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Arthur Esteves

Impacto é o nosso ativo, e ESG é o passivo

Um mundo melhor não significa a ausência de experiências negativas, para mudar é preciso investir em experiências positivas

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Arthur Esteves

Gestor de ativos intangíveis na Vox Capital.

Nos últimos meses, gestores de investimentos e instituições financeiras em geral têm manifestado seu interesse pelos investimentos de impacto e ESG no Brasil com lançamentos de produtos e iniciativas de comunicação robustas voltadas para o tema.

Como um reflexo da consciência coletiva do momento atual, este movimento acontece com urgência no mercado e demanda cada vez mais que os capitais público e privado sejam alocados de maneira responsável em ativos que façam do mundo que vivemos um lugar melhor.

Entretanto, antes de dar passos mais longos que a perna, é preciso entender o potencial que estes investimentos têm de nos guiar nesta transição para uma sociedade melhor e, também, saber como alocar este capital com intenção e segurança.

Para isso, existem premissas básicas sobre cada abordagem (ESG e Impacto) que podem nos ajudar. Para trazer essas premissas, podemos usar uma terminologia de contabilidade que todos do mercado conhecem, a do ativo e do passivo.

Qualquer balanço patrimonial contabiliza os ativos e os passivos de uma empresa. Os ativos geralmente são bens e direitos que uma empresa tem ao oferecer seus produtos e serviços, enquanto os passivos representam as obrigações e custos desta oferta.

O faturamento, dinheiro em caixa e estoque são alguns exemplos de ativos que têm como função valorizar a empresa por suas iniciativas, e, no outro lado da balança, temos os empréstimos, pagamento de salários e impostos como exemplos de passivos que têm como função responsabilizar a empresa pelas mesmas iniciativas.

Financistas dizem que um balanço patrimonial não é muito diferente de como enxergamos a vida. Ora vivenciamos experiências que percebemos como positivas, ora percebemos de forma negativa.

Tendemos a querer contar apenas com as conquistas para construir nossas histórias, porém, sabemos que, lá no fundo, as derrotas são tão marcantes quanto as conquistas.

Quem já estudou administração sabe que o valor final de todos os ativos deve ser idêntico ao valor dos passivos. Portanto, a verdade é que não é possível viver em harmonia, ou ter uma empresa financeiramente saudável, sem reconhecer os dois, pois é a partir de sua polaridade que é possível construir e sustentar o valor que damos à vida.

Isso se aplica também aos investimentos de impacto e ESG. Empresto a definição do Pitchbook, o “oráculo” dos investimentos privados, para definir cada um.

“Embora muitos possam confundir investimentos de impacto com investimentos ESG, o primeiro está buscando causar um impacto mensurável nos investimentos, enquanto o último é uma abordagem para identificar riscos não financeiros que podem ter um impacto material no valor de um ativo. Os fatores ESG (ambientais, sociais e de governança) fazem parte de um processo de avaliação de investimentos, enquanto o impacto é sobre o tipo de investimento que um gestor está mirando.”

O impacto é o nosso alvo, o bem que buscamos conquistar —um impacto positivo na sociedade. O ESG, por outro lado, são os fatores que, por mais que sejam não-financeiros, representam os custos sociais e ambientais envolvidos para atingir este alvo.

Desta forma, podemos dizer que o impacto desejado e mensurável, sendo ele positivo, se caracteriza como um ativo, enquanto os fatores ESG, que reconhece os riscos negativos, se caracteriza como um passivo.

Com esta visão, fica claro que as duas abordagens são necessariamente complementares e devem andar juntas para a nova forma de investir que a sociedade pede. Porém, como tudo que é novo, esta não é, necessariamente, a realidade que vemos no mercado hoje.

Notamos que, em muitos casos, as políticas de investimentos ESG sendo desenvolvidas mais recentemente não consideram o impacto final do ativo alvo para a tomada de decisão de alocação do investimento.

Ao nosso ver, isso pode gerar interpretações equivocadas sobre o potencial de uma abordagem ESG para provocar as mudanças que tanto queremos e precisamos.

É como se nós olhássemos apenas para os passivos de uma empresa para a tomada de decisão, sem refletir sobre o que este custo está sustentando —afinal, se implementamos uma política que identifica “riscos não-financeiros” de um investimento, é em troca de quais “retornos não-financeiros”?

O mercado financeiro evoluiu muito nas últimas décadas a partir da inclusão da dimensão do risco financeiro nas análises de investimento. Isso foi importante, pois até a crise de 1929 as análises eram baseadas apenas na dimensão do retorno financeiro.

O contexto que vivemos reforçou esse pensamento e fez com que a abordagem ESG fosse incluída nessa lógica de análise risco-retorno, dentro da dimensão do risco “não-financeiro”. Porém, não podemos esquecer que para fazer do mundo um lugar melhor, também precisamos adotar a dimensão do retorno “não-financeiro”.

Todo investimento tem um impacto, seja ele positivo ou negativo, e com a informação e a tecnologia que temos hoje, é cada vez mais possível avaliar e dar transparência para os impactos causados por nossas escolhas.

Sabemos que isso vai nos custar, pois os momentos negativos fazem parte, mas precisamos, mais do que nunca, sermos responsáveis por tomarmos melhores decisões para construirmos um mundo melhor.

Se não formos nós mesmos a dar o primeiro passo, quem será?

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