Em três anos, número de armas levadas por criminosos cai 39% no estado de SP

Redução foi registrada entre 2018 e 2021; especialistas apontam subnotificação e mudança de estratégia de criminosos como fatores

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O número de armas levadas por criminosos no estado de São Paulo caiu 38,9% entre 2018 e 2021. Foram 2.821 armas furtadas ou roubadas em 2018, contra 1.725 no ano passado, conforme dados da Secretaria da Segurança Pública obtidos pela Folha por meio da Lei de Acesso Informação.

Para especialistas, essa redução pode estar ligada a uma série de fatores somados que vão desde uma eventual subnotificação até uma mudança na estratégia do crime para obtenção de armamento.

Segundo o gerente de projetos do instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, sempre houve no país uma subnotificação de registros de armas extraviadas porque não há punição para uma pessoa comum que não comunica imediatamente esse desvio, seja ele resultado de um crime ou de perda acidental.

Esse problema pode ter se agravado no país, ainda segundo ele, porque houve duas importantes mudanças no prazo de renovação de certificados, data em que muitos proprietários deixam para comunicar problemas na guarda.

"Houve uma mudança em 2016, passando a renovação de 3 para 5 anos. Daí, temos uma primeira quebra grande em 2018. E, em 2019, [o presidente Jair] Bolsonaro passou essa renovação para 10 anos. Acredito que isso esteja reduzindo ainda mais as notificações", afirmou o pesquisador.

Armas apreendidas pela Polícia Civil de São Paulo - Rubens Cavallari/Folhapress

Entre os dados, há casos de pessoas que comunicaram o extravio da arma apenas tempos depois. Uma pessoa na capital, por exemplo, comunicou em fevereiro de 2018 ter tido uma pistola roubada em janeiro de 1998.

Langeani afirma também que as informações reforçam o levantamento feito pelo Instituto Sou da Paz, que também identificou a tendência de queda nas armas extraviadas entre 2011 e 2020. De 2017 para 2018, segundo o Sou da Paz, houve uma redução de 28% na quantidade de armas levadas.

Essa redução, segundo o pesquisador, pode ter ligação com a norma de 2016 do Tribunal de Justiça de SP, de proibir o armazenamento nos fóruns. No ano seguinte, os depósitos judiciais foram todos esvaziados.

"Com as mudanças na custódia de armas apreendidas, o TJ se recusando receber e algum esforço das delegacias, tivemos diminuição de desvios do poder público, que tinham uma participação maior", afirma.

Em 2017, em apenas um ataque, os criminosos conseguiram roubar 391 armas do fórum de Diadema, na Grande SP. Uma quadrilha invadiu o lugar, rendeu três vigias e levou, entre outras, 294 revólveres, 87 pistolas, 3 submetralhadoras e 1 fuzil.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o número de pessoas com licenças para aquisição de armas de fogo disparou no governo Bolsonaro, com aumento de 473% em quatro anos. Em 2018, antes de o presidente assumir, havia 117,4 mil registros ativos para caçadores, atiradores e colecionadores, os chamados CACs. Em junho deste ano, esse número chegou a 673,8 mil.

Ivan Marques, pesquisador e membro do Fórum Brasileiro de Segurança, disse concordar com a teoria das subnotificações. "O sujeito tem uma arma que desaparece do seu acervo, ele não registra ocorrência, e nada acontece até porque a fiscalização é quase nula", afirma.

Para o pesquisador, porém, a redução também pode estar ligada à mudança de comportamento dos criminosos, pois não há evidências de que eles estejam menos armados agora.

"Me parece que a fonte de abastecimento de armas e munições da criminalidade em São Paulo, dada essa tendência mostrada pelos números, passou a ser outra. Falando de crime organizado, essa fonte pode ter passado a ser o tráfico internacional de armas e não mais de roubos e furtos de domicílios, empresas de segurança, vigias, e desvios da própria polícia", afirmou ele.

Essa tese ganha força, segundo ele, pelo crescimento de apreensões pela Polícia Rodoviária Federal de carregamento vindos de rotas conhecidas, como do Paraguai, via Mato Grosso do Sul e Paraná.

De acordo com o delegado Ruy Ferraz Fontes, diretor do Decap (capital), essa das armas levadas por criminosos também tem ligação com a queda no número de roubo a bancos no estado.

"Antigamente, tinha muito roubo convencional de agências bancárias. Por mês, levavam mais de 300 armas dos vigilantes. Hoje isso foi extinto. A segurança física exposta diminuiu muito, até porque o valor do dinheiro é representado pelo cartão. Além disso, o mercado da segurança vende muito mais o posto de vigia [sem arma] do que o do vigilante [armado]", afirmou ele.

Conforme dados da Secretaria da Segurança divulgados na internet, entre 2018 e 2021, houve uma queda de 14,2% no total de roubos em geral registrados no estado (caiu de 263.115 para 225.706). Já a redução dos furtos em geral foi de 6,9% (foi de 504.896 para 470.200). Entre roubos a bancos, a queda foi de 66,7%, passou de 54 para 18 entre 2018 e 2021.

Como mostrou reportagem da Folha, como base dos dados da SSP, das 11.985 armas levadas de criminosos entre junho de 2017 e maio de 2022, quase metade (49,9%) estava em ambiente residencial. O restante foi subtraído de locais como estabelecimentos comerciais (25,5%), de veículos em via pública (16,8%) e órgãos públicos (5,8%). Uma em cada seis deles ocorreu por meio de furtos.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.