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Síndrome de Down: Empreendendo a construção de suas próprias vidas

É necessário construir pontes e prover recursos de acessibilidade para garantir a expressão de suas vontades

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Laís de Figueirêdo Lopes

Sócia de Szazi, Bechara, Storto, Reicher e Figueirêdo Lopes Advogados, mestre em Direitos Humanos pela USP e doutoranda em Direito Público pela Universidade de Coimbra. Foi assessora especial na Secretaria Geral da Presidência da República de 2011 a 2016.

Stella Reicher

Sócia de Szazi, Bechara, Storto, Reicher e Figueirêdo Lopes Advogados e mestre em Direitos Humanos pela USP.

Vinicius Fidelis Costa

Estagiário de Szazi, Bechara, Storto, Reicher e Figueirêdo Lopes Advogados

Nos últimos dias circulou a notícia da posse da primeira vereadora com síndrome de Down do país, em Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul. Luana Rolim de Moura, 26, é fisioterapeuta, foi eleita como suplente e tomou posse recentemente.

É uma conquista que merece celebração. Reforça que a sociedade pode ser inclusiva, que pessoas com deficiência intelectual têm vez e voz e podem trabalhar e estar em espaços institucionais. Mas ainda temos muito a avançar.

Nosso sistema jurídico reconhece às pessoas a capacidade civil para exercer direitos ao atingir a maioridade, permitindo decisões da vida cotidiana como casar e ter filhos, trabalhar ou estudar, onde e com quem morar, adquirir um bem, votar e se candidatar, entre outros.

mulher de cabelos longos e óculos sentada em uma mesa de madeira, com bandeira nacional ao fundo
A fisioterapeuta e suplente de vereadora Luana Rolim de Moura (PP), 26, foi empossada vereadora em Santo Ângelo (RS) - Arquivo pessoal / Maria Lúcia de Moura

No entanto, nem sempre foi assim para pessoas com deficiência intelectual. Prevalecia na legislação entendimento de que elas eram presumidamente incapazes. Sujeitas a processos de interdição, eram impedidas de praticar os atos mais rotineiros da vida civil.

A mudança de paradigma veio após a conquista da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, em 2006, que reconheceu pessoas com deficiência como titulares do direito de exercer seus direitos, ou seja, todos são capazes e a deficiência é um traço da diversidade humana.

Ratificada pelo Brasil em 2008, a Convenção influenciou a Lei Brasileira de Inclusão de 2015 que, na mesma linha, modificou a lei civil para afirmar que deficiência não é sinônimo de incapacidade.

Superar as barreiras e o preconceito chamado de “capacitismo” requer ações imediatas. É necessário construir pontes e prover recursos de acessibilidade para garantir a expressão das vontades das pessoas. Além de leis e políticas públicas inclusivas, o papel da família é fundamental pois podem criar ou remover barreiras desde a primeira infância à participação efetiva na educação inclusiva.

É preciso que as pessoas com síndrome de Down conheçam seus direitos para demandá-los. Merece destaque a atuação do grupo de autodefensores do Instituto Jô Clemente e da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.

Nesses espaços conhecem seus direitos, compartilham situações pessoais, dúvidas e têm apoio para seguir em frente quando decidem se casar, constituir família, estudar e trabalhar.

Viver de forma independente também é importante. Neste campo, o Instituto JNG é pioneiro. Seu projeto piloto para construção de moradias independentes para pessoas com deficiência busca, com a oferta de suportes individualizados, permitir que vivam de forma autônoma.

É imprescindível oportunizar o acesso ao trabalho e a renda. A formação profissional deve se somar à educação inclusiva, que traz as bases na preparação para o mercado de trabalho e vida em sociedade.

Neste campo, organizações da sociedade civil têm fomentado caminhos possíveis via capacitação profissional, emprego apoiado e empreendedorismo social.

Ressalte-se a experiência do Instituto Chefs Especiais, que trabalha inclusão social e autonomia por meio da gastronomia –área em que pessoas com síndrome de Down vêm se destacando.

É o caso de Gabriel Bernardes Lima, 24, que criou com a família a Downlicia, loja de brigadeiros com quase 300 mil seguidores no Instagram, e a Jéssica Pereira, proprietária do Bellatucci Café, empreendedora com síndrome de Down.

Também no universo das mídias digitais, essas pessoas têm demostrado suas potencialidades, a exemplo da "influencer, youtuber e tiktoker" Cacai Bauer. Ela tem mais de 270 mil inscritos no YouTube, 300 mil seguidores no Instagram e 1,5 milhão no Tiktok. São jovens que começam a nos mostrar uma infinidade de possibilidades.

Pessoas com síndrome de Down podem ocupar cargos políticos, ser artistas, ativistas, professores, chefs, comunicadores, advogados, médicos ou o que quiserem.

Dia 21 de março é o Dia Internacional da Síndrome de Down no calendário da Organização das Nações Unidas. A escolha desta data não se deu por acaso. As pessoas com a síndrome têm um terceiro par de cromossomos 21, por isso o 21/03.

Que este dia todos os anos nos sirva para lembrar que as pessoas com deficiência podem ser empreendedores de suas próprias vidas, arrojados e dedicados à realização de coisas difíceis ou fora do comum, nas quais acreditam. A diversidade humana é bem-vinda e deve ser celebrada.

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