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Cansaço excessivo ao praticar exercícios pode ser sintoma de overtraining

Fenômeno indica que a pessoa está exigindo do corpo um esforço maior do que sua capacidade de recuperação

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Christie Aschwanden
The New York Times

Eu caminho 10 kms por dia, passo de cinco a seis horas por semana em exercícios vigorosos de condicionamento físico e cerca de quatro horas por semana realizando treinamento de resistência pesado. É possível se exercitar demais? E quanto é demais?

Você provavelmente já ouviu inúmeras vezes que o exercício é bom para a saúde e o condicionamento físico, e é tentador supor que quanto mais, melhor. Mas, como em tantas outras coisas boas da vida, chega um ponto em que o retorno diminui, e é possível exagerar.

Homem corre na ciclovia da avenida Sumaré, em São Paulo - 19.ago.2015 - Rodrigo Dionisio/Folhapress

Exatamente o que constitui demasiada atividade física, porém, dependerá de cada situação individual.

Se você está achando que se exercitou demais, a primeira coisa a se perguntar é "Por que eu me exercito?", disse Benjamin Levine, professor de medicina interna no Centro Médico Sudoeste da Universidade do Texas e diretor do Instituto de Exercício e Medicina Ambiental do Texas Health Dallas.

Se o seu objetivo é melhorar a saúde e reduzir o risco de uma série de condições, de diabetes a doenças cardíacas e câncer, então de 2,5 a 3 horas por semana de exercícios moderados a vigorosos produzem a maior parte dos benefícios, disse Levine.

"Uma vez que você passa de cinco horas por semana, não está se exercitando para a saúde, está se exercitando para o desempenho."

E quando você se exercita para desempenho –seja para ficar mais forte na academia, correr uma maratona ou melhorar seu jogo de tênis– é possível estressar o corpo além do que ele pode se recuperar, disse Kristen Dieffenbach, cientista do exercício e diretora do Centro de Treinamento Aplicado e Ciências do Esporte na Universidade da Virgínia Ocidental.

Para os atletas, o objetivo do treinamento é induzir a chamada resposta de treinamento, disse ela. Você se exercita e o corpo responde ficando mais em forma, mais forte e mais rápido. Essas melhorias não acontecem durante o treino em si, mas ocorrem no período de recuperação. É quando seu corpo repara os danos causados por exercícios intensos, como microlesões nas fibras musculares, e faz adaptações, como aumentar as mitocôndrias produtoras de energia em suas células.

Enquanto seu corpo for capaz de acompanhar esse trabalho de reparo, os treinos continuarão melhorando seu desempenho, disse Dieffenbach. Mas quando o estresse dos treinos se acumula além da sua capacidade de recuperação você entra na zona de excesso, conhecida na comunidade esportiva como "overtraining".

O que torna as coisas complicadas é que a linha entre treinar duro e overtraining é difusa. Não há fórmula ou número capaz de dizer o que é demais, disse Dieffenbach. Em vez disso, o que importa é como seu corpo responde ao exercício que você faz.

Ela sugeriu pensar no exercício e nos recursos físicos e emocionais que ele exige como se fosse pedir dinheiro a um banco. Você só tem aquela quantia no seu orçamento, e se tentar gastar demais acabará desgastado ou machucado e provavelmente irritado. Com o tempo, seu orçamento de exercícios pode mudar.

À medida que envelhece, seu corpo requer mais tempo para se recuperar, então você pode precisar de mais descanso entre os treinos duros. Também é limitado pelas outras coisas que acontecem em sua vida.

Passar longas horas no trabalho ou viajando, ou lidar com situações estressantes em casa, pode consumir parte do seu orçamento energético e diminuir sua capacidade de se recuperar do exercício, disse Dieffenbach.

Um estudo de 2016 com 101 jogadores de futebol universitário, por exemplo, descobriu que seu risco de lesão quase dobrou durante períodos de estresse acadêmico (como durante os exames intermediários e finais).

Os sinais mais confiáveis de que você está se exercitando demais vêm de seus sentimentos subjetivos de bem-estar, disse a especialista.

Se você de repente fica cansado o tempo todo, ou os treinos que costumavam ser fáceis parecem difíceis, ou seu desempenho cai inesperadamente (seus tempos de corrida ficam mais lentos sem explicação ou sua caminhada diária demora mais que o normal), talvez seja hora de desacelerar e descansar, disse a cientista.

Outros sinais clássicos de overtraining incluem problemas para dormir, sentir-se esgotado e não conseguir se curar de pequenos resfriados e outras infecções respiratórias. "Às vezes você tem que recuar para seguir em frente", disse Dieffenbach.

Se você perceber que está se esforçando para praticar exercícios de que costumava gostar, ou se sente culpado por não se exercitar o suficiente, são outros sinais de que exagerou. Isso é especialmente verdadeiro se os sentimentos durarem mais que alguns dias, disse a especialista. (Claro, esses também podem ser sinais de outros problemas de saúde, como depressão, por isso é importante manter isso em mente.)

Por outro lado, se você está descobrindo que seu amor pelo exercício está se tornando uma obsessão doentia, é algo para prestar atenção também, disse Szabó Attila, psicólogo da saúde que estuda vício em exercícios na Universidade Eotvos Lorand, em Budapeste (Hungria).

O vício em exercícios pode ocorrer quando a pessoa se sente compelida a fazer atividade física, mesmo que esteja com dor ou machucada.

Não há um número específico de horas de exercício por semana que se correlacione ao vício em exercícios, conforme um dos estudos de Attila, de 2019, mas "torna-se problemático quando prejudica outros aspectos da vida", disse ele. Se você coloca o exercício antes de seus relacionamentos, do trabalho e tudo o mais, acrescentou o médico, é sinal de que se tornou excessivo.

Um dos colegas de Attila, Mark Griffiths, psicólogo na Universidade Nottingham Trent, no Reino Unido, desenvolveu seis critérios para os profissionais de saúde usarem na triagem de pacientes para vício em exercícios:

1. O exercício é a coisa mais importante na minha vida.
2. Surgiram conflitos entre mim e minha família e/ou meu parceiro sobre a quantidade de exercício que faço.
3. Eu uso o exercício como uma forma de mudar meu humor (por exemplo, para ficar animado, para escapar, etc.).
4. Com o tempo, aumentei a quantidade de exercício que pratico em um dia.
5. Se eu tiver que perder uma sessão de exercícios, ficarei mal-humorado e irritado.
6. Se eu reduzir a quantidade de exercício que faço e depois começar de novo, sempre acabo me exercitando com a mesma frequência que fazia antes.

Para ser classificado como vício, a pessoa precisaria atender a todos os seis critérios, o que é raro, disse Griffiths. Mas muitas pessoas exibem problemas com exercícios que não atingem o nível de vício, acrescentou. Por exemplo, alguém que vai trabalhar e funciona normalmente, mas depois chega em casa e negligencia a família para ir à academia malhar –isso ainda é um problema.

O que nos leva à resposta definitiva à nossa pergunta: sim, é possível se exercitar demais. E você saberá que está fazendo isso quando sentir seu corpo quebrado, deixando-o doente ou machucado, ou afetando negativamente o resto de sua vida. Quando o exercício parar de fazer você se sentir bem e enriquecer sua vida, é hora de reduzir.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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