Como diminuir os efeitos do espiral de notícias ruins na sua saúde mental

Nomear seus sentimentos e se permitir sentir coisas ruins podem ajudar a lidar com a tristeza e ansiedade

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Jenny Taitz
The New York Times

Seguir o noticiário constante numa era de violência armada, guerra e divisão política pode se tornar esmagador. E em meio aos muitos desafios atuais –a pandemia, as mudanças climáticas, a incerteza econômica– é compreensível nos sentirmos tristes, irritados e ansiosos.

Como psicóloga clínica especializada em dar às pessoas as ferramentas para lidar com emoções intensas, sei que pode ser difícil permanecer positivo ou simplesmente equilibrado, enquanto se preocupa profundamente com o mundo.

Alguns dos meus clientes dizem que não conseguem parar de pensar no fim dos tempos, outros se envolvem em comportamentos não saudáveis para se desligar e muitos saltam entre os dois extremos.

Mas é possível você se ancorar caso pareça que está entrando em desespero com a situação mundial. Eu confio nestas sete estratégias baseadas em mindfulness, ou consciência plena, para mim e meus clientes permanecerem estáveis.

Ilustração de duas pessoas de costas se abraçando e formas que parecem de mãos pretas gigantes tentando pegar elas com fundo preto
Nomear suas emoções pode ajudar a lidar com o espiral de más notícias - Derek Abella/The New York Times

Rotule seus sentimentos

Se você puder rotular exatamente a emoção que está experimentando no momento, poderá reduzir seu poder em seu corpo e cérebro. Dê um nome a qualquer emoção que você esteja sentindo –tristeza, medo, raiva, nojo ou culpa– e com que intensidade você a experimenta.

Diga em voz alta, use um aplicativo de rastreamento de humor ou escreva seus sentimentos num diário.

Tente não esperar até que seus sentimentos atinjam o pico. Crie o hábito de dar nome a suas emoções à medida que elas surgem. Acompanhar sua intensidade lhe oferece a chance de desacelerar antes de atingir um ponto de ebulição e se perder ao se preocupar demais ou ruminando, gritando com alguém ou usando uma droga sem pensar.

Permita-se sentir emoções

Se você tentar evitar seus sentimentos, eles ficarão mais intensos, disse Melanie Harned, psicóloga do VA Puget Sound Health Care System e autora de "Treating Trauma in Dialectical Behavior Therapy" (Tratando o trauma na terapia do comportamento dialético, em português).

Quando você for emocionalmente afetado por uma notícia, pare um momento para perceber o que está pensando, fazendo e sentindo em seu corpo. Escolha o que seria mais útil no momento –criar uma janela para sentir suas emoções por alguns minutos, sem tentar alterá-las, ou, se você estiver no meio de uma tarefa urgente, planejar rever as notícias dolorosas num momento em que você possa sofrer.

Uma maneira de melhorar sua capacidade de lidar com as emoções é lembrar que elas podem flutuar rapidamente. Um exercício que ajuda meus clientes a não terem medo de ficarem presos aos sentimentos é assistir a várias cenas breves e emocionantes em sequência –a cena do leito de morte do filme "O Campeão" seguida de um trecho do clipe "Happy", de Pharrell Williams, por exemplo. Se você tentar isso, pode acabar chorando em um momento e dançando ou sorrindo no próximo.

O objetivo é entender como essa mesma transitoriedade pode se aplicar à variedade de emoções que você experimenta quando permanece presente ao longo do dia.

Compreensivelmente, após uma tragédia, também pode parecer tentador reduzir o alcance de sua vida para evitar emoções dolorosas. Por exemplo, depois de saber da violência em massa num supermercado, como nos horríveis tiroteios em Boulder e Buffalo, é natural sentir-se desconfortável ao ir às compras.

Lembre-se que se permitir experimentar suas emoções, incluindo o medo, ao retornar a uma rotina acabará por melhorar sua ansiedade, disse Harned.

Pratique diferentes tipos de empatia

Você pode se sentir motivado a fazer a diferença e ajudar sem se identificar demais com a dor de outra pessoa.

"Somos ensinados que a maneira de ajudar os outros é através da empatia, mas isso pode ser uma armadilha", disse George Everly Jr., professor da Escola de Saúde Pública Johns Hopkins, especializado em intervenção em crises e resiliência.

Em seu trabalho para reduzir o esgotamento entre os trabalhadores de ajuda humanitária, Everly encoraja a visão em perspectiva, ou tentar entender o mundo do ponto de vista do outro naquele momento, em vez de mergulhar nas emoções alheias, borrando a linha entre o que eles estão experimentando e sua experiência.

"Há uma diferença entre ter consciência e ficar imerso e envolvido", disse Sharon Salzberg, uma das principais professoras de mindfulness e autora de "Real Change: Mindfulness to Heal Ourselves and the World" (Mudança real: consciência plena para curar a nós mesmos e ao mundo, em português).

Um estudo com mais de 7.500 médicos descobriu que compreender e reconhecer as emoções dos pacientes reduz o esgotamento (burnout), enquanto o excesso de identificação com as experiências dos pacientes predizia a exaustão emocional dos médicos.

É preciso prática, mas se você se observar que se sente envolvido, tente respirar algumas vezes e depois mudar para uma forma mais racional de preocupação, em vez de participar totalmente do sofrimento.

Entre em ação

Ao considerar maneiras de ajudar os outros, você recuperará algum controle de um mundo que pode parecer esmagador, enquanto melhora o seu próprio bem-estar. Foi demonstrado que fazer intencional e repetidamente trabalhos como doar, ser voluntário ou se engajar politicamente reduz o risco de cair em depressão e aumenta a felicidade.

"Quando nos mobilizamos e nos levantamos com uma ação positiva e tangível, é quase impossível cair em desespero", disse Shelly Tygielski, ativista e autora de "Sit Down to Rise Up" (Sente-se para se levantar, em português).

Invista algum tempo pensando em maneiras como deseja contribuir para causas que são importantes para você. Enquanto trabalhamos para melhorar as injustiças do mundo, "precisamos equilibrar a compaixão e nosso esforço com a sabedoria de que as coisas podem demorar. Elas podem levar muito tempo, mas às vezes nossos esforços estão plantando uma semente", disse Salzberg.

Repense suas palavras

Pode parecer natural usar declarações dramáticas como "Estou arrasado" quando algo terrível acontece no mundo. Isso é especialmente verdade nas redes sociais, onde a linguagem extrema pode ser validada por "curtidas" ou comentários de outras pessoas. Mas nossas palavras e interpretações têm um impacto poderoso em como nos sentimos e nos comportamos.

Embora seja útil nos permitir respeitar nossos sentimentos, nossas emoções aumentam de intensidade quando exageramos circunstâncias que já são dolorosas.

O pensamento catastrófico pode desencadear ou exacerbar emoções em muitas pessoas. Portanto, considere substituir pensamentos ou frases como "O mundo está desmoronando" por "Preciso fazer algo para melhorar X".

Invista em uma prática alegre

A resiliência, a capacidade de funcionar após um acontecimento estressante, geralmente depende de adicionar emoções e ações positivas ao seu dia para melhorar sua capacidade de lidar com os desafios.

Conecte-se com pessoas que o inspiram e programe hobbies que podem empolgar você. Proteger sua saúde mental não é egoísta. Isso permite que você seja a sua melhor versão, não a versão esgotada, disse Everly, que arranja tempo para se exercitar mesmo quando está em missões de socorro em desastres.

Além de adicionar atividades que promovam a felicidade, pratique prestar atenção nos momentos em que as emoções positivas surgem naturalmente no seu dia, seja o seu café da manhã ou passar um tempo com alguém que você ama.

"Quando o ciclo de notícias é tão dominado por coisas horríveis, podemos perder de vista o que há de bom no mundo e em nossas próprias vidas", disse Harned.

Mas se você luta para encontrar momentos de paz e sente que a tristeza ou ansiedade está afetando sua capacidade de funcionar, procure um terapeuta, que pode lhe oferecer ferramentas baseadas em evidências para melhorar seu bem-estar.

​Respeite seus limites sem perder de vista os problemas e a dor

Pense em horários específicos do dia, digamos de manhã e no meio da tarde, quando você deseja acompanhar as notícias, em vez de rolar infinitamente ou mantê-las em segundo plano. Fazer uma pausa não significa que você não se importa: trata-se de fazer uma pausa para que você possa voltar a enfrentar os desafios do mundo e tentar fazer uma diferença real.

Também é importante ficar atento às causas que achamos importantes nos momentos de relativa calma. "Sentimos uma dor aguda, depois esquecemos", disse Salzberg. Ela sugere encontrar maneiras de cuidar das causas que são importantes para nós, mesmo quando não estão no topo do nosso feed de notícias.

Dê a si mesmo permissão para sentir dor e alegria, sem ficar preso. É assim que suas emoções contribuem para a cura real. Harned me lembrou de uma analogia citada por Marsha Linehan, psicóloga e pioneira em terapia comportamental baseada em mindfulness: você pode visitar um cemitério sem construir uma casa lá.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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