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Principal desafio na educação é a continuidade do ano letivo durante pandemia

Há o risco de que milhares de estudantes percam o ano por causa da disparidade digital

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Álvaro Zapatel Alonso Mujica
Latino América 21

Os últimos 60 dias colocaram à prova o modelo educativo em vigor em todo o mundo. No contexto latino-americano, as condições de confinamento tornaram necessárias soluções urgentes, apesar das profundas limitações na oferta de educação pública da região. Nesse contexto, o principal desafio vem sendo a continuidade do ano letivo.

As experiências foram distintas, na região. Por um lado, é preciso destacar a resposta do Uruguai à crise, já que ele foi o único país que avançou na correção da disparidade digital (redução de 11% em um mês na disparidade entre as escolas de contexto mais rico e as mais pobres).

Por meio do Plano Ceibal, o Uruguai conseguiu avançar para a educação virtual com maior sucesso do que seus pares regionais, graças à disponibilidade de manuais digitais para os pais, professores e estudantes bem como à distribuição de equipamentos novos, o que tornou possível orientar o trabalho formativo com um enfoque multidimensional.

Estudantes usam máscara em sala de aula de escola rural em Puntas de San Pedro, no Uruguai - Daniel Rodriguez - 22.abr.2020/ADHOC/AFP

Por outro lado, no Peru, a entrada em operação da estratégia “Aprendo em Casa”, lançada pelo Ministério da Educação, teve como objetivo mitigar os efeitos iniciais do confinamento sobre a continuação do ano letivo.

Nessa linha, cabe destacar que mais de seis milhões de pessoas tiveram acesso às plataformas televisivas, radiofônicas e online colocadas à disposição do público, e a expectativa é que nas próximas semanas comece a distribuição de mais de 800 mil tablets dotados de conexão com a internet, para os domicílios mais necessitados.

O Chile, de sua parte, adiou o início do ano letivo, adiantou as férias de inverno e agora já iniciou formalmente o ano letivo, com uma estratégia de múltiplas plataformas semelhante à do Peru, combinando plataformas como a televisão, o rádio e a internet, e oferecendo guias educativos para os professores e pais.

Apesar desses exemplos, persiste o risco de que, em países como o Peru, milhares de estudantes percam o ano, principalmente em função da disparidade digital que existe entre as diversas realidades do país em termos de conectividade e equipamentos, assim como em termos de preparo prévio para uso de ferramentas digitais.

De acordo com a Unicef, 1,725 bilhão de estudantes, ou 98,6% da população escolar mundial, se viu afetado pela pandemia da Covid-19. De acordo com um relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento publicado em abril, os países da região priorizaram o conteúdo curricular e sua difusão via mídia de massa.

Nessa linha, se destaca o uso de meios tradicionais para complementar a oferta educativa em domicílio, além da oferta de material imprenso facilitada por meio da imprensa escrita. Essas estratégias “de múltiplas plataformas” foram utilizadas pela maioria dos países da região, com exceção do Uruguai, já digitalizado.

A realidade crua é que os centros educativos do planeta não estavam preparados para uma situação como a atual. Um relatório do Centro de Informação para a Melhora do Aprendizado, em 2013, ressaltava que apenas 66% das escolas da América Latina contava com acesso à internet, e que apenas 1 em cada 14 alunos dispunha de um computador.

Infelizmente, o exame PISA realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) no ano de 2018 evidenciou que essa disparidade no aprendizado persiste.

Apesar dos contrastes entre os países latino-americanos, entre os quais o Chile teve o melhor resultado em leitura e ciência e o Uruguai em matemática, nenhum obteve um resultado superior à média entre os integrantes da OCDE. Mesmo no Peru, que vinha registrando melhora constante com relação a avaliações anteriores, mais de metade dos estudantes não cumpre os padrões mínimos de aprendizado de matemática, leitura e ciência.

Nesse sentido, é essencial planejar um currículo educativo que fortaleça as competências gerais e digitais dos estudantes. A crise da saúde nos conduz, por isso, a agregar a transformação digital como eixo da proposta educativa.

Nesse sentido, algumas linhas de ação urgentes que nossos países requerem são:

  1. Sanar as deficiências de infraestrutura e internet móvel, priorizando o uso de smartphones para facilitar a educação remota, e prover internet fixa de banda larga em todo o território. A experiência mexicana “internet para todos” ganha maior relevância nesse contexto, e o “Plano Ceibal” do Uruguai se destaca em termos de equipamentos e conectividade.
  2. Dar ao professor o papel de formador de formadores, a fim de capacitar pais e parentes para o trabalho de acompanhamento educativo.
  3. Criar uma experiência de aprendizagem digital por meio da geração de conteúdo, desenvolver estratégias para acompanhamento de professores, e avaliar o aprendizado dos estudantes.
  4. Desenvolver uma gestão escolar remota orientada a pensar novos métodos de mensuração do trabalho dos professores, que integre professores, funcionários e dirigentes da educação.

Os problemas e as críticas à qualidade da educação não são novos. Mesmo assim, temos a oportunidade de deixar um legado para as futuras gerações que potencie a criatividade, resiliência e liderança. Se temos de eleger em que lado da história estamos, que seja no da solução.

Álvaro Zapatel é economista especializado em políticas públicas e Alonso Mujica é engenheiro e empreendedor na área de educação.

www.latinoamerica21.com, um projeto plural que difunde diferentes visões sobre a América Latina.

Tradução de Paulo Migliacci

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