Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Hino nacional nas escolas é medida repetida por governantes desde Vargas

Após MEC pedir para alunos serem filmados cantando, ministro assume erro mas mantém 'medida voluntária'

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Rio de Janeiro

Antes do governo de Jair Bolsonaro (PSL) pedir a escolas que seus alunos cantassem o hino nacional — e fossem filmados, e os vídeos enviados ao governo—, as gestões de Getúlio Vargas (1936), Artur Costa e Silva (1968), Emílio Garrastazu Médici (1971) e Lula (2009) impuseram alguma medida para obrigar os estabelecimentos a tocar a melodia. 

Sob guarda do atual presidente, o MEC (Ministério da Educação) enviou uma carta a colégios pedindo que alunos, professores e funcionários sejam colocados em fila para louvarem a “pátria amada, idolatrada, salve, salve” em frente à bandeira do Brasil.

Ricardo Vélez Rodríguez, ministro da Educação, a caminho da Comissão de Educação do Senado, após reunião com o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP) - Pedro Ladeira/Folhapress

O momento deveria ser filmado e enviado ao novo governo —nesta terça (26), a pasta mandou novo comunicado dizendo que a gravação deve ser feita por "diretores que desejarem atender voluntariamente o pedido do ministro" e precisa ser "precedida de autorização legal da pessoa filmada ou de seu responsável". 

O resgate do hino tenta fazer valer uma lei aprovada em 2009 para exigir que os estabelecimentos de ensino públicos e privados executem ao menos uma vez por semana a composição que Francisco Manuel da Silva fez em 1831, para a despedida de dom Pedro 1º, que passava o posto de imperador para o filho.

Escrita por Ovídio Saraiva, a primeira letra chamava portugueses de “monstros” e falava em “bronzes da tirania”. A versão definitiva, de Joaquim Osório Duque-Estrada, só vingou no começo do século 20 —por decreto presidencial, virou oficialmente o hino nacional em 1922, centenário da Independência do Brasil.

A legislação que pretendeu resgatar o costume de executá-lo nas escolas foi sancionada por José Alencar, vice de Lula e, à época, presidente em exercício. Teve aval de Fernando Haddad, então ministro da Educação.

Seu autor, o deputado Lincoln Portela (PR-MG), que hoje preside a bancada evangélica na Câmara, apresentou a proposta pela primeira vez nove anos antes —quando tramitou na Comissão de Constituição e Justiça da Casa, em 2000, o projeto de lei teve como relator o homem que 19 anos depois se tornaria presidente, Bolsonaro.

Novidade? Na verdade, não muita. O novo texto alterou a lei nº 5.700/71, que já previa a execução do hino nas instituições de ensino. A redação de Portela reforçou que isso deveria acontecer semanalmente.

À Folha o deputado diz que, se a legislação até então mais recente sobre o tema, de 1971, havia caído em desuso, era preciso de uma nova. Daí a lei de 2009, que “ratifica uma coisa que não estava sendo cumprida”, afirma.

O colégio em que estudou, o Arquidiocesano de Belo Horizonte, “tinha o bom costume de nos pôr em posição de sentido para cantar o hino nacional, era um comportamento extremamente normal”, conta Portela.

Uma vez parlamentar em Brasília, começou a perceber que “a gente estava perdendo aquele sentimento nacionalista, e isso é muito ruim”.

Um adendo que o deputado faz: quando a lei de 1971 entrou em vigor, “era um tempo mais complicado, em que você era induzido a fazer certas coisas”. Refere-se à ditadura militar. Já nos anos 2000 “seria mais natural, espontâneo” reproduzir o hino nacional nas escolas.

VARGAS

Partiu da era Getúlio Vargas a iniciativa de legislar sobre o assunto. Em 1936, 12 anos após a adoção do hino, seu governo determinou a obrigatoriedade de tocar a composição para alunos.

A redação era bem específica: “Ficam adotadas, para a execução do hino nacional de Francisco Manoel da Silva, a orquestração de Leopoldo Miguez e a instrumentação, para bandas, do 2º tenente Antonio Pinto Junior, do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal, no tom original: de si-bemol; e, para canto, em fá, trabalho de Alberto Nepomuceno”. 

Instituições que deixassem de cumprir a lei perigavam ter “proibido o seu funcionamento pela autoridade competente”, alertava o texto.

Em 1968, sob o governo ditatorial do general Costa e Silva, veio uma lei determinando que o hino fosse executado. 

A Constituição de 1988 confirmou o hino como um dos "símbolos da República Federativa do Brasil", junto com a bandeira, as armas e o selo nacionais. 

Para o historiador Carlos Fico, da UFRJ, "a obrigação de cantar o hino decorre de visão questionável de patriotismo, mas está na legislação".

O problema, segundo ele, "está no pedido para que seja lida uma carta com slogan de propaganda do governo e para que as crianças sejam filmadas".

Além do hino, as escolas também devem ler a seus estudantes mensagem assinada pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. A primeira versão demandava que "o Brasil dos novos tempos" seja saudado, e a "educação responsável e de qualidade a ser desenvolvida na nossa escola pelos professores", celebrada.

Terminava com o mote bolsonarista: "Brasil acima de tudo. Deus acima de todos!”. A correção enviada nesta terça não fala mais em "Brasil dos novos tempos", só em Brasil, e lima o slogan de campanha do agora presidente da República.

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