'É papel nosso levar inovação às empresas', diz Neca Setúbal sobre fundações

Presidente do conselho do Gife destacou função de instituições familiares e empresariais

Patricia Pamplona
São Paulo

Após três dias de palestras e discussões sobre o investimento social privado no país no 10º Congresso Gife, a presidente do conselho do grupo, Neca Setúbal, enfatizou a função das instituições empresariais e familiares no encerramento do evento nesta sexta-feira (6).

"Se as empresas têm mais dificuldade de arriscar, as fundações têm mais espaço para inovação", disse. "E é papel nosso trazer essas inovações e arriscar mais."

Esse papel, no entanto, nem sempre consegue ser cumprido, segundo Ana Lúcia Villela, presidente do Instituto Alana, que participou do painel "Público, Privado, Comum: Chamados para Novos Campos de Ação" antes do encerramento. "Inovação e risco é uma área controlada, pequena, mas que acaba influenciando as fundações e não dá liberdade de ação para inovar", afirmou. "Minha ideia é que conseguíssemos, aos poucos, usar essas fundações como laboratórios de inovação e risco."

Neca abordou ainda a mudança de contexto em que as empresas se inserem. "As empresas estão caminhando na fronteira [com negócios sociais]. Hoje, não basta estar legalizada, dando assistência médica. Não pode ter só como objetivo o retorno do lucro para os acionistas. Precisa equilibrar o retorno do lucro com o impacto na sociedade."

A cobrança dos consumidores quanto a sustentabilidade das corporações também foi citada no debate que antecedeu o encerramento oficial. Mediado pela jornalista Flavia Oliveira, o painel "Público, Privado, Comum: Chamados para Novos Campos de Ação" reuniu, além de Ana Lúcia, Átila Roque, diretor da Fundação Ford no Brasil, Dario Guarita Neto, presidente do conselho da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Paula Bellizia, diretora-executiva da Microsoft Brasil, e Sergio Rial, diretor-executivo do Santander no Brasil.

"Vivemos num mundo onde o cidadão está se apresentando como um cidadão consciente, que exige das empresas como são feitos os produtos que ele está consumindo", disse Guarita Neto. "Essa nova abordagem muda o campo porque acelera a empresa como grande solucionadora dos desafios que a sociedade tem."

Rial reforçou a importância dessa cidadania ativa. "O chamamento para o protagonismo individual de cada cidadão é muito mais importante do que a espera da empresa e do estado. Tenho receio dessa contínua espera de alguém que venha nos salvar."

Minorias?

A diversidade foi outro ponto de destaque durante todo o congresso e também na mesa com os executivos. Primeira mulher a assumir uma cadeira no conselho do banco Itaú, Ana Lúcia mostrou a exceção que ela é. "A provocação da diversidade nos conselhos [empresariais] é muito bem-vinda. A pesquisa do Instituto Ethos mostrou que, nesses conselhos, 11% são mulheres e 5%, negros. Naturalmente isso se reflete nas decisões executivas."

"Diversidade é representar a sociedade", afirmou Paula Bellizia. "Os conselhos têm que ter 51% de mulheres, 26% de pessoas com deficiência, não por cota. Mas porque a sociedade de divide dessa forma."

Ela ainda pontuou a importância da tecnologia como parte da solução para a desigualdade. "Apoiar a educação com vistas no empreendedorismo virou ponto-chave para a empresa no Brasil. A educação está na base da desigualdade. A gente quer continuar sendo motor da democratização, com acessa à tecnologia para todas as pessoas."

Esta tecnologia, que traz uma série de benefícios, também põe em risco a heterogeneidade de ideias, como ressaltou Rial. "Hoje, você consegue encontrar pessoas que pensam como você. Isso vem acontecendo nas últimas décadas, em que a tolerância ao debate vem se reduzindo a zero. A primeira questão na diversidade é o desafio da tolerância."

Para Átila, essa incapacidade é um risco à democracia, que ele classifica como principal bem comum a ser defendido. "A crise de legitimidade, representação, liderança é um risco tremendo em momento de extremos como o que vivemos."

O papel do investimento social privado nessa crise foi, segundo Neca Setúbal, um dos temas trazidos em todas as mesas nos três dias de congresso. "A gente foi capaz de perceber, entender e valorizar os avanços e ter um olhar sobre limites, equívocos e qual nosso papel nessa crise, quais são os verdadeiros desafios brasileiros e qual deve ser a estratégia."

Para daqui a dois anos, no próximo congresso, a presidente do conselho espera que a questão da desigualdade, outro tema que permeou as mesas, tenha avançado. "Fortalecer a democracia é enfrentar desigualdades, que é enfrentar questões étnico raciais. Espero que no próximo congresso tenhamos muitos exemplos de atuação nessa área."

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