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Aulas presenciais ficam suspensas no RS em meio a imbróglio de decisões e recursos na Justiça

Decreto do governador Eduardo Leite (PSDB) permitia retorno a partir desta segunda (26)

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Porto Alegre

Decisões na Justiça do Rio Grande do Sul mantiveram a suspensão da volta às aulas presenciais nas escolas gaúchas, que poderiam ocorrer a partir desta segunda-feira (26) mesmo com o estado sob bandeira preta — fase de medidas mais restritivas, pelo maior risco de contágio.

A questão, que já vinha sendo discutida no Judiciário do estado, teve novos capítulos de decisões e recursos durante o fim de semana e com o julgamento de agravo no Tribunal de Justiça/RS, no fim da tarde desta segunda, pela 4ª Câmara Cível.

O retorno presencial, para educação infantil e 1ª e 2ª séries do ensino fundamental, havia sido permitido por um decreto publicado na última quinta-feira (22) pelo governo de Eduardo Leite (PSDB).

Nele, o governo gaúcho permitiu a cogestão entre estado e municípios para a educação, definindo que atividades presenciais pudessem retornar mesmo em regiões sob a bandeira preta do sistema de Distanciamento Controlado do estado, quando outras atividades estivessem em bandeira vermelha pelos protocolos municipais.

Por unanimidade, os três desembargadores rejeitaram o agravo e mantiveram a suspensão das aulas presenciais durante a vigência da bandeira preta. Do lado de fora do tribunal, manifestantes protestaram pedindo a retomada das atividades.


“O retorno pretendido deve se dar mediante a constatação de circunstâncias sanitárias seguras para toda a comunidade envolvida, não apenas as crianças, mas também aos pais, professores, auxiliares, atendentes, encarregados da limpeza, merendeiras, colaboradores das escolas e transportadores coletivos", afirmou o relator do processo, desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira.

O relator apontou ainda contradição por parte do governo do estado, que decretou "medida sanitária extrema de restrição (...) reconhecida pela adoção de bandeira preta em todas suas regiões" e, paradoxalmente, flexibilizou com decreto que autorizaria "a circulação de pessoas em alto contingente numérico às escolas públicas e privadas".

​No julgamento, Júlio Sá, integrante e membro da comissão jurídica da AMPD (Associação de Mães e Pais pela Democracia), entidade que apresentou ação questionando a decisão do governo de retomar às atividades, em fevereiro, disse que, para o grupo, ainda não há razões para reformar a decisão pela suspensão.

“Nós éramos a favor do decreto na parte que instituiu a bandeira preta, aplaudimos a decisão do governador, era o necessário naquele momento, o pior momento da pandemia, com UTIs lotadas, mas não entendemos qual foi a razão lógica para instituir a bandeira preta e flexibilizar para as crianças a volta às aulas, expondo a comunidade escolar ao risco”, explicou ele à Folha.

No domingo, uma decisão da juíza Cristina Marquesan, da 1ª Vara da Fazenda Pública, manteve a liminar e a suspensão das aulas durante a bandeira preta, apesar do novo decreto estadual.

“Como não houve a mudança de bandeira nesta semana, a medida liminar deferida continua produzindo efeitos jurídicos — pelo menos até ser modificada por outra decisão judicial em grau de recurso e não por Decreto do Chefe do Executivo Estadual, em respeito ao princípio da separação dos poderes”, afirmou a magistrada na decisão.

O Ministério Público do estado interpôs agravo pedindo que o retorno às atividades presenciais fosse mantido para alunos da educação infantil e dos primeiros dois anos do ensino fundamental em municípios autorizados a adotar a cogestão e com protocolos em bandeira vermelha.

O desembargador de plantão, Luiz Felipe Difini, no entanto, manteve a decisão de primeira instância e a suspensão da volta às aulas até o julgamento do agravo, nesta segunda.

Ao apresentar um novo recurso, na madrugada de segunda, o governo gaúcho alegou que “ao impedir o retorno das aulas presenciais independentemente da situação dos indicadores e das novas regras que o Poder Executivo venha a adotar durante a gestão da crise, [a decisão judicial] retira o próprio poder regulamentador do Poder Executivo, substituindo-o por decisões judiciais tomadas no processo”.

Em março, o governo Leite apresentou ao STF (Supremo Tribunal Federal) um pedido de STP (Suspensão de Tutela Provisória) contra decisão da Justiça estadual que mantinha a suspensão das atividades nas redes pública e privada. O pedido foi negado pelo ministro Luiz Fux.

O governo também questionou as decisões da Justiça gaúcha em uma ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 820) apresentada em abril.

A prefeitura de Porto Alegre, que chegou a anunciar o retorno das atividades presenciais, disse, nesta segunda, que elas só retornariam depois da decisão sobre o recurso apresentado pelo estado.

O Sinepe/RS (Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul) também orientou que as escolas aguardassem a decisão do julgamento.

“É preciso haver um entendimento entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo para que não tenhamos essa insegurança e indefinição. Nossa comunidade escolar, e principalmente as crianças, não merecem essa situação”, diz o presidente do sindicato, Bruno Eizerik.

Flávio Henn, coordenador da Fetee-sul (Federação dos Professores, Trabalhadores Técnicos e Administrativos e Auxiliares Empregados em Estabelecimentos de Ensino) e diretor do Sinpro/RS (Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul), diz que o retorno às aulas presenciais é inerente à vacinação dos profissionais.

“O momento no RS ainda é de alta contaminação, estamos alertando os professores e trabalhadores da educação que o retorno poderá significar um risco não só para eles, mas para todas as famílias envolvidas. Estamos muito preocupados, mesmo sabendo que o retorno é fundamental para as crianças, tem que estar atrelado à segurança”, disse ele à Folha.

No domingo, depois da decisão que manteve a suspensão, manifestantes protestaram em frente à casa da juíza, no bairro Bela Vista, em Porto Alegre. Segundo a Brigada Militar (a Polícia Militar gaúcha), nenhuma ocorrência foi registrada durante o ato.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul divulgou uma nota assinada pelo presidente, desembargador Voltaire de Lima Moraes, afirmando que "não admitirá quaisquer ameaças a seus magistrados e vai adotar todas as medidas legais cabíveis para coibi-las, nos termos da lei".

A Ajuris (Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul) manifestou repúdio ao ato, que ocorreu depois que o endereço residencial da magistrada foi divulgado nas redes sociais.

“Tal tipo de protesto é um despropósito, uma violência moral que põe em risco não apenas a magistrada, mas também sua família”, afirma o texto assinado pelo presidente da associação, Orlando Faccini Neto.

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