PM tem o menor efetivo do século, e gestão Tarcísio busca plano emergencial de contratação

SP perdeu 10 mil policiais em 16 anos; especialistas apontam salário e imagem ruins para fuga de interessados

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São Paulo

A Polícia Militar de São Paulo registrou até dezembro o menor efetivo deste século, com 80.137 homens e mulheres, o que representa uma redução superior a 10 mil agentes do quadro existente em 2006 –ano marcado pelos ataques de criminosos da facção PCC às forças de segurança.

A situação é considerada tão crítica que novo o secretário da Segurança Pública, o PM da reserva Guilherme Derrite, após conversa com a cúpula da corporação no início desta semana, anunciou a elaboração de um plano emergencial para tentar recompor o efetivo das polícias de São Paulo.

"Nós estamos passando e vamos passar pela maior crise de efetivo. A PM de SP, que já chegou a ter quase 100 mil homens, vai chegar a 80 mil, sendo que a população não parou de crescer, pelo contrário, aumentou demasiadamente", disse Derrite à rádio Cruzeiro, de Sorocaba, quarta (4).

Imagens de cerimônia de formatura de sargentos da Policia Militar de São Paulo, instituição que perdeu 12% do efetivo em 16 anos - Apu Gomes/Folhapress

O maior efetivo da corporação foi registrado em 2006, quando ela chegou a ter 90.697 PMs em seus quadros, incluindo o Corpo de Bombeiros. Naquele ano, quando criminosos do PCC atacaram as forças de segurança paulistas, o estado tinha uma população estimada em 39.620.277, segundo dados do Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados).

Já em 2022, essa população foi estimada em 45.147.891 pessoas. Com isso, São Paulo que teve, há 16 anos, um efetivo de 229 policiais militares a cada grupo de 100 mil habitantes, passou a ter no mês passado 177 agentes por 100 mil –queda proporcional de 22,7% no policiamento.

O menor efetivo da PM antes de dezembro passado foi no longínquo 1996, nos anos iniciais do governo Mário Covas (PSDB), com 77.374 agentes. Naquele ano, o estado tinha 227 PMs para cada grupo de 100 mil habitantes.

Na entrevista à rádio, Derrite disse que concursos serão abertos para tentar recompor o quadro da PM, e, também, da Polícia Civil e da Polícia Técnico-Científica, que em SP têm estruturas separadas.

"Ontem [terça, 3] eu tive uma reunião com o comandante da Polícia Militar, e daqui a pouco terei com o delegado-geral, doutor Artur Dian, sobre a Polícia Civil, para falar sobre efetivo para que eles apresentem um plano emergencial de recomposição do efetivo, que hoje na Polícia Civil é maior ainda a defasagem, mas a Polícia Militar ultrapassa 12%", disse o secretário.

Ainda segundo ele, o plano emergencial de concursos deve buscar recompor os efetivos o "mais breve possível", mas, em razão do tempo para seleção e formação dos policiais, o governo espera recompor os quadros ao longo dos quatro anos de mandato.

Para especialistas em segurança pública, a queda no efetivo das polícias, quando não recompensada com parceiras ou investimentos tecnológicos específicos, pode provocar um aumento na criminalidade ­–em especial nos crimes patrimoniais, um dos termômetros da eficiência policial.

O estado de São Paulo deve fechar 2022 com alta em uma série de indicadores criminais. No acumulado entre janeiro e novembro deste ano, comparando com o mesmo período de 2021, os roubos de veículos registravam alta de 23,2%, furtos em geral, 22%, e os furtos de veículos, 16,6%, por exemplo.

Os dados finais de 2022 devem ser divulgados no próximo dia 25.

Um dos motivos para essa situação atual da PM é a dificuldade dela em preencher todas as vagas as ofertadas nos concursos para contratação de novos soldados. Em 2021, por exemplo, das 2.700 vagas oferecidas, só 1.348 foram ocupadas por candidatos aprovados em processo seletivo.

Os baixos salários são apontados com um dos fatores. Atualmente, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, um soldado da PM paulista recebe em média R$ 5.460,93 brutos. Em Goiás, em comparação, os soldados recebem em média R$ 9.381,74.

Rafael Alcadipani, professor da FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que a situação da PM tende a se agravar nos próximos anos porque a profissão policial militar não é atrativa, não só pelos baixos salários oferecidos, mas pela própria imagem.

"A imagem é bastante negativa, de violência, de truculência, não é uma imagem que atrai as pessoas a trabalharem na instituição, infelizmente. Isso é uma coisa que não vai mudar rapidamente, não tem mágica para ser feita, e a gente vai ter um problema de efetivo expressivo nos próximos anos. A tendência é piorar", afirmou ele, que diz ver um quadro de melhora com o atual governo.

A Folha solicitou à Secretaria da Segurança Pública, no mês passado, dados sobre o efetivo da Polícia Civil ao longo dos anos. Os números não foram passados pela gestão Rodrigo Garcia (PSDB), que também não apresentou justificativa para o não fornecimento das informações públicas.

A reportagem também solicitou, nesta quinta (5), dados sobre efetivo à nova gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), mas, também não foi atendida. A pasta respondeu apenas com números de contratações.

Conforme dados da Adpesp (Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), a Polícia Civil tinha, em 2011, 34.684 agentes, incluindo as equipes da Polícia Científica. No final de 2022, esse número de policiais caiu para 26.355 —queda de 24%, em números absolutos.

Para Guaracy Mingardi, analista criminal e membro do Fórum de Segurança Pública, é grave a situação da Polícia Civil que, para ele, praticamente abdicou de seu papel de investigar.

"Praticamente não sai das delegacias. Aqui em São Paulo, os distritos fazem o flagrante, atuam em um ou outro caso, normalmente de autoria conhecida. Então, na prática, tocam o inquérito de autoria conhecida. Os de autoria desconhecida, quem investiga são os departamentos como DHPP [homicídios] e Deic [crime organizado]. A Polícia Civil nos distritos está acabando: burocrática, envelhecida e com falta de efetivo."

O presidente da Adpesp, Gustavo Mesquita Galvão Bueno, disse que o elevado déficit da Polícia Civil é uma herança dos 30 anos de governos que, segundo ele, "sempre trataram a instituição com descaso".

"Ainda mais importante que planejar a reposição dos cargos vagos é a valorização salarial dos policiais civis, para que a porta de saída da instituição deixe de ser mais atrativa que a porta de entrada."

De acordo com a Secretaria da Segurança, de 2011 a 2022, foram contratados 40.487 novos policiais militares, 8.395 policiais civis e 2.043 policiais técnico-científicos. "O efetivo atual é de 107,7 mil policiais. Há 581 agentes em formação nas academias e escolas das polícias e concursos em andamento para a seleção de 9,4 mil novos policiais. Além disso, outras 3,5 mil vagas já foram autorizadas", diz nota.

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