Legado de Chico Xavier permanece em Uberaba 20 anos após sua morte

Cidade do Triângulo Mineiro tem alta concentração de espíritas e mais de 130 casas de atendimento, que chegam a funcionar 24 horas por dia

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Uberaba

Apesar do ritmo ter diminuído, os ônibus cheios de seguidores do espiritismo continuam chegando a Uberaba, cidade do Triângulo Mineiro que durante mais de quatro décadas foi a casa do principal nome da religião no país, Chico Xavier (1910-2002).

Da rodovia que dá acesso ao município a um museu em sua homenagem, o médium está presente na vida local e é apontado por lideranças espíritas como responsável pela força histórica da religião na cidade, mesmo 20 anos após sua morte, completados nesta quinta (30).

No município, há 130 casas espíritas atualmente, algumas funcionando 24 horas. Dos 340 mil habitantes de Uberaba, 15,4% declararam seguir a religião no último Censo —a média no país é de 2%.

O médium Chico Xavier, que morreu em 30 de junho de 2002, aos 92 anos, em Uberaba (MG)
O médium Chico Xavier, que morreu em 30 de junho de 2002, aos 92 anos, em Uberaba (MG) - Flávio Florido-18.jul.1999/Folhapress

Francisco Cândido Xavier morreu aos 92 anos em 30 de junho de 2002, dia em que a seleção brasileira conquistou no Japão o quinto título da Copa do Mundo.

Sua casa foi transformada em museu, mantido pelo dentista Eurípedes Humberto Higino dos Reis, 72, que foi à Justiça pedir reconhecimento como filho adotivo do médium após uma convivência de quase 45 anos.

Em primeira instância, o pedido foi rejeitado e Reis desistiu do processo, segundo contou à Folha. "Não preciso de papel [para dizer que é filho]. Eu mesmo pedi para um amigo advogado que tinha entrado com a ação, acabei com isso. Não preciso disso, fui morar com ele tinha quase oito anos de idade."

O local abriga pertences como perucas e roupas que Chico usava, além de livros e mensagens atribuídas aos espíritos André Luiz e Emmanuel, seus orientadores.

Pessoas que conviveram com Chico afirmam que as perucas eram usadas por vaidade, mas Reis aponta outro motivo. "Ele tinha crises de sinusite, as perucas ajudavam a proteger do vento, tanto que depois que passou a usar boinas não usou mais as perucas."

O museu, que até a pandemia recebia 36 ônibus de turistas por fim de semana, registrou pouco mais de 3.000 visitantes em maio.

Nascido em Pedro Leopoldo (MG) em abril de 1910, Chico Xavier começou a frequentar reuniões espíritas em 1927. Em 1932, publicou seu primeiro livro, "Parnaso de Além-túmulo", com 59 poemas assinados por poetas brasileiros mortos, como Castro Alves e Augusto dos Anjos. "Nosso Lar", best-seller da literatura espírita, foi publicado em 1944.

No total, foram 490 obras, algumas editados após sua morte, muitas traduzidas para outros idiomas. "Não sou autor de nenhuma dessas obras", dizia Chico, que atribuía aos espíritos a produção.

Ele se mudou para Uberaba em 1959 e a cidade, que já tinha núcleos espíritas, se transformou num polo de peregrinação. Após atuar na Comunhão Espírita Cristã, manteve a partir de 1975 o Grupo Espírita da Prece, vendida por Reis em 2021 para outro centro.

"O movimento espírita em Uberaba é crescente, novas casas espíritas têm sido fundadas, menores, mas têm sido. Uberaba ainda é muito visitada por gente de todo o Brasil em busca de conforto, consolo, às vezes em busca de cura", disse o médium Carlos Baccelli, 69, que trabalhou com Chico.

Segundo lideranças espíritas, sempre há de 10 a 15 casas espíritas em atividade simultaneamente, seja com passe, psicografia, estudos ou trabalhos assistenciais.

Trechos de cartas psicografadas por Chico Xavier que integram acervo do museu em Uberaba
Trechos de cartas psicografadas por Chico Xavier que integram acervo do museu em Uberaba - Ricardo Benichio/Folhapress

Os 20 anos da morte do médium serão lembrados também numa programação da prefeitura, que inclui uma roda de conversas nesta quinta com pessoas que conviveram com ele.

Já o Memorial Chico Xavier, que tinha previsão de ser reaberto agora, deverá ser concluído em 2023, segundo o museólogo Carlos Vitor Silveira, coordenador do espaço.

O líder religioso morreu vítima de parada cardíaca e mais de 80 mil pessoas passaram pelo velório, que durou dois dias. O corpo foi enterrado no cemitério São João Batista, que diariamente registra visitas de fiéis. Na segunda, havia sete vasos de flores no túmulo.

O dentista Eurípedes Humberto Higino dos Reis, 72, filho adotivo de Chico Xavier, no quarto em que o médium morreu, em 2002
O dentista Eurípedes Humberto Higino dos Reis, 72, filho adotivo de Chico Xavier, no quarto em que o médium morreu, em 2002 - Ricardo Benichio/Folhapress

MÉDIUM DEIXAVA RECADOS AOS ESPÍRITOS

Numa noite de outubro de 1996, seis anos antes de sua morte, o banheiro do quarto de Chico precisava de conserto no sistema de água, o que fez com que tivesse de passar a noite no dormitório ao lado.

Para não correr o risco de perder alguma eventual visita espiritual, escreveu numa folha de sulfite uma mensagem informando da mudança.

"Se algum amigo espiritual por ventura estiver determinado a me proporcionar a alegria de uma visita, aviso que estarei nesta noite, somente hoje, no quarto à esquerda, onde estarei com a satisfação de receber", diz trecho.

A mensagem, exposta na porta do quarto em que ele morreu, termina com um aviso de que a porta do aposento provisório estava aberta.

Um dos mitos que rondam Chico Xavier é sobre sua reencarnação. Isso ainda não aconteceu, conta Reis, uma das três pessoas que teriam recebido uma senha do médium indicando como se comunicaria caso nascesse de novo.

Ele é o único vivo dos três, já que o médico Eurípedes Tahan e a amiga e vizinha Kátia Maria, já morreram. "Em vida já havia pessoas que diziam ter psicografado o Chico, imagine com ele desencarnado. Por isso ele deixou a senha", conta Reis.

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