Descrição de chapéu Missão Professor

Salário do professor no Brasil não aumenta mais que 50% até o final da carreira

Remuneração inicial subiu, mas estados não têm políticas para valorizar experiência e formação adquiridas ao longo dos anos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Durante toda a carreira, o salário de um professor das redes estaduais do país não ultrapassa, na média, 50% do que ganhava ao ingressar na profissão. A pouca possibilidade de melhora na remuneração é resultado da ausência de políticas que valorizem experiência, formação e avanços acadêmicos dos profissionais.

O dado é de uma pesquisa feita pelo Movimento Profissão Docente com informações das secretarias estaduais de Educação em setembro do ano passado. O estudo aponta que, apesar de o salário inicial ter avançado nos últimos anos, há um achatamento da carreira. Ou seja, não há previsão de evolução salarial ao longo dos anos para os professores.

Sala de aula na escola estadual Primo Bitti, em Aracruz (ES)
Sala de aula na escola estadual Primo Bitti, em Aracruz (ES) - Karime Xavier - 8.mai.23/ Folhapress

Desde a criação do piso nacional em 2008, o salário inicial dos professores das redes estaduais vem melhorando de forma contínua. Esse avanço, no entanto, não é acompanhado de melhorias nos rendimentos ao longo da carreira.

Assim, a diferença de salário pago aos iniciantes e aos que estão no topo da carreira se torna muito pequena ou até mesmo inexistente.

Segundo a pesquisa, em 19 unidades da federação o maior valor possível de remuneração é até 50% maior do que no início da carreira. A amplitude salarial média no país é de 48%.

Em dois estados, Santa Catarina e Sergipe, não há nenhuma evolução na remuneração.

O estudo considerou na análise, para garantir a comparabilidade entre as redes de ensino, a remuneração prevista para professores com licenciatura plena e jornada de trabalho ajustada para 40 horas semanais. Não foram considerados para o cálculo possíveis bonificações.

"Não tem como esperar um professor motivado sem amplitude de carreira. Pagar o mesmo salário de quem está entrando na profissão significa desconsiderar a experiência, o conhecimento que o docente adquire em sala de aula. É muito desmotivador", diz Haroldo Rocha, coordenador do Profissão Docente.

Em nota, a Secretaria de Educação de Santa Catarina informou que há diferentes faixas salariais em sua rede, que variam de acordo com a escolaridade do docente. Assim, os vencimentos ficam entre R$ 3.450 para quem tem formação de nível médio até R$ 8.151.68 para quem tem doutorado.

O formato usado no estado não prevê ampliação salarial ao longo da carreira para os que têm licenciatura plena, o que representa a maior parte dos profissionais das redes estaduais e foi a parcela analisada pelo estudo. A secretaria informou que criou no início deste ano um grupo de trabalho para analisar a "descompactação da tabela salarial do magistério e assim ampliar a valorização dos profissionais".

Procurada, a Secretaria de Educação de Sergipe não respondeu.

A falta de perspectiva de melhores salários tem como efeito a saída de docentes dos cargos nas escolas estaduais. Sem aumento salarial real por quase uma década, a professora Paola Costa, 35, decidiu deixar a sala de aula no ano passado.

"Em dez anos como professora do estado, eu recebi salário com atraso, fiquei anos com os salários congelados. O melhor que pode acontecer é receber o reajuste da inflação em cima de uma remuneração que é muito baixa", conta Paola, que atuava na rede estadual do Rio Grande do Sul.

"Eu amo dar aula, amo estar com os alunos, mas não dava mais para continuar sem prejudicar a minha saúde. O salário é baixo, o volume de trabalho é excessivo e sem as mínimas condições adequadas. É uma somatória muito cruel com o professor", diz. Ela deixou a docência para trabalhar na área de comunicação.

Segundo a pesquisa, dos estados que promovem algum tipo de melhoria salarial durante a carreira, nove utilizam apenas o tempo de serviço como critério para evolução. Titulações acadêmicas e atividades de formação continuada também são consideradas como critérios.

O salário é baixo, o volume de trabalho é excessivo e sem as mínimas condições adequadas. É uma somatória muito cruel com o professor

Paola Costa, 35

ex-professora da rede estadual do RS

"A combinação desses vários fatores é o mais recomendado para estimular os docentes. A evolução por tempo é importante para valorizar a experiência adquirida em sala de aula, mas usar titulação e cursos de formação também é interessante para motivá-los a se aperfeiçoar", diz Rocha.

Para ele, o limite de gastos com servidores, imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), leva os gestores a priorizar o aumento salarial do piso docente para atrair novos profissionais em detrimento da valorização dos profissionais mais experientes.

"O magistério é o quadro que quantitativamente mais pesa no gasto de pessoal de todos os entes federados. Nos estados e municípios, entre 35% e 50% dos servidores são professores, por isso, os reajustes e aumentos dessa categoria têm impacto grande no orçamento", explica.

"De um lado, o gestor precisa cumprir a lei do piso do magistério. De outro, a LRF trava o comprometimento da folha de servidores. São duas leis que estão incompatíveis e o resultado é que os gestores acabam priorizando aumentar o salário inicial."

Apesar de alguns estados terem amplitude salarial alta, como é o caso de Ceará, São Paulo e Mato Grosso do Sul, em que o vencimento no topo da carreira pode mais do que dobrar, poucos são os profissionais que alcançam essa condição.

Em São Paulo, por exemplo, 89% dos professores das escolas estaduais recebiam menos de R$ 5.000 em 2021.

"O governo diz que a gente pode ganhar até R$ 13 mil, mas não dá condições pra isso. Eu trabalho há cinco anos em escolas estaduais de São Paulo, mas só consigo ser contratada de forma temporária porque não fazem concurso. Ou seja, estou sempre ganhando o mínimo", diz Ana Paula Silva, professora de inglês na capital paulista.

São Paulo ficou nove anos sem a abertura de concursos públicos para a contratação de novos professores —um novo edital foi aberto na última quinta (11). Com isso, quase metade (44,6%), dos 216,8 mil docentes da rede, tem contratos temporários. Ou seja, sem a possibilidade de todas as evoluções de carreira.

"Não adianta a promessa de salários altos, quando eles são inalcançáveis. Por isso, muitos colegas acabam se qualificando para conseguir um emprego em escola privada, onde a experiência e o conhecimento são valorizados", diz Ana Paula.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.