O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), deu cinco dias para o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o Ministério da Saúde explicarem uma cartilha da pasta que ignora a legislação brasileira sobre aborto e diz que a realização do procedimento é crime em todos os casos. Segundo o documento do governo, o que há em algumas circunstâncias é apenas o excludente de ilicitude.
na decisão, o magistrado diz ainda que que parece haver no país uma "padrão de violação sistemática do direito das mulheres" em relação à realização de aborto nos casos previstos em lei.
No Brasil, o aborto é permitido em casos de estupro, risco para a mãe e anencefalia do feto —este último foi garantido por uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em 2012.
A cartilha do Ministério da Saúde afirma que "não existe aborto legal" no Brasil. A polêmica sobre o assunto ganhou força após o caso da juíza Joana Zimmer, que induziu uma criança de 11 anos que foi estuprada a desistir da interrupção da gravidez.
"O que existe é o aborto com excludente de ilicitude. Todo aborto é um crime, mas quando comprovadas as situações de excludente de ilicitude após investigação policial, ele deixa de ser punido, como a interrupção da gravidez por risco materno", diz o documento oficial.
O excludente de ilicitude está previsto no Artigo 23 do Código Penal e diz textualmente, diferentemente do que prega o ministério, que "não há crime" quando preenchidos seus requisitos. É o caso, por exemplo, de uma pessoa que mata outra em legítima defesa —ela não pode ser processada por homicídio.
Quatro entidades ligadas à saúde apresentaram uma ação ao Supremo em que pedem que o texto seja suspenso e para impedir que o governo ou decisões judiciais restrinjam o aborto legal no país.
Fachin foi sorteado relator da ação. Ele pediu esclarecimentos ao Executivo, o que é praxe, mas aproveitou para antecipar sua visão sobre o tema.
"O quadro narrado pelas requerentes é bastante grave e parece apontar para um padrão de violação sistemática do direito das mulheres. Se nem mesmo as ações que são autorizadas por lei contam com o apoio e acolhimento por parte do Estado, é difícil imaginar que a longa história de desigualdade entre homens e mulheres possa um dia ser mitigada", disse.
A cartilha também coloca como limite para o procedimento a idade gestacional de 22 semanas, o que não tem amparo legal. O manual do ministério tem como "editor geral" o secretário nacional de Atenção Primária, Raphael Câmara.
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