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Francisco Alemberg de Souza Lima

Quem é ele?

Francisco Alemberg de Souza Lima, 44 anos, músico, pesquisador e produtor cultural, casado, dois filhos. Nasceu e mora em Crato (CE).

Criou a Fundação Casa Grande, uma escola de referência em educação no sertão do Cariri que transforma crianças e jovens em gestores culturais protagonistas de suas histórias

Inovação: Ao se apropriarem da gestão cultural da Casa Grande, as crianças participam de um processo de autoaprendizado contínuo que leva ao protagonismo, ao olhar crítico e à valorização da cultura local

Impacto social: Beneficia diretamente cerca de 70 crianças

Sustentabilidade: A fundação se financia por meio de parcerias com as esferas públicas e privada e com o terceiro setor e a partir da prestação de serviços (produtora cultural e receptivo de turismo)

Alcance: A experiência expande sua filosofia por meio do Pontão de Cultura, do Ministério da Cultura. Como consultor da Unicef, Alemberg implantou irradiadoras em assentamentos de sem-terra no Ceará e no Rio Grande do Norte. A filosofia da Casa Grande também chegou a Moçambique e Angola. Intercâmbios de formação ocorrem com países como Itália e Portugal.

www.fundacaocasagrande.org.br

Meninada do sertão

Músico cria 'quartinho de brincar' em que se constrói o futuro com o desvendar do passado

CÁSSIO AOQUI
da Folha de S.Paulo

Quando pequeno, o menino Francisco Alemberg de Souza Lima dizia que, no dia em que virasse homem grande, teria um quartinho só para brincar.

Hoje, aos 44 anos e ainda menino, o grande homem enche os olhos de brilho ao falar da Fundação Casa Grande, um privilegiado quartinho de brincadeiras que divide com outras 70 crianças e mais de 25 mil curiosos que ali passam anualmente.

Está tudo lá. A paixão antiga por quadrinhos foi traduzida no rico acervo da gibiteca, onde não poderia faltar toda a coleção da revistinha "Tex", seu gibi favorito.

No recinto ao lado, prateleiras recheadas de nomes como Vittorio de Sica e Giuseppe Tornatore revelam a preferência pelo cinema italiano.

E, se na primeira infância Alemberg escreveu um livro e vários gibis, na atual, montou uma biblioteca e desenhou a Casa Grande Editora, onde a meninada inventa personagens e produz materiais educativos.

Até a banda de lata que tinha com o irmão não ficou de fora -deu origem aos grupos musicais Os Cabinha e Abanda.

"A Casa Grande é o resumo da epopeia da minha infância", define o moleque cearense. "Tenho a alegria de ter estendido minha meninice até hoje."

Homem de cariri

Exímio contador de histórias e mitos ­-tanto que foi a inspiração de Selton Mello para o personagem Chicó, do filme "O Auto da Compadecida"-, Alemberg também tem em sua fábula uma heroína: a arqueóloga Rosiane Limaverde.

Juntos, formaram a dupla Alemberg e Rosiane e viajaram por todo o Brasil apresentando em festivais canções compostas a partir de pesquisas sobre a mitologia dos cariris, primeiros habitantes do sul do Ceará.

"A primeira pesquisa foi sobre a lenda da pedra da batateira, que diz que que a região seria inundada um dia, e os cariris voltariam ao sertão", lembra Rosiane.

Ela também foi a pedra fundamental para a criação, em 1992, do Memorial do Homem Kariri, na mais antiga casa de Nova Olinda, pertencente à família de Alemberg. Como se a lenda tivesse de se cumprir, o casal inundou o sertão com as histórias de seus ancestrais.

Feita de menino para menino, a Casa Grande tem o ideal de "criar um lugar com a língua da qualidade, tendo a mitologia como pontencializador social".

É com um olhar pueril, eternamente infantil, que seu mentor escava um lema, parafraseado de um verso do poeta Patativa do Assaré: "Pra onde eu olho, vejo um verso se bulir".

"Quando olho para a natureza, vejo uma cachoeira de rimas caindo por cima de mim. Quero desenvolver uma condição de a gente poder ver sempre os versos se bulirem. Por mais que a vida seja dura, por onde passa, a gente pode ver esses versos", sonha o visionário Alemberg, ou, como descreve Rosiane, o verdadeiro homem de cariri.

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CONHEÇA MAIS SOBRE A FUNDAÇÃO CASA GRANDE

Jovens comunicadores em prol da cidadania

A base do trabalho da Fundação Casa Grande está na construção da identidade a partir da cultura de origem, estabelecendo uma relação entre as raízes da cultura local e os canais de comunicação dessa cultura com o mundo.

Assim, antes de aprender as técnicas de rádio ou TV, procura-se entender como era a comunicação na pré-história da região.

O rádio, um dos meios de comunicação pioneiros na Casa Grande, mostra-se um meio particularmente inclusivo. É fácil fazer rádio.

Se o jornal impresso exige o domínio da escrita e a produção de vídeo envolve um processo complexo e custoso, o rádio, por sua simplicidade, favorece a autonomia dos adolescentes.

A simplicidade da tecnologia permite que a criança opere equipamentos e apresente programas. Aprende-se "no ar", e os erros inerentes ao processo de aprendizagem não ficam registrados, assumindo um peso menor sobre a autoestima.

Desde cedo, os adolescentes sentem-se radialistas profissionais na Casa Grande FM, pois fazem sozinhos programas que têm grande impacto na cidade.

Mas, mais que lidar com equipamentos de rádio, operar uma câmera de vídeo, fazer um jornal ou escrever um roteiro, as crianças da Escola de Comunicação Meninada do Sertão realizam um exercício de cidadania.

Aliando o jeito do sertão com as novas tecnologias de comunicação, essa geração de comunicadores é responsável ainda pela TV Casa Grande, com programas diários, e também uma editora de jornais e quadrinhos.

O método utilizado baseia-se no acesso e na internalização de novos saberes de qualidade em assuntos como memória, patrimônio, cultura, ambiente, arte, arqueologia, mitologia e cidadania.

Anualmente, são produzidos 72 programas de TV (para os canais Futura e 100 Canal); cerca de 40 espetáculos (incluindo dos grupos musicais nascidos ali, Abanda e Os Cabinhas, que, em 2008, produziram dois CDs); 3.285 programas de rádio; 96 exibições de cinema; 48 aulas de campo de educação patrimonial; 12 cursos de gestão cultural; e 21 blogs pessoais.

Seleção

Não há seleção para ingressar na Casa Grande, que está aberta a qualquer criança que queira participar do projeto.

Mas os diretores da ONG definiram, em conjunto com os jovens, que deve haver um período de adaptação no qual se cobra constância e qualidade.

É fácil perceber quais os meninos que se encontram neste período: são aqueles que circulam pela Casa Grande sem o uniforme da fundação.

Para ganhar o uniforme (ou a "farda", como dizem no Ceará), os meninos recém-chegados precisam demonstrar vontade de aprender e preocupação com qualidade, aspectos valorizados no projeto.

A criança que chega pequena pode passar até dois anos frequentando a "escolinha". A partir dos oito ou nove anos, já participa de outras atividades e laboratórios da escola de comunicação.

Todos têm que passar, mais cedo ou mais tarde, pela função de recepcionista do museu, considerada fundamental para a formação pelos líderes da ONG.

Não há um período de tempo predefinido entre a entrada no projeto e o recebimento do uniforme e as decisões a esse respeito dependem do desenvolvimento de cada menino e são sempre tomadas coletivamente, por diretores e adolescentes.

Conheça alguns dos projetos desenvolvidos pela Fundação Casa Grande

Memória, artes, comunicação e turismo são as quatro linhas principais que regem as ações da Fundação Casa Grande. Este ano, porém, dois novos focos foram incluídos: ambiente e esporte.

É a partir desses eixos-temáticos que a instituição define sua programação, que tem em suas bases os laboratórios de conteúdo e produção.

Na gibiteca, na biblioteca e na DVDteca, os garotos têm acesso a um acervo escolhido a dedo por eles e por Alemberg com clássicos e contemporâneos, nacionais e internacionais.

No museu, exploram e difundem o universo dos antepassados. No laboratório de internet, criam e atualizam os blogs pessoais.

Colocam a mão na massa na rádio FM, que tem programação diária das 5 da manhã às 10 da noite planejada e executada por eles, e no estúdio de TV, onde produzem programas em parceria com o canal Futura.

No estúdio de gravação, os grupos Abanda e Os Cabinhas gravam CDs e se aprimoram musicalmente e, na editora, desenvolvem peças gráficas e gibis.

Nos sítios-escolas de educação ambiental e no laboratório arqueológico, pela primeira vez no Brasil, jovens participam dos trabalhos de escavação, resgate e preservação de seu próprio patrimônio histórico.

Podem-se mencionar ainda a brinquedoteca, o parquinho e o teatro Violeta Arraes - Engenho de Artes Cênicas, voltado à produção de espetáculos e formação de plateia, reunindo processos e ferramentas tecnológicas à gestão do patrimônio cultural.

O objetivo desses laboratórios é a formação interdisciplinar das crianças e jovens gestores culturais na sensibilização e no desenvolvimento do ser, do ver, do ouvir e do aprender a fazer e a conviver.

Veja em que se baseia o trabalho da Fundação Casa Grande

A Casa Grande tem como alicerce inovador de seu trabalho três filosofias estratégicas de atuação: a valorização da qualidade integral, a redescoberta do passado como instrumento de definição do presente e do futuro e o incentivo ao protagonismo.

Qualidade integral

Mais do que complementação escolar, a fundação oferece às crianças e aos jovens atendidos diretamente uma sólida formação generalista de qualidade, que permite incursões no campo da história, da arqueologia, da cultura, da educação ambiental, da cidadania, da comunicação e das artes, entre outros.

Assim, as obras que preenchem o acervo da biblioteca, da gibiteca, da DVDteca e da discoteca, por exemplo, são selecionadas de acordo com parâmetros como a contribuição para o desenvolvimento da aprendizagem e para o crescimento emocional, intelectual, ético e social das crianças e a utilização das ferramentas de tecnologia da comunicação, entre outros.

Na Fundação Casa Grande, o desempenho dos jovens é medido pelos produtos gerados nos laboratórios de produção e que foram inspirados nas referências adquiridas nos laboratórios de conteúdo.

Semanalmente, os meninos e meninas escrevem em blogs sobre a semana de aprendizado. A avaliação é interna e externa. No ato de escrever e organizar ideias, são observados.

O trabalho, agora, é o de criar o hábito da leitura, do estudo, do ócio criativo. E, nesse observar, descobrem-se também a agilidade de pensamento e criatividade de muitos. Gostos e aptidões são revelados ao mundo.

Na TV Casa Grande, os jovens não fazem uma cópia de programas populares: desenvolvem uma técnica e uma linguagem próprias pela riqueza que o contato com essas referências de qualidade proporcionam.

"A fundação não forma fotógrafos, editores ou locutores de rádio. A mídia aqui é uma ferramenta de transformação. Ela amplia a imaginação, a capacidade de expressão e a visão sobre a realidade da comunidade", diz Alemberg.

Passado x presente

O trabalho desenvolvido pela Casa Grande parte sempre do resgate da cultura de origem, ou seja, dos mitos e lendas do ancestral homem cariri, o primeiro a habitar a região na Pré-História.

Por meio de um processo inclusivo e participativo, estudam-se na prática os sítios arqueológicos e mitológicos do sertão do Cariri.

Ao escavarem as cavernas em que viveram seus ancestrais, apoiados por profissionais tecnicamente qualificados, jovens e crianças fazem uma viagem para dentro de si, numa reveladora jornada de autoconhecimento em plena chapada do Araripe.

Já no local onde atualmente está sendo construído pela fundação um parque esportivo e cultural, a população de Nova Olinda poderá conhecer o ponto em que as aldeias indígenas se fixaram antes da colonização, bem como a forma como viviam seus ascendentes diretos.

É uma segunda etapa da ocupação humana, cujo ciclo se encerra com o próprio edifício sede da Casa Grande, o primeiro a ser construído na cidade, com a chegada dos portugueses.

Protagonismo

A liderança exercida pelos adolescentes tem um papel importante no projeto.

Como os criadores da organização moram em uma cidade vizinha, lideranças entre os jovens emergem quase que espontaneamente e passam a estruturar o trabalho e o dia a dia da fundação.

Eles ficam responsáveis integralmente pelo cotidiano da Casa Grande. Porém, o conceito de autonomia não se aplica apenas à participação nos programas e produtos.

Ele se estende à própria gestão, aos cuidados com a limpeza e a organização do museu e da escola de comunicação, além da formação das crianças menores recém-chegadas ao projeto.

Um aspecto interessante dessa autonomia é que não há uma separação entre trabalho manual e intelectual. Todas as atividades são vistas com o mesmo grau de seriedade e responsabilidade. É uma concepção que vai na contramão do mundo dos especialistas.

Na Casa Grande, todos participam de atividades que vão desde um programa de vídeo até a obra de construção do teatro.

Para reforçar o protagonismo das crianças e jovens que participam da fundação, buscou-se posteriormente e de forma estratégica envolver seus pais, por meio da geração de renda.

Foi, assim, criada a Cooperativa de Pais e Amigos da Casa Grande, para atender a demanda de turistas que visitam a instituição e a região com a instalação de pousadas domiciliares, lojinha, traslados e restaurante.

A visão de um dos beneficiários do projeto

"Cheguei à Casa Grande quando tinha 12 anos. A gente começou a vir e, quando a recepcionista saía, a gente tomava conta.

Era um lugar para se autoconhecer.

Alemberg abriu as portas de Nova Olinda para o mundo. E, graças a Deus, tive o prazer de entrar por aquela porta.

Minha vida mudou depois disso. Vim a conhecer cinema, música, a vida. Vim a ser cidadão.

De repente, saí da agricultura e passei a ter conhecimento do que é um bom cineasta, um bom fotógrafo, uma boa música. A ser crítico.

Quando entrei na Casa Grande, cuidava do jardim. Depois, me interessei pela parte técnica. Foi onde me encontrei.

Fui diretor "das plantas", de manutenção, de esportes; fui pra rádio, virei coordenador do projeto, monitor e gerente.

A gente começou a fazer gestão sem saber o que era gestão. Cheguei ao conselho cultural e me tornei coordenador técnico.

Hoje, trabalho no Sesc como técnico no teatro, com iluminação. Vou fazer vestibular para eletromecânica ou eletroeletrônica. Mas sempre que tenho folga corro para cá, ensino os meninos.

Tenho certeza de que o retorno de jogar uma ferramenta de qualidade no jovem é bem prazeroso, vale a pena.

Quero que minha família cresça aqui dentro, que meu filho tenha essa oportunidade que eu tive.

Acho que, se o mundo hoje ou cada cidade do interior do Brasil tivesse uma Casa Grande, a mentalidade do jovem melhoraria. Não vemos Nova Olinda pra fora, mas de fora pra dentro.

A Casa Grande não é para os meninos de Nova Olinda. É para o mundo. E mostra na prática.

O guri tem acesso ao que há de melhor. O importante é dar oportunidade para o jovem para mostrar que ele tem capacidade.

Alemberg, no meu ponto de vista, é um pai que tem essa missão na Terra, de ter um bando de meninos como filho. Dar uma infância que ele nunca teve e hoje depois de certa idade tem o prazer de degustar junto com um bando de meninos.

É um cara que tem uma visão espetacular, uma visão de mundo grande, um cara crítico. Para ajudar não mede esforços. Resumindo, é um pai.

Se não tivesse cruzado meu caminho, acho que eu não seria nada não.

É o pai que nunca tive."

CÍCERO FERREIRA ALEXANDRE, 27, um dos primeiros diretores da Fundação Casa Grande

 
Patrocínio: Coca-Cola Brasil e Portal da Indústria; Transportadora Oficial: LATAM; Parceria Estratégica: UOL, ESPM, Insper e Fundação Dom Cabral
 

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