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70% dos brasileiros vivem em cidades sob risco de desastres

Órgão federal amplia lista e vai passar a monitorar diariamente 2.120 municípios considerados vulneráveis

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São Paulo

Quatro em cada dez municípios brasileiros são considerados vulneráveis a desastres climáticos relacionados a chuvas extremas, como as que atingiram o litoral norte de São Paulo no último Carnaval. Estas 2.120 cidades concentram 70% da população e muitas delas ficam na costa do país.

Os dados são do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), que anunciou nesta quinta-feira (2) a ampliação da lista, que até então contava com 1.038 municípios. O órgão monitora esses lugares diariamente, emitindo alertas sempre que a previsão do tempo aponta risco de chuvas fora do normal.

Visa aérea de pessoas e destroços em área de terra e lama
Vista aérea das equipes de resgate Vila Sahy, em São Sebastião, área mais afetada pelas chuvas no litoral norte de SP no Carnaval - Bruno Santos - 21.fev.2023/Folhapress

Entre os municípios estão São Sebastião, Ubatuba e outros da região que sofreu com deslizamentos. Foi por meio deste trabalho que o órgão alertou a Defesa Civil estadual sobre a ocorrência de chuvas fortes e o risco de desastres. A Vila Sahy, onde morava a maioria das 65 vítimas da tragédia, foi citada como uma área de alto risco para deslizamentos.

A ampliação foi anunciada pela ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, durante o 10º Seminário Técnico-Científico de Análise de Dados do Desmatamento na Amazônia Legal, em Brasília. "Com esse esforço, dobramos a cobertura monitorada, atingindo 70% da população brasileira", disse a ministra.

A atualização deve ser feita em duas etapas: primeiramente incluindo 235 municípios da região metropolitana de lugares que já são monitorados e, em seguida, acrescentando outros 841. Não há previsão para a divulgação da lista completa.

A maior parte das cidades monitoradas pelo Cemaden fica nas proximidades da costa, nas regiões Sudeste e Nordeste.

Regina Alvalá, diretora substituta do Cemaden, explica que isso acontece porque, devido ao processo de colonização, as principais cidades brasileiras estão concentradas na costa. Além disso, é onde também estão as áreas com a topografia mais pronunciada, como a Serra do Mar e a Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais. "Então, é aí que você tem maior concentração de população em municípios que podem ser impactados por desastres."

O Cemaden foi criado em 2011, após fortes chuvas que mataram mais de 900 pessoas na região serrana do Rio de Janeiro. No mesmo ano, começou o monitoramento de 268 cidades, e já em 2012 o número aumentou para 821, até chegar às 2.120 acompanhadas atualmente.

Os municípios são considerados prioritários porque já tiveram desastres com mortes. O monitoramento é feito por meio de um mapeamento das áreas de risco, acompanhamento das chuvas em tempo real por meio de pluviômetros automáticos e da definição de limites críticos de precipitação que podem causar deslizamentos de terra ou inundações e enxurradas.

Na prática, esse último item significa que cada lugar e cada terreno vão ter um patamar diferente de vulnerabilidade às chuvas. Assim, um ponto pode precisar de muito menos chuva do que outro para que uma tragédia ocorra.

"Se você tem 100 milímetros em 72 horas em Campos do Jordão, por exemplo, [a terra] pode deslizar. Em outras regiões esse limiar é até menor e com 60 milímetros de chuvas acumulados em 24 horas ou 72 horas já pode deslizar", exemplifica a especialista. Essa avaliação de risco é feita analisando 3.000 pluviômetros em todo o território nacional.

"Então, a gente precisa ir acompanhando a chuva que já caiu, a chuva prevista, as descargas atmosféricas —ou seja, os raios—, e os sistemas que causam chuvas, porque eles se deslocam", diz.

Para que essa rede de segurança funcione, no entanto, é preciso que os alertas emitidos pelo Cemaden e outras instituições que atuam nessa área cheguem até a ponta, aos moradores de regiões vulneráveis. Isso acontece por meio das unidades locais da Defesa Civil, que devem avisar a população para que deixe as áreas de risco.

No entanto, segundo um artigo publicado no ano passado, 67% das defesas civis nos municípios enfrentam falta de verba, de pessoal ou de estrutura. A partir de um questionário aplicado em 1.993 cidades, 72% disseram que não têm orçamento próprio para a área.

Além disso, muitas vezes as equipes sofrem alterações quando o comando das prefeituras muda e, assim, uma rede que já tem déficits fica ainda mais fragilizada.

"As defesas civis precisam manter atualizadas as suas informações de telefone ou email para onde encaminhar esses alertas", explica Alvalá. "É muito comum que quando acontecem as eleições de prefeitos e vereadores mude também a chefia da Defesa Civil. Quando muda o secretário, muda também o telefone e o que acaba acontecendo é que esses dados não são atualizados."

A demanda pela ampliação da lista já existia, já que ela não era atualizada desde 2021 —e, de lá para cá, aconteceram desastres com mortes em lugares que não eram monitorados. Exemplos disso são as cidades baianas de Amargosa, Itaberaba, Jucuruçu, Macarani, Ruy Barbosa, Aurelino Leal, São Félix do Coribe, Ubaitaba, Belo Campo e Barra, que somaram 14 mortes nas fortes chuvas que provocaram enchentes em vários pontos do estado em 2021.

"A gente tem observado um aumento da frequência de eventos extremos em algumas regiões do Brasil com chuvas torrenciais e mortes", aponta a diretora substituta do Cemaden.

Na última semana, a ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, Marina Silva, defendeu a decretação de emergência permanente municípios monitorados pelo Cemaden. O objetivo, segundo ela, seria possibilitar o desenvolvimento de ações continuadas de prevenção e facilitar a liberação de recursos.

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