Por mês, quase 20 bebês são entregues para adoção no estado de SP

Levantamento do Tribunal de Justiça aponta que em 2022 foram registrados 98 casos até maio

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São Paulo

De janeiro a maio deste ano, 98 crianças recém-nascidas foram entregues pela mãe de maneira voluntária para adoção no estado de São Paulo, uma média de 19 por mês. É o que aponta um levantamento do Tribunal de Justiça do estado obtido pela Folha.

O procedimento, semelhante ao que fez a atriz Klara Castanho, 21, é previsto pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e é sigiloso. Mas não foi o que ocorreu no caso dela.

Klara revelou no sábado (25) que foi vítima de um estupro e manteve a gestação, entregando a criança para adoção após o nascimento.

A atriz relatou que, ainda sob o efeito da anestesia do parto, uma enfermeira entrou na sala cirúrgica e a ameaçou com o vazamento de informações sobre a situação. Ela deu à luz em um hospital em Santo André, na Grande São Paulo.

"Ela fez perguntas e ameaçou: ‘Imagina se tal colunista descobre essa história’. Eu estava dentro de um hospital, um lugar que era para supostamente para me acolher e proteger. Quando cheguei no quarto já havia mensagens do colunista, com todas as informações", escreveu Klara nas redes sociais.

Sede do Tribunal de Justiça de São Paulo, na capital - Eduardo Knapp - 11.out.2019/Folhapress

A entrega da criança à adoção pode ocorrer independentemente da gravidez ter sido fruto de um estupro.

Quando a mulher solicita sigilo total, a Justiça nem tenta estabelecer o vínculo da criança com a família extensa —avós, tios, primos. Na maioria dos outros casos, a ideia é que a Justiça tente promover o retorno à família biológica.

"A regra é que, somente se a mulher não fizer questão do sigilo, a Justiça busque à família extensa", afirma Iberê de Castro Dias, juiz assessor da Corregedoria Geral da Justiça em assuntos da Infância e da Juventude.

No ato da entrega, a genitora pode explicar os seus motivos ou, então, mantê-los em segredo. Uma equipe de assistentes sociais e de psicólogos da Vara da Infância deve avaliar cada caso para se certificar que a decisão da mulher foi livre e consciente.

"É necessário o respaldo do atendimento psicossocial para afastar hipóteses da mulher estar com uma depressão e a depressão pós-parto, às vezes está sendo pressionada por questões financeiras", afirma o juiz.

"A entrega à adoção é definitiva e, por isso, precisamos tentar entender a mulher. Se o problema é financeiro, o sistema judiciário busca por meio de auxílio social", explica Dias.

Entre os motivos que levam a genitora a tomar tal decisão estão a violência sexual, gravidez inesperada e relacionamentos malsucedidos.

Ao todo, de agosto de 2018 até maio deste ano, 714 recém-nascidos foram entregues pela genitora, sendo 255 na capital paulista e 459 no interior do estado. Foram 191 casos em 2021; 195 em 2020 e, em 2019, 175.

A mãe biológica pode informar o desejo de entregar a criança durante a gestação e logo após o parto. Caso ela anuncie tal decisão durante a gravidez, deverá ratificá-la em uma audiência judicial depois do parto.

A comunicação pode ser feita diretamente à Justiça ou, então, para um profissional da saúde ou um representante do Ministério Público. Nesses dois últimos casos, a doação será comunicada à Vara da Infância.

"Nenhum desses profissionais pode expor esta situação, isto é crime de delito de violação de segredo profissional [em local privado] ou de violação de sigilo funcional [no caso de funcionários públicos]", afirma Dias.

Nesta segunda-feira (27), o Ministério Público de São Paulo informou que está apurando a conduta de uma enfermeira que teria ameaçado Klara. A Promotoria de Justiça da Infância de Santo André informou, ainda, que o processo de entrega da criança seguiu o trâmite previsto pelo ECA.

O Coren (Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo) também anunciou, no domingo (26), que vai apurar a denúncia envolvendo a profissional de enfermagem. Em última instância, a enfermeira pode perder o registro profissional.

Em nota, o Hospital Brasil, que pertence à Rede D´Or e no qual Klara deu à luz, diz que abriu uma sindicância interna para a apuração desse fato. Disse ainda que tem como princípio preservar a privacidade de seus pacientes bem como o sigilo das informações do prontuário médico.


Quando proceder?
A genitora pode expor o seu desejo de entregar a criança durante a gestação e ratificá-lo após o parto. Também pode expor a sua intenção somente depois do nascimento.

Comunicar para quem?
A entrega à adoção por ser comunicada aos profissionais da rede de saúde, conselhos tutelares e Ministério Público - essas instituições devem comunicar o fato à Justiça. Ou, a mulher pode procurar diretamente a Vara da Infância.

Quem receberá a criança?
A adoção seguirá a fila do Cadastro Nacional de Adoção. Geralmente, antes do parto, o pretendente já é comunicado, mas ele fica de sobreaviso caso a genitora desista de entregar o bebê.

A mãe biológica pode escolher com que a criança ficará?
Não. Como também não pode transferir a criança a terceiros sem autorização da Justiça.

O recém-nascido adotado carregará o nome da mãe?
Sim, é direito da criança ser registrado em nome da mãe biológica, mesmo nos casos de entrega legal


Recém-nascidos entregues para adoção no estado de São Paulo

2022, de janeiro a maio
Capital 29
Interior 69
Total 98

2021
Capital 68
Interior 123
Total 191

2020
Capital 86
Interior 109
Total 195

2019
Capital 54
Interior 121
Total 175

2018, de agosto a dezembro
Capital 18
Interior 37
Total 55

Fonte: TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo)

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