Descrição de chapéu forças armadas

Exército reduz número de professores civis e eleva 'encastelamento' de colégios militares

Escolas elevaram quantidade de docentes membros das Forças Armadas; movimento foi observado principalmente nas maiores instituições

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Brasília

Os colégios militares têm reduzido gradualmente o número de professores civis em um movimento que especialistas consideram um "encastelamento" voltado ao pensamento da caserna.

Desde 2018, o número de professores civis em todo o sistema de colégio militar passou de 711 para 666 (queda de 6,8%). No mesmo período, a quantidade de docentes militares subiu de 100 para 159 (aumento de 59%).

Procurado, o Exército não respondeu aos questionamentos da reportagem.

Os relatos ouvidos pela Folha apontam que o movimento, além de envolver um crescimento quantitativo, envolve a ocupação de postos-chave, como as aulas de história. É essa disciplina que trata, entre outros, do golpe militar de 1964 —que integrantes das Forças Armadas preferem chamar de revolução.

Jair Bolsonaro recebe honras militares durante chegada ao Colégio Militar do Rio de Janeiro, em maio de 2019 - Marcos Corrêa - 6.mai.19/PR

O ex-presidente Jair Bolsonaro chegou a pedir para que menções no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) ao golpe militar fossem substituídas por revolução. A Folha apurou que isso teria ocorrido no primeiro semestre de 2021, quando Bolsonaro falava em deixar a prova com a cara do governo.

O movimento é especialmente agudo nos dois maiores colégios militares do país, o de Brasília e o do Rio de Janeiro. Na capital federal, o número de professores civis caiu de 139 para 117. No Rio de Janeiro, eles passaram de 94 para 85. Outro com queda expressiva foi o de Manaus, que saiu de 51 para 36.

Os filhos de militares têm vaga automática nos colégios militares e muitos deles continuam na carreira depois de deixar a instituição, seguindo para a EsPCex (Escola Preparatória de Cadetes do Exército) e em seguida para a Aman (Academia Militar das Agulhas Negras), onde são formados os oficiais da força terrestre.

Com menor presença de professores civis nos colégios militares, última instância onde eles estão presentes nesse percurso, diminui o contato dos membros do Exército com pensamentos para além da doutrina militar.

"Na academia, chamamos isso de problema de endogenia [processo que se forma dentro de um organismo]", diz Rodrigo Lentz, professor de ciência política da UnB (Universidade de Brasília) e especialista na participação política dos militares na história do Brasil.

O problema da endogenia, prossegue o acadêmico, é que ela "favorece uma coesão ideológica da interpretação da formação histórica brasileira, do papel dos militares e da atuação política deles".

Sete dos 13 colégios militares em funcionamento no Brasil entre 2018 e 2022 perderam professores civis no período. Em outros dois, a quantidade ficou estável. Já o número de professores que são militares da reserva cresceu em 12 das 13 instituições analisadas.

Os colégios militares estavam no centro da política educacional do governo de Jair Bolsonaro (PL). No Orçamento de 2023, o Colégio Militar de São Paulo tinha R$ 147 milhões para realizar obras. O valor reservado para a construção de moradia popular no programa Casa Verde e Amarela era de R$ 34,2 milhões.

Uma outra vertente explorada por Bolsonaro foi a militarização de colégios públicos. Para isso, foi criado um programa para a expansão das escolas cívico-militares, que colocavam membros das Forças Armadas e de outras forças de segurança militarizadas dentro de colégios públicos. A ideia inicial era ter 216 escolas desse tipo até 2023.

O modelo, entretanto, não agrada ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a pesquisadores da área.

O ministro da Educação, Camilo Santana, disse que o programa não seria uma prioridade na sua gestão em entrevista à GloboNews no fim de dezembro. "Não vi muita aceitação pelos estados e municípios. Vamos avaliar, mas o próximo ministério terá foco e prioridades, e essa não será uma das prioridades", avaliou.

Pesquisadores da área vão além e pedem a revogação do programa como um todo.

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