Lula assina a demarcação de seis terras indígenas, as primeiras homologações desde 2018

Territórios compreendem grupo de áreas que há anos aguarda assinatura da Presidência para homologação

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Brasília

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta sexta-feira (28) a demarcação das primeiras seis terras indígenas desde 2018. As assinaturas foram feitas ao lado da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, no Acampamento Terra Livre, em Brasília.

Lula também assinou decretos para instituição do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental em Terras Indígenas (PNGATI) e a recriação do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), instituições que foram desmontadas pelo governo Jair Bolsonaro (PL).

"Eu quero não deixar nenhuma terra indígena que não seja demarcada nesse meu mandato de quatro anos. Esse é um compromisso que eu tenho e que eu fiz com vocês antes da campanha. O que nós queremos, ao terminar o nosso mandato, é os indígenas brasileiros estarem sendo tratados com toda dignidade que todo ser humano merece", disse Lula, em discurso.

O presidente Lula e o cacique Raoni participam da cerimônia de encerramento do Acampamento Terra Livre, mobilização indígena que ocorreu em Brasília durante essa semana.
Cacique Raoni coloca cocar na cabeça do presidente Lula durante cerimônia de encerramento do Acampamento Terra Livre - Pedro Ladeira/Folhapress

"O ato de hoje é apenas o início deste processo de retomada, sabemos do seu compromisso de, ao longo deste ano e dos próximos, do nosso governo, garantir que as demarcações estejam concretizadas e que as terras estejam na posse de seus respectivos povos", afirmou a ministra Sônia Guajajara.

Participaram do evento Marina Silva (Meio Ambiente), Marcio Macedo (Secretaria Geral), Wellington Dias (Desenvolvimento Social), Paulo Pimenta (Secom), Cida Gonçalves (Mulher) e Esther Dweck (Gestão), além da primeira-dama Rosâgela Silva, a Janja, do líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AO), da presidente da Funai, Joênia Wapichana, e de cacique Raoni, uma das principais lideranças indígenas do país.

Janja usou um cocar com o nome de Lula, presente do cacique Raoni. As cores, segundo os Haliti-Paresi, de Mato Grosso, são escudos contra energias negativas. Já para os Fulni-ô, de Pernambuco, o adereço é reconhecido como forma de conexão do guerreiro com o grande espírito.

Durante seu discurso, Lula também ergueu uma faixa da plateia contra a tese do Marco Temporal, que deve ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal em junho.

As seis áreas que serão homologadas estão no rol de 14 territórios que há anos passaram por todo o processo burocrático, mas que nunca haviam sido assinadas.

São elas: TI Arara do Rio Amônia, no Acre, TI Kariri-Xocó, em Alagoas, TI Rio dos Índios, no Rio Grande do Sul, TI Tremembé da Barra do Mundaú, no Ceará, TI Avá-Canoeiro, em Goiás, e TI Uneiuxi, no Amazonas.

A que estava pronta havia mais tempo para homologação era a Avá-Canoeiro, que teve sua portaria declaratória publicada em 1996.

"Vou falar com o presidente Lula agora para ele agilizar a demarcação de terras indígenas para os parentes que não têm, mas também vocês precisam defender esse território para não deixar o garimpeiro e o madeireiro entrar", afirmou cacique Raoni.

Os processos desses territórios pararam no governo Bolsonaro. No início do ano, a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) reiniciou o procedimento de envio deles para a Casa Civil, precisou rever e atualizar a situação de cada território, o que terminou em março deste ano.

A partir de então, a Casa Civil passou a fazer a análise de cada uma dessas demarcações. Apenas seis avaliações foram concluídas até o momento, e por isso a demarcação dos outros territórios não foi feita.

"Estamos na fase de conclusão desses processos. Quando atualizamos, vimos que faltam comprovações documentais. Apresentamos esses processos para a Casa Civil, que não conseguiu concluir para hoje [todos]", explicou Guajajara.

"Vamos agora, a partir da proposta da Apib [Articulação dos Povos Indígenas do Brasil] elaborar um cronograma para a gente atualizar tanto os oito processos que não foram assinados hoje, como também a Funai vai continuar trabalhando para concluir relatórios [de outros territórios]", completou.

Bolsonaro, desde a sua campanha presidencial em 2018, prometeu não assinar nenhuma demarcação de terra indígena e cumpriu a promessa nos quatro anos em que esteve no Planalto.

Lula também anunciará um novo concurso público para a Funai.

Como mostrou a Folha, no antigo governo, a fundação atingiu seu menor quadro de funcionários desde 2008, e a abertura de um concurso era uma reivindicação da presidente da entidade, Joenia Wapichana, e de Guajajara.

Tanto Guajajara quanto Lula defenderam a criação de um plano de carreira para a Funai.

Ainda foi criado um grupo de trabalho para dialogar com a Usina de Itaipu e criar propostas de reparação história aos indígenas Guarani afetados pelo empreendimento.

"Não queremos que os trabalhadores da Funai sejam tratados como trabalhadores de segunda categoria, por isso vamos tratar do plano de carreira de vocês", disse Lula.

Também foram liberados R$ 12,3 milhões à Funai, do Desenvolvimento Social, para "aquisição de insumos, ferramentas e equipamentos às casas de farinha, recuperando a capacidade produtiva das comunidades indígenas Yanomami".

Por fim, também será criado um grupo de trabalho entre o Ministério dos Povos Indígenas e o Ministério da Justiça para combater o avanço do tráfico de drogas sobre populações indígenas.

Para o antropólogo Tiago Moreira, do ISA (Instituto Socioambiental), a escolha dos territórios pode ter partido de aspectos simbólicos e de viabilidade política.

"O governo escolheu seis áreas que aparentemente não têm grandes conflitos, ao mesmo tempo em que têm um peso muito grande de espera pelo reconhecimento. É resolver essa pendência histórica."

Ele diz que a sinalização do governo ajuda a resolver outro problema, que é a falta de segurança jurídica para a promoção de políticas públicas.

"O elemento mais importante é esse gesto da homologação, porque muitas vezes uma prefeitura não vai instalar escola ou posto de saúde na terra indígena porque falta a homologação", explica.

O coordenador executivo da Apib, Kleber Karipuna, diz que demandas ainda não atendidas, como a dos guaranis, do Morro dos Cavalos, e dos pataxós, vão continuar na pauta de cobranças do movimento.

"O movimento indígena tem um papel de articular e cobrar, e a gente vai continuar fazendo esse papel. Mas, claro, em um diálogo muito próximo agora com o governo, com lideranças que estão dentro do governo", afirma Karipuna.

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