SP registra 279 ameaças a escolas na semana em que aluno matou professora

Autoridades alertam para risco de agressores se inspirarem em ataques; número é mais que o triplo do registrado em quase três meses anteriores

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São Paulo

O aumento das ameaças de atentados a escolas nas últimas semanas, logo após o ataque que resultou na morte de uma professora na Vila Sônia, zona oeste de São Paulo, tem levado autoridades e especialistas a alertar para o risco de que o caso inspire novas ondas de agressões.

O crime ocorreu na manhã de 27 de março, uma segunda-feira, na escola estadual Thomazia Montoro. Na própria data do atentado e nos quatro dias seguintes, a Polícia Civil registrou 279 ameaças ou suspeitas de possíveis planos de novos atentados a escolas em todo o estado.

Trata-se de um aumento expressivo no número de casos. De janeiro até o dia 26 de março, haviam sido registradas 82 ameaças do mesmo tipo —em média, quase sete casos por semana.

Policiais militares, um deles portando fuzil, em primeiro plano em frente a muro laranja de escola estadual
Movimentação de policiais na porta da escola estadual Thomázia Montoro, na Vila Sônia, onde um ataque deixou uma professora morta e cinco feridos; número de ameaças aumentou - Rubens Cavallari/Folhapress

Cerca de 20% das ameaças feitas após a morte da professora Elisabeth Tenreiro, 71, ocorreram na Grande São Paulo e foram registradas na área do Demacro (Departamento de Polícia Judiciária da Macro São Paulo), que abrange as cidades que integram a região metropolitana, exceto a capital. A polícia não informou se os casos incluem escolas particulares e municipais ou se ocorreram apenas em unidades estaduais.

A polícia afirma que, entre os dias 11 e 12 de março, duas semanas antes do ataque na escola na Vila Sônia, frustrou "dezenas de possíveis atos violentos em escolas". As investigações desses casos resultaram no cumprimento de sete mandados de busca e apreensão nas casas de suspeitos.

Três adolescentes foram apreendidos com facas, máscaras e bandanas, além de celulares e cadernos de anotação. Esses casos ocorreram nas cidades de São José dos Campos, Caçapava e Tupã, no interior paulista.

Em relação às 279 ameaças, a secretaria não informou quantas se mostraram consistentes e motivaram o registro de boletins de ocorrência ou abertura de inquéritos. Essas situações ocorreram tanto dentro das escolas, com bilhetes e mensagens escritas nas paredes, por exemplo, quanto na internet.

O secretário da Segurança Pública do estado, Guilherme Derrite, disse em artigo publicado na Folha que, no mesmo dia do atentado em São Paulo, cinco jovens foram flagrados com armas brancas em escolas de todo o estado, e uma mensagem com ameaças foi escrita na parede do banheiro de uma unidade na capital.

Para Derrite, as ocorrências são sinais de que a morte da professora inspirou potenciais agressores. "Todos ostentando símbolos, linguagem e máscaras iguais", ele escreveu.


Ameaças ou suspeitas de ataques a escolas de SP

  • 279 foi o número de ameaças ou suspeitas de possíveis planos de novos atentados a escolas em todo o estado registrados de 27 a 31.mar, ou seja, quase 56 por dia
  • 7 foi a média dessas ocorrências registrada por semana de janeiro até o dia 26 de março, totalizando 82 ameaças

Em um dos casos mais recentes, um adolescente de 12 anos foi detido com um canivete na mochila e uma máscara de palhaço em uma escola estadual no Jardim Peri, na zona norte da capital, na última quarta (5) —dia em que quatro crianças morreram em ataque a uma creche em Blumenau (SC). Ele já havia ameaçado uma professora da unidade, que ao ver a máscara, chamou agentes da GCM (Guarda Civil Metropolitana). O garoto foi encaminhado a uma delegacia e liberado, segundo a SSP.

Em uma escola estadual a menos de dois quilômetros da Thomazia Montoro, no dia seguinte ao ataque, uma criança de apenas dez anos usou uma faca de papel para simular um ataque semelhante ao da unidade vizinha.

Um dia após o ataque na escola vizinha, ele usou um origami feito pelo colega em formato de adaga e avançou contra uma colega pelas costas —da mesma forma como a professora foi morta, como mostram imagens de uma câmera de segurança que circularam amplamente. O caso acabou registrado no 34º DP (Vila Sônia) pela direção da escola.

Nos Estados Unidos, estudos já apontaram para o risco de que a cobertura midiática sirva de canal para inspirar novos ataques. Um dos fatores identificados em pesquisas é que os autores desse tipo de atentado buscam justamente alcançar notoriedade com os crimes, e a repercussão dos ataques serve como recompensa.

O pesquisador Ivan Marques, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, defende cautela na análise dessas estatísticas.

"Esse número de ameaças [279 em todo o estado] parece bastante inflado, e precisamos lembrar que a dinâmica nesse tipo de caso é de buscar publicidade e notoriedade", diz. Para ele, parte dos registros podem ser bravatas ou até mesmo uma tática de criminosos para levar o efetivo policial de uma área para outra.

Ele lembra que os ataques a escolas são menos comuns do que vários tipos de crimes, embora isso não apague o horror que essas situações causam. "São eventos raros, tem muito mais casos de chacina no Brasil do que ataques em escolas, e o mesmo vale para os Estados Unidos, onde ocorrem há mais tempo", diz o pesquisador.

Para Marques, o método mais eficaz para prevenir esse tipo de crime deve envolver as comunidades escolares e a rede de apoio psicológico.

Ele afirma ser crítico do aumento do patrulhamento como resposta para esses ataques, pois considera que a prevenção a eles não é dever apenas da polícia.

"É preciso ter uma cooperação entre agentes do campo educacional junto com a parte investigativa, que é o trabalho de inteligência dentro de redes virtuais que promovem ódio, ou seja, monitorar redes neonazistas, fascistas, fóruns na internet que são pouco regulados", diz o pesquisador.

A SSP disse, em nota, que atualmente há 566 policiais militares que atuam na Ronda Escolar, que patrulha o entorno de unidades educacionais. Esses policiais estão permanentemente em contato com as direções das escolas, diz a secretaria. Em algumas escolas, o policiamento ainda é reforçado por um programa que paga diárias especiais a agentes que estão de folga.

"A Polícia Militar reuniu os comandantes das companhias de área com os diretores escolares para discutir a ampliação dos programas e estratégias de combate a agressores ativos", disse a SSP. "A gestão estadual também estuda contratar policiais da reserva para que eles fiquem de forma permanente nas escolas."

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