Descrição de chapéu The New York Times Mente

Estimulação do nervo vago pode melhorar depressão e ansiedade

Pessoas com epilepsia, diabetes e transtorno do estresse pós traumático também podem se beneficiar

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Christina Caron
The New York Times

Nos últimos anos, o nervo vago tornou-se objeto de fascínio, principalmente nas redes sociais. As fibras nervosas vagais, que vão do cérebro ao abdômen, foram citadas por alguns influenciadores como a chave para reduzir a ansiedade, regular o sistema nervoso e ajudar o corpo a relaxar.

Vídeos do TikTok com a hashtag "#vagusnerve" [nervo vago, em inglês] foram vistos mais de 64 milhões de vezes, e há quase 70 mil postagens sobre o assunto no Instagram.

Ilustração nervo vago
Estimular o nervo vago pode ajudar na depressão e outras doenças - Chloe Cushman/The New York Times

Algumas das mais populares apresentam truques simples para "tonificar" ou "reformatar" o nervo vago, nos quais as pessoas mergulham o rosto em banhos de água gelada ou deitam de costas com compressas de gelo no peito. Há também massagens no pescoço e nos ouvidos, exercícios para os olhos e técnicas de respiração profunda.

Agora, as empresas de bem-estar capitalizaram a tendência, oferecendo produtos como "óleo de massagem para o vago", pulseiras vibratórias e sprays para travesseiro, que afirmam estimular o nervo, mas que não foram endossados pela comunidade científica.

Pesquisadores que estudam o nervo vago dizem que estimulá-lo com eletrodos pode ajudar a melhorar o humor e aliviar os sintomas em pessoas que sofrem de depressão resistente a tratamento, entre outras doenças.

Mas existem outras maneiras de ativar o nervo vago? Quem se beneficiaria mais disso? E o que exatamente é o nervo vago, afinal? Aqui está uma visão do que sabemos até agora.

O que é o nervo vago?

O termo "nervo vago" é na verdade uma abreviação para milhares de fibras. Elas são organizadas em dois feixes que descem do tronco cerebral pelos dois lados do pescoço e para o tronco, onde se ramificam para tocar nossos órgãos internos, disse o dr. Kevin J. Tracey, neurocirurgião e presidente dos Institutos Feinstein de Pesquisa Médica da Northwell Health em Nova York.

Imagine algo semelhante a uma árvore, cujos galhos interagem com quase todos os sistemas orgânicos do corpo. (A palavra "vagus" significa "errante" em latim.)

O nervo vago capta informações sobre como os órgãos estão funcionando e também envia informações do tronco cerebral de volta ao corpo, ajudando a controlar a digestão, a frequência cardíaca, a voz, o humor e o sistema imunológico.

Por essas razões, o nervo vago –o mais longo dos 12 nervos cranianos– às vezes é chamado de "supervia da informação".

O dr. Tracey o comparou a um cabo transatlântico. "Não é uma mistura de sinais", disse ele. "Cada sinal tem um trabalho específico."

O vago é o principal nervo do sistema nervoso parassimpático. Ao contrário do sistema nervoso simpático, que está associado à resposta de "lutar ou fugir" do corpo, o ramo parassimpático nos ajuda a descansar, digerir e nos acalmar.

Os cientistas começaram a examinar o nervo vago no final dos anos 1800, para investigar se sua estimulação poderia servir de tratamento para a epilepsia. Mais tarde, descobriram que um efeito colateral da ativação do nervo era uma melhora no humor. Hoje, os pesquisadores estão examinando como o nervo pode afetar distúrbios psiquiátricos, entre outras condições.

O que diz a pesquisa?

Evidências indicam que estimular o nervo vago pode ajudar pessoas com epilepsia, diabetes, depressão resistente a tratamento e TEPT (transtorno de estresse pós-traumático), além de condições inflamatórias autoimunes como doença de Crohn ou artrite reumatoide. Algumas pesquisas preliminares sugerem que até os sintomas da Covid longa podem se originar, em parte, da ação do vírus no nervo vago.

"Pode parecer meio mágico, com todas as coisas que ele faz", disse Eric Porges, professor assistente do departamento de psicologia clínica e da saúde na Universidade da Flórida, que estuda o nervo vago.

Nossa compreensão é de que o nervo vago "continua crescendo em riqueza e profundidade", disse ele, mas ainda há muito a aprender sobre seu funcionamento.

No início dos anos 2000, pesquisadores começaram a mostrar que a estimulação do nervo vago poderia ajudar alguns pacientes gravemente deprimidos que não respondiam a outros tratamentos.

Seguiu-se uma onda de estudos. Em 2005, a FDA (agência reguladora de alimentos e medicamentos nos Estados Unidos) aprovou dispositivos geradores de pulso implantáveis, que enviam sinais elétricos ao nervo vago, para uso em pacientes de depressão com resistência a tratamento.

Dispositivos semelhantes também foram aprovados para obesidade –para ajudar a controlar a sensação de fome e saciedade– e para o tratamento de epilepsia. A desvantagem desses dispositivos, entretanto, é que a cirurgia é cara e pode levar meses para surtir efeito –às vezes até um ano.

Pesquisadores estão recrutando pacientes para o maior ensaio clínico já feito, para examinar até que ponto a estimulação do nervo vago pode ajudar pacientes com depressão que não conseguiram encontrar alívio em outros tratamentos.

O dispositivo pode ser especialmente útil para aqueles com depressão bipolar, porque existem poucos tratamentos para eles, disse o dr. Scott Aaronson, um dos psiquiatras que lideraram o ensaio clínico e diretor científico do Instituto de Diagnóstico e Terapêutica Avançados, um centro do hospital psiquiátrico Sheppard Pratt que visa ajudar pessoas que não melhoraram com tratamentos e medicamentos convencionais.

Em geral, um dos problemas com o tratamento da depressão "é que temos muitos medicamentos que praticamente fazem a mesma coisa", disse Aaronson. E quando os pacientes não respondem a esses medicamentos, "não temos muitas novidades".

No entanto, estimulação do nervo vago implantado não é atualmente acessível para a maioria das pessoas, uma vez que as seguradoras se recusaram a pagar pelo procedimento – com exceção dos beneficiários do sistema Medicare dos EUA, que participaram do último ensaio clínico.

A pesquisa de Tracey, que usa estimulação interna do nervo vago para tratar inflamação, também pode ter aplicações em distúrbios psiquiátricos como transtorno do estresse pós-traumático, disse o doutor Andrew H. Miller, diretor do Programa de Imunologia Comportamental da Universidade Emory, que estuda como o cérebro e o sistema imunológico interagem e como essas interações podem contribuir para o estresse e a depressão.

O TEPT é caracterizado por medidas aumentadas de inflamação no sangue, disse ele, que "podem influenciar circuitos no cérebro relacionados à ansiedade".

Em um estudo piloto na Emory, por exemplo, os pesquisadores estimularam eletronicamente a pele do pescoço perto do vago em 16 pessoas, oito das quais receberam tratamento de estimulação do nervo vago e oito receberam um tratamento simulado.

Os pesquisadores descobriram que o tratamento de estimulação reduziu as respostas inflamatórias ao estresse e foi associado a uma diminuição nos sintomas de TEPT, indicando que tal estimulação pode ser útil para alguns pacientes, incluindo aqueles com biomarcadores inflamatórios elevados.

Enquanto isso, o dr. Porges e seus colegas da Universidade da Flórida patentearam um método para ajustar a estimulação elétrica do nervo vago com base na fisiologia do paciente. Ele agora está trabalhando com a empresa Evren Technologies, da qual é acionista, para desenvolver um dispositivo médico externo que use essa abordagem para pacientes com TEPT.

Como medir a atividade do nervo vago?

A atividade do nervo vago é difícil de medir diretamente, devido à sua complexidade. Mas, como algumas fibras do nervo se conectam ao coração, os especialistas podem medir indiretamente o tônus vagal cardíaco –a maneira como o sistema nervoso regula o coração– observando em um eletrocardiograma a variabilidade da frequência cardíaca, que são as flutuações do tempo entre os batimentos cardíacos.

Um tônus vagal anormal –em que há muito pouca variabilidade da frequência cardíaca– foi associado a condições como diabetes, insuficiência cardíaca e hipertensão.

Uma alta variabilidade entre os batimentos cardíacos pode significar um tônus vagal ideal.

Como melhorar o seu tônus vagal em casa?

Prender a respiração e mergulhar o rosto em água fria pode desencadear o "reflexo de mergulho", uma resposta que diminui o batimento cardíaco e contrai os vasos sanguíneos. Algumas pessoas que experimentaram isso disseram que tem um efeito calmante e pode até reduzir a insônia. Outras enrolam uma bolsa de gelo num pano e a colocam no peito para aliviar a ansiedade.

Esses exercícios específicos não foram suficientemente estudados como métodos para controlar a ansiedade ou a depressão, por isso é difícil saber se funcionam. Mesmo assim, alguns especialistas dizem que vale a pena tentar.

"É certamente uma das coisas mais benignas que podemos fazer", disse o dr. Aaronson.

Mas o doutor Tracey pediu cautela, acrescentando que é difícil avaliar adequadamente os riscos e benefícios sem dados clínicos. "Eu não aconselharia ninguém a fazer qualquer intervenção sem consultar seu médico", disse ele.

"Para o bem-estar, tente manter a atividade do nervo vago elevada por meio de atenção plena, exercícios e respiração acelerada", disse Tracey. "Tudo isso é muito bom."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.