Nem sempre "a vida passa na TV", como cantava Lobão. Apresentador desenvolto em tardes de sábado, Luciano Huck, 36, ajusta o foco para atuar por trás das câmeras.
Ele conta que, ao amadurecer, "cortou tudo" de sua vida que não importava e decidiu se dedicar a duas grandes cenas.
Em uma, a exposição é inevitável, mas, na outra, ele pretende passar longe dos holofotes: o Instituto Criar, que dá cursos técnicos no setor audiovisual a jovens de baixa renda da região metropolitana de São Paulo.
"Nunca tive em minha carreira o que eles têm. O mercado deve entender o instituto como gerador de bons câmeras, de bons roteiristas", diz.
Ao contrário dos aprendizes do Criar, provenientes de famílias de baixa renda, o idealizador do instituto cresceu na classe média paulistana.
Filho de um advogado e de uma professora, desde cedo descobriu que seu negócio era a comunicação. "Minha grande influência foi Mário Escobar de Andrade, [segundo] marido da minha mãe e pai do meu irmão. Foi um grande jornalista. Meu primeiro contato com comunicação foi a mídia impressa."
Novos olhares
E esse prazer Luciano transformou em trabalho -mas percebeu que se dedicar a apenas um de seus ângulos não era o suficiente. "Queria sentir que fazia a diferença em alguma coisa palpável. Comecei, então, a estudar o terceiro setor."
Na gravação de um programa em Niterói (RJ), em conversa com um garçom, o roteiro começou a tomar forma.
"Fui à churrascaria na frente do set [de filmagem] almoçar e perguntei: Bicho, quantas refeições vocês já serviram aqui hoje?; ele disse: 400. Havia 400 pessoas trabalhando para um programa de televisão! É profissão pra caramba. Onde eu tinha que atuar estava literalmente na frente do meu nariz."
Para Luciano, a inversão de papéis e a inserção de novos olhares são os grandes trunfos do Instituto Criar.
"No Brasil, foi sempre o rico filmando o pobre. Aparelhamos os jovens para que eles tenham o seu próprio ponto de vista. É a democratização do audiovisual", afirma.
Fora do enquadramento das lentes, ele prefere ser coadjuvante e deixar aos jovens os papéis principais. "Quando vou gravar um comercial e começo a cruzar com gente que saiu do instituto é muito, muito legal."
E não é só com um ou outro que ele encontra. Todo ano o instituto forma 150 alunos -desses, 72% arranjam um emprego e ganham R$ 850 mensais, em média.
"Tinha certeza de que o Criar mudaria minha vida. Para entrar, mostrei que queria muito. Hoje sou uma nova pessoa. É meu primeiro emprego" - LUIZA FERREIRA, 18, monitora e ex-aluna