Descrição de chapéu Escolha a Escola

Escolas de elite dão bolsas e criam projetos sociais para ensinar diversidade

Colégios têm percebido que quanto mais heterogênea é a sala de aula, melhor os alunos aprendem

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São Paulo

As escolas têm percebido que, quanto mais heterogênea é a sala de aula, mais e melhor os alunos aprendem. Isso porque os debates ficam enriquecidos quando existe diversidade —de gênero, credo, raça e classe social.

“Se o estudante é capaz de confrontar experiências distintas, ele aumenta a sua capacidade argumentativa”, diz Fernando Luiz Abrucio, professor de gestão educacional da Fundação Getulio Vargas.

No Brasil, o desafio das escolas, sobretudo particulares, é promover o contato com o diferente. O recorte social gerado pelas altas mensalidades faz com que o convívio fique restrito a estudantes com vivências muito parecidas.

Com mensalidades entre R$ 3.604 e R$ 3.923, o colégio Bandeirantes, na zona sul de São Paulo, trabalha em parceria com institutos que encontram jovens com potencial acadêmico na rede pública e os inserem em instituições privadas por meio de bolsas.

Hoje, o Bandeirantes tem 110 bolsistas, 87 deles oriundos do projeto Ismart (Instituto Social para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talentos). Ao todo, o colégio tem 2.759 alunos.

No oitavo e no nono anos, esses estudantes frequentam a escola pública pela manhã e, à tarde, fazem um curso preparatório. Depois, prestam um exame e, se aprovados, passam a ser alunos do Bandeirantes no ensino médio, recebendo bolsas integrais.

“Para eles, a vantagem é ter a chance de uma educação melhor e conseguir algo diferenciado para a vida futura. Mas tê-los aqui traz uma perspectiva diferente para todos”, afirma Helena Aguiar, diretora de planejamento e integração.

“Não adiantaria nada mantê-los em uma sala separada. A gente quer que o convívio seja o mesmo e que a troca ocorra”, completa.

Ter alunos da rede pública em escolas da elite é um avanço, segundo Abrucio, da FGV. Mas a mistura de estudantes de backgrounds diferentes ainda é pequena em comparação ao que acontece em instituições públicas europeias, cujos alunos convivem e aprendem com a diversidade.

“O que as escolas privadas brasileiras conseguem é melhorar a sua credibilidade perante à sociedade e sensibilizar a elite para o problema da desigualdade. Mas, do ponto de vista pedagógico, ainda tem efeito pequeno”, diz.

Três pessoas assistem filme em sala de cinema. Da esquerda para a direita: um garoto com os braços cruzados, um senhor com gorro andino e bengala e uma adolescente de camiseta branca e macacão
Os venezuelanos Eduardo Andres, 12, e Henrique Frezza, 73, e a aluna do colégio Equipe Júlia Brasileiro, 17, em sala de cinema em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

O colégio Equipe, com mensalidades entre R$ 2.040 e R$ 2.700, dá descontos de até 30% a famílias que têm dificuldades para bancar o valor cheio e bolsa integral para filhos de funcionários.

“Por saber que a escola se restringe a um grupo que tem condições de pagar, nos preocupamos em deixá-la o mais heterogênea possível, embora saibamos que não é tanto quanto gostaríamos”, diz a diretora, Luciana Fevorini. 

Para que os alunos tenham acesso a contextos de vida diversos, o colégio insere no currículo pesquisas de campo, que incluem visitas a comunidades quilombolas e assentamentos de trabalhadores sem-terra, por exemplo.

“Pensando que não é só importante entrar em contato, mas ter uma atuação mais potente nesse dia a dia, a gente também tem os projetos sociais”, afirma a diretora. As atividades acontecem uma vez por semana no contraturno das aulas, e a participação não é obrigatória.

Um dos projetos é o Ver o Mundo, que promove encontros entre estudantes e refugiados. No último dia 31, eles foram a um cinema da capital para assistir ao curta-metragem “Liberdade”, que fala sobre o bairro paulistano de mesmo nome e a presença de imigrantes africanos no local, que é reduto de japoneses, chineses e coreanos.

A aluna do segundo ano Júlia Brasileiro, 17, que participou do projeto no ano passado, foi ao evento para prestigiar os protagonistas do filme, Abou N’Gazy Sidibé e Mamadouyaya Sow, amigos da Guiné que conheceu no projeto.

“Aprendi muito com os imigrantes refugiados, sem ter uma visão de medo ou dó. Só convivemos como seres humanos e de uma forma que vai além da palavra, da língua portuguesa”, afirma.

Esse olhar para o diferente contribuiu para que a escola bilíngue Stance Dual ganhasse um prêmio internacional de embaixadora da paz pela ODAEE (Organização das Américas para a Excelência Educativa) no começo de 2018.

A instituição, que fica na Bela Vista (região central de São Paulo), vai da educação infantil até o ensino fundamental 2, com mensalidades entre R$ 3.900 a R$ 5.900.

A cada ano, os alunos participam de um projeto social diferente, em duas creches, um asilo, uma associação para pessoas com deficiência, um instituto para cegos e uma escola para crianças surdas.

Desse contato, surgiu, por pedido dos estudantes, a criação, no meio do ano, de um curso extracurricular de Libras, a língua de sinais, que conta com seis matriculados.

Para a professora de orientação educacional do Stance Dual Adriana Graciano, os projetos ajudam a despertar a empatia nas crianças e um respeito maior com quem é diferente, ajudando a promover uma cultura de paz.

Mas apenas visitar pessoas com algum tipo de deficiência não é suficiente para ver o outro como um igual, segundo a pesquisadora Denise Crispim, voluntária de ONGs ligadas ao cuidado de crianças com deficiência e mãe da Sofia, 13, com paralisia cerebral.

“É preciso conviver no dia a dia. Se o aluno sai da escola para conhecer o outro, que fica em um espaço separado, sempre vai enxergá-lo e tratá-lo como diferente”, afirma.

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