Recursos como imersão em língua inglesa, introdução à cultura maker, desenvolvimento de habilidades interpessoais —as chamadas “soft skills”— e até um primeiro contato com o mandarim estão entre as atividades oferecidas por escolas de elite de São Paulo a bebês a partir de três meses.
De olho no futuro acadêmico e profissional da criança, a ideia é estimular ao máximo suas potencialidades nessa etapa da primeira infância, que vai até os seis anos, considerada um momento crucial do desenvolvimento infantil.
“Existe hoje uma demanda muito grande por pessoas que sejam críticas e que tenham habilidades como liderança e criatividade. Isso se constrói desde pequeno”, diz Cintia Sant’Anna, diretora acadêmica da Maple Bear, rede de ensino com metodologia canadense que tem mensalidade a partir de R$ 2.500.
Em algumas de suas unidades, aceita bebês acima de um ano para imersão total em inglês. O contato com o português acontece só a partir dos quatro anos.
Ela ressalta, porém, a importância de criar um ambiente acolhedor e estimulante, mas com muito cuidado, pois as crianças têm ritmos diferentes de desenvolvimento. “É preciso olhar para todos os aspectos —físicos, emocionais e cognitivos.”
A advogada Juliana Maksoud Mahana, 32, diz estar satisfeita com o progresso dos filhos na Maple Bear. Ela queria uma escola que priorizasse o bem-estar das crianças e respeitasse as individualidades e o perfil de cada um.
Guilherme, de 1 ano e 10 meses, frequenta desde o começo do ano o berçário da unidade da Vila Nova Conceição. Segundo a mãe, ele canta músicas em inglês e fala o nome de cores, frutas e animais.
Henrique, 5, que cursou a mesma escola por três anos, “tem um inglês maravilhoso e só assiste a desenhos e filmes na língua inglesa e sem legendas”, afirma Juliana.
O desenvolvimento de habilidades como criatividade e empreendedorismo, igualmente valorizadas no mundo do trabalho, também já começa a ser estimulado nas crianças dessa faixa etária.
Para isso, são montadas atividades que introduzem a cultura maker, com o uso de materiais como sucata, papelão e massinha para a construção de objetos e brinquedos.
“A possibilidade de concretizar a sua ideia mostra para a criança a potência e a capacidade que ela tem, o que favorece a parte emocional e a autoestima, além de trabalhar o empreendedorismo”, diz Luciana Gama, articuladora pedagógica do Colégio Elvira Brandão, em Santo Amaro, que tem mensalidades a partir de R$ 2.165 (berçário).
Segundo Gama, a incursão ao universo maker começa no berçário, quando os bebês manuseiam diferentes materiais e texturas, entre eles argila, areia, tinta, massinha e papéis, três vezes por semana. A partir dos três anos, eles começam a fazer suas próprias construções.
“Nessa faixa etária, quanto mais a criança for estimulada, mais bem preparada estará cognitiva e emocionalmente, o que vai ter reflexos na vida acadêmica e profissional”, diz.
Na Primetime Child Development, no Morumbi, a novidade, oferecida desde o início deste semestre, é a vivência em mandarim para bebês (a partir de três meses) e crianças até quatro anos. A mensalidade parte de R$ 6.500.
Uma educadora chinesa conduz atividades com as crianças durante uma hora, duas vezes por semana.
Segundo Christine Bruder, psicóloga e diretora da instituição, cerca de 50% dos alunos fazem essa vivência, que é opcional.
Bruder explica que o foco da escola é o desenvolvimento emocional. Há uma educadora para cada dois bebês, e as atividades respeitam o ritmo e o interesse individual de cada aluno, e não a idade, de acordo com o que a neurociência recomenda.
Para Anete Abramowicz, professora titular da área de infância da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), é preciso ter cautela frente a uma tendência que existe hoje de aceleração da aprendizagem.
“Precisamos lembrar que uma criança não é só um futuro, ela é o presente e precisa ter aquilo que é mais precioso, e que temos cada vez menos, que é a possibilidade do exercício da infância —uma forma singular e específica na qual a criança aprende a pensar, a viver, a se socializar”, diz.
Beatriz Abuchaim, gerente de conhecimento aplicado da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, instituição que é referência no tema da primeira infância, vai na mesma linha: “Aprender uma segunda língua não é fundamental na educação infantil, pois isso pode ser feito mais tarde”.
Ela aconselha que, na hora de escolher um berçário, a família avalie o que quer priorizar na vida da criança. “O importante é pensar em estímulos que sejam adequados e em interações que sejam positivas.”
Para Abramowicz, o mais importante é que a criança possa usufruir da infância e conhecer o mundo a partir de atividades como brincar, mexer nas coisas e se relacionar com outras crianças, além de ter tempo livre para formular questões próprias.
“A infância é um período da vida que está cada vez menor. O inglês, por exemplo, a criança pode ter depois. O que ela não vai ter depois é a infância”, completa.
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