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Ventilação de salas é inadequada em mais da metade das escolas públicas

Avaliação foi feita por professores em prova federal; item faz parte de protocolos de segurança para retorno às aulas

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Brasília e São Paulo

A ventilação de salas é considerada inadequada em mais da metade da redes estaduais e municipais do país. A situação é melhor nas escolas particulares, mas ainda assim atinge quase duas em cada dez unidades.

Garantir boa ventilação consta dos protocolos de segurança nacionais e internacionais de retorno presencial às escolas na pandemia de coronavírus. O Brasil já é o país no mundo com mais tempo sem aulas, e a vacinação segue a passos lentos.

A situação é pior nas redes estaduais: 44,8% das escolas têm ventilação considerada adequada. Nos municípios, são 46,5%.

Juntos, estados e municípios concentram 38 milhões de matrículas, ou 80% de toda educação básica.

As informações das condições das escolas são dos microdados do Saeb 2019, divulgados no mês passado e tabulados para a Folha por Antonio Piltcher e Daniel Ferreira, do site de jornalismo de dados Pindograma.

O Centro Ensino Fundamental Asa Sul, em Brasília, tem salas de aulas com pequenos basculantes - Raul Spinassé/Folhapress

É a primeira vez que informações sobre ventilação natural, limpeza e tamanho de salas apareceram no questionário dos professores do Saeb, a avaliação federal da educação básica realizada pelo MEC (Ministério da Educação).

Assim, os resultados têm como base avaliação dada pelos próprios docentes, e não necessariamente com conhecimento técnico sobre o tema.

​A rede federal tem situação pouco melhor, com 59,2% de adequação —mas essas unidades respondem por menos de 1% das matrículas. Nas escolas privadas, a adequação é de 81,6%.

Os percentuais refletem unidades em que ao menos 75% dos professores consideraram a ventilação "adequada" e "razoavelmente adequada". Se levada em conta apenas a avaliação "adequada", o cenário é pior: 15,7% nas redes estaduais e 19,7% nas municipais.

Sem coordenação do governo Jair Bolsonaro (sem partido), foram precárias as ações de adaptações para garantir um retorno seguro às aulas presenciais –assim como ocorreu na manutenção das aulas no ano passado.

O MEC pagou de fato 73% (R$ 1,4 bilhão) do recurso previsto para apoio à infraestrutura da educação básica. Os gastos dos estados com educação caíram 9% no ano passado, de acordo com estudo da Rede de Pesquisa Solidária.

Problema de infraestrutura é o 2º maior desafio para o retorno às aulas nas redes municipais, segundo levantamento da Undime (que agrega dirigentes de Educação). A falta de internet lidera.

"Ventilação é uma questão primordial, já que o contágio se dá especialmente por aerossóis, e salas com pouca ventilação são muito arriscadas", diz a coordenadora da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Andressa Pellanda.

"Os números de alunos por turma no país são elevados em todas as etapas e modalidades e, com o crescimento da demanda de matrícula nas escolas públicas, isso se agravou."

Para o diretor do Todos Pela Educação, Olavo Nogueira Filho, não se observou um movimento generalizado de grandes investimentos em reformas, como ocorreu em outros países. "Priorizar a educação não é abrir as escolas a qualquer custo", diz.

Redes do Norte e do Nordeste, que são mais pobres, aparecem com situações mais desfavoráveis. Nas escolas estaduais do Pará, só 18,6% têm ventilação considerada adequada.

prédio com janelas finas horizontais
A escola municipal Habib Carlos Kyrillos, de São Paulo, tem janelas pequenas, que dificultam a ventilação - Mandato Toninho Vespoli

A rede de ensino do Distrito Federal tem as piores condições fora dessas regiões, com 27,1% de escolas com boa ventilação. A capital federal é um dos entes que reduziram gastos em educação mesmo com alta na arrecadação, segundo dados da Rede de Pesquisa Solidária.

O Centro de Ensino Médio da Asa Norte, no Plano Piloto de Brasília, surge nos dados federais com ventilação deficiente. Janelas horizontais quase rente ao teto são a opção de circulação de ar. O mesmo ocorre, por exemplo, no Centro de Ensino Fundamental 214 Sul.

A secretaria de Educação do governo Ibaneis Rocha (MDB) afirmou que, no ano passado, foram transferidos R$ 136 milhões para as escolas. “As unidades têm autonomia para utilizar este dinheiro, conforme a necessidade de cada uma, e fizeram reformas”, diz nota da pasta.

A adequabilidade de ventilação aparece no guia de retorno das atividades presenciais do MEC. O ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro, tem se posicionado favorável ao retorno imediato dos alunos às escolas.

A pasta não respondeu, no entanto, aos questionamentos sobre como escolas e redes com deficiências devem proceder.

Área interna do Centro Ensino Médio Asa Norte, em Brasília - Raul Spinassé/Folhapress

O avanço das infecções e mortes por Covid neste ano forçaram redes a rever planos de retorno, como fizeram o estado e a prefeitura de São Paulo.

"Não tem como cumprir protocolo, a ventilação é o primeiro item de segurança e muitas janelas são fixas, têm vidros para cima, não abrem", diz a professora Nelice Pompeu, 47, que atua na rede municipal de SP.

Os dados indicam que 54,6% das escolas dessa rede têm ventilação adequada, superior à média. No início de março, o Ministério Público recebeu um relatório elaborado pelo vereador Toninho Vespoli (PSOL) que elencou deficiências de infraestrutura em 18 escolas municipais da cidade.

É o caso da escola Habib Carlos Kyrillos e da Maria Luiza Moretti Gentile, ambas na zona sul e com janelas que impedem a abertura completa. A gestão Bruno Covas (PSDB) afirmou que repassou R$ 2,4 milhões às unidades apontadas no relatório para adequação de espaço e reparos.

Segundo a Secretaria Municipal de Educação, R$ 274 milhões foram investidos em reforma e outros R$ 297 milhões para preparar unidades para o retorno.

Com relação ao tamanho das salas, 71,6% das escolas públicas têm espaços adequados. A limpeza é adequada em 84,4%, segundo avaliação dos docentes.

A rede escolar do estado mais rico do país, São Paulo, aparece com destaque negativo no quesito limpeza nos dados. É o 7º pior índice do país, com 76,2% de adequação.

Já a adequabilidade da ventilação da rede gerida pelo governador João Doria (PSDB) é a mesma da média nacional, de 44,8%.

O estado tinha em 2020 um previsão orçamentária de R$ 563 milhões para melhorias e obras em escolas, mas executou pouco mais da metade: R$ 296 milhões.

A Secretaria Estadual de Educação disse, em nota, que repassou R$ 700 milhões às escolas e 4.899 unidades (96% do total) “declararam ter realizado algum tipo de serviço em manutenção, conservação, reparo, ou pintura”. A pasta afirma que orientou prestadores de serviço para seguir protocolos de limpeza.

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