimer. Ela não teve filhos e deixa três irmãos e uma irmã.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.