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Simples busca no Google teria impedido Exército de liberar arma a membro do PCC, diz juiz

Investigação aponta que militares não exigiram certidão de integrante de facção que comprou até fuzil

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Brasília

O juiz que autorizou a Polícia Federal a fazer busca e apreensão contra um membro do PCC (Primeiro Comando da Capital) que comprou armamento após autorização do Exército disse que qualquer busca no Google feita pelos militares poderia acender um sinal amarelo sobre o suspeito.

Conforme mostrou a Folha, o membro do PCC conseguiu obter o certificado de registro de CAC (caçador, atirador e colecionador) no Exército mesmo tendo uma ficha corrida com 16 processos criminais, incluindo cinco indiciamentos por crimes como homicídio qualificado e tráfico de drogas.

Arma apreendida pela polícia com membro do PCC. - Divulgação

O juiz José Humberto Ferreira, da Justiça Federal de Uberlândia, argumentou que a competência concedida ao Exército para a emissão do documento é justamente devido a sua expertise no controle de armas de fogo.

"Causa-me espécie verificar que os responsáveis no Exército Brasileiro pela apreciação dos pedidos administrativos foram enganados e emitiram um Certificado de Registro como Caçador e Atirador Esportivo em favor do representado sem, sequer, fazer uma pesquisa para verificar sua vida pregressa, pois uma simples consulta no Google em nome de X acenderia uma luz amarela, a indicar que outras diligências deveriam ser tomadas antes de conceder o Certificado", disse o juiz, na decisão.

O Exército foi procurado, mas não respondeu.

O registro foi obtido em junho de 2021, já no governo do presidente Jair Bolsonaro (PL). O governo federal, por meio de novas portarias e decretos, tem flexibilizado o acesso a armas e munições no país. Algumas normas publicadas são destinadas a beneficiar especialmente a categoria dos CACs.

Manifestante carrega cartaz com a mensagem "Armas para cidadãos de bem"
Protesto pró-armas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), em julho de 2020 - Pedro Ladeira - 9.jul.2020/Folhapress

Segundo a polícia, para obter o certificado de registro de CAC no Exército o membro do PCC apresentou somente a certidão negativa de antecedentes criminais na segunda instância, emitida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

A investigação aponta que o Exército não exigiu certidão negativa da Justiça de primeira instância, na qual o membro do PCC acumula 16 processos. Caso ele tivesse expedido o documento em primeira instância, como determina a legislação, sua ficha criminal seria exposta.

Para se tornar CAC, o Exército pede a comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral.

O juiz afirmou ainda ser necessário identificar o despachante que auxiliou o membro do PCC e pediu ao comandante do Batalhão do Exército em Uberlândia que comprove a "instauração do procedimento para análise da legalidade do ato administrativo" que liberou as compras.

Para o magistrado, é importante a identificação do despachante tendo em vista que, para apresentar somente documentos da segunda instância, o profissional conhece como funciona o sistema judicial e pode ter atuado em outros casos.

Após receber o registro de atirador, o homem comprou duas carabinas, um fuzil, duas pistolas, uma espingarda e um revólver. O valor das armas supera a quantia de R$ 60 mil.

Segundo o juiz, chama a atenção a aquisição de armas de calibre tão elevado e com alto poder de destruição, como um fuzil. O magistrado acrescenta que, atualmente, essas armas são usadas por quadrilhas especializadas em "mega-assaltos" a bancos e distribuidoras de valores, ação que ficou conhecida como "novo cangaço".

"Diante de todo o contexto apresentado, é crível que as armas adquiridas fraudulentamente possam estar sendo cedidas, a título gratuito ou oneroso, a outros criminosos ou facções, para emprego nos mais diversos delitos violentos", disse o magistrado.

A PF apreendeu as armas no último dia 14, após cumprir três mandados de busca e apreensão na operação Ludíbrio na cidade mineira de Uberaba.

As armas compradas por CACs ficam registradas no Sigma (Sistema de Gerenciamento Militar de Armas). Como a Folha mostrou, o Exército admitiu ser incapaz de produzir relatórios detalhados sobre os tipos de armas atualmente nas mãos do grupo.

O apagão de informações ocorre pela falta de padronização de campos do Sigma. Dessa forma, a Força não sabe dizer com precisão quais são os diferentes tipos de armas e calibres que compõem o acervo.

Atualmente, cerca de 1,5 milhão de armas estão registradas no Sigma. Os CACs respondem por mais da metade desse acervo (884 mil), sendo que o restante é formado pelo armamento particular de militares, incluindo policiais e bombeiros.

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