Agências de turismo aliam valorização da cultura e impacto social positivo

Iniciativas têm visitas a quilombos e viagens voltadas para mulheres e para a cultura negra

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São Paulo

Na contramão do turismo de massa, que vem incomodando cidades europeias, agências de turismo no Brasil oferecem roteiros que valorizam a cultura nacional com a preocupação de minimizar o impacto das viagens. São empreendedores que perceberam uma demanda, tanto dos viajantes quanto pessoais.

Após cursarem turismo, Liliane Jacintho e Samanta Mazzolini começaram a trabalhar na área e passaram a se incomodar com o impacto de viajantes em certas regiões. Analisando com o quê e quem elas queriam trabalhar, criaram a Plana Turismo de Experiência, em 2017.

Desde o início a agência trabalha com o Quilombo da Fazenda, em Ubatuba (SP). Lá, os viajantes participam de rodas de conversa com um mestre quilombola, visita à Casa de Farinha comunitária, oficina de artesanato quilombola e trilha na mata atlântica.

Antes de levar turistas para Ubatuba, as empreendedoras se voltaram ao desenvolvimento local, realçando aos moradores a importância de apresentar suas tradições a turistas. “Houve um esforço em mostrar que tudo aquilo que é natural pra eles, como uma receita ou um remédio com folhas, podia virar uma oficina, uma vivência”, explica Liliane.

Para a empreendedora, esse tipo de experiência “propõe uma conexão com o outro, traz muitos espaços para conversas e tem também conexão com a natureza. Quando voltam, os viajantes se questionam como ser mais simples”. 

Após dois anos de parceria com o Quilombo da Fazenda, a Plana pretende levar grupos para outras três comunidades em 2019, na Chapada Diamantina (BA), no Jalapão (TO) e no Vale do Ribeira (SP/PR).

CULTURA NEGRA

Também na valorização da cultura local, especificamente a negra, trabalham os sócios da Diaspora.black. O site nos moldes do Airbnb é voltado à população negra, para diminuir o preconceito sofrido em viagens.

A ideia veio da experiência de Carlos Humberto da Silva, um dos fundadores, vítima de racismo ao  hospedar um casal estrangeiro. Ele os recepcionou e saiu para comprar frutas típicas para os viajantes. Ao voltar, eles tinham ido embora e deixado um bilhete afirmando que “não era bem isso que esperávamos”. 

Mais recentemente, a plataforma passou também a oferecer passeios organizados por agências, sempre focando a cultura negra. 

“Nós mapeamos quem eram as operadoras que tinham destinos com autenticidade e interesse em pessoas, que permitiam uma troca de valorização daquele legado”, diz Antonio Pita, um dos sócios da Diaspora.black. 

Entre as experiências ofertadas, há centros de cultura tradicional, casa de matrizes africanas e quilombos --como o da Fazenda, em Ubatuba. Uma operadora em Salvador é especializada em turismo religioso. “Eles contam a história dos orixás, a relação com as lideranças e as hierarquias. É um marco da cultura local, as visitas são com respeito”, explica Antonio. “A ideia é trazer um reconhecimento de identidade, de cultura.”

EMPODERAMENTO FEMININO

Há agências de viagens que miram também o empoderamento feminino. Uma delas é a Vivejar, fundada por Marianne Costa, integrante da Rede Folha de Empreendedores Socioambientais. Ela diz que trabalha com homens, “mas a prioridade são os grupos femininos, o que representa 70% de nossos parceiros. E nunca trabalhamos com indivíduos, mas sim com coletivos”.

A empreendedora usou da sua experiência de uma década com turismo de impacto para levar viajantes a vários cantos do país, como Vale do Jequitinhonha (MG), Alter do Chão (PA) e Belém, além de pacotes urbanos, como o Morro da Babilônia, no Rio, e Grajaú e Bororé, em São Paulo.

Segundo Marianne, o perfil dos seus turistas é de mulheres, mais engajadas e conscientes, que já viajaram o mundo e que agora querem conexão e imersão, além de uma remuneração justa com todos os elos da cadeia, priorizando fornecedores de dentro da comunidade. A agência também começa a trabalhar com empresas que querem migrar suas reuniões de salas com ar-condicionado para essas comunidades e assim reavaliar seus propósitos.

A Agência Vamos, de Nathaly Fogaça, também mira todas as mulheres em suas expedições, sem distinção de raça, padrão de beleza ou estado civil.

A ideia do empreendimento surgiu quando, após postar na internet os relatos de suas viagens feitas por conta própria e sozinha, recebeu muitas perguntas de outras mulheres sobre os perigos de cair na estrada. Organizou então, no fim de 2016, seu primeiro roteiro de maneira informal: um ônibus para Capitólio (MG) que foi sucesso de inscrição. 

“Vi uma oportunidade, já que muitas mulheres tinham medo, e quis conectar umas às outras. A ideia é questionar, falar sobre padrões, representatividade, e trabalhar no tripé empoderamento feminino, natureza e aventura e esporte”, explica Nathaly. 

De lá para cá, a Vamos já levou mulheres para São Tomé das Letras (MG) e Búzios, Paraty e Ilha Grande, todos no Rio. Além disso, a agência mescla viagens grandes com passeios urbanos ou a cidades próximas, para que possa atrair todo tipo de turista e não pesar no orçamento.

Para fugir do eixo Rio-SP, a Vamos passou a ter “embaixadoras” em outros estados para também oferecer experiências regionais, como um encontro de mulheres acima do peso que será feito em Cambará (RS) nos próximos meses.

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