O alagoano Francisco Sebastião de Lima, 47, recebeu um novo coração em março de 1989. A sobrevivência do agricultor marca a história da cardiologia. Francisco é considerado o mais longevo transplantado de coração do país, segundo o IDC (Instituto de Doenças do Coração) de Alagoas.
Antes dele, o advogado paulista Tanabi Waldir de Carvalho, morto em junho aos 82 anos, viveu 32 anos com o coração doado. O Incor, instituto paulista referência em cardiologia, aponta que o paciente transplantado cardíaco mais longevo da entidade passou por cirurgia em 1991, portanto, há 28 anos.
Francisco foi o principal homenageado no Simpósio de Cirurgia Cardiovascular na sexta-feira (9), em Maceió, que celebrou as três décadas do primeiro transplante no Nordeste —feito em Francisco—, e os 41 anos de cirurgia vascular no estado.
A família do alagoano ainda se emociona ao contar a história de Francisco, que contraiu a doença de Chagas na zona rural de Santana do Mundaú, ainda adolescente.
Após se mudar para a área urbana, os sintomas de cansaço se agravaram e, aos 17 anos, ele passou a ter insuficiência cardíaca crônica. Após idas e vindas a hospitais públicos de Maceió e um prognóstico de no máximo seis meses de vida, Francisco foi submetido ao transplante.
A cirurgia ocorreu em Aracaju, capital do Sergipe, tão logo surgiu um doador. Os cirurgiões optaram por levar o paciente até o estado vizinho, evitando o translado do órgão, tarefa complicada na época.
O agricultor franzino é um sobrevivente. Sofreu dois AVCs (Acidente Vascular Cerebral), um antes da cirurgia e outro depois, o que comprometeu sua fala. Devido a limitação, ele vive com os pais, Maria Quitéria de Lima, 77, e Sebastião Francisco de Lima, 79, que tem alzheimer.
Francisco ajuda a mãe nos cuidados com o pai e vive do dinheiro da aposentadoria. “Foi um milagre de Deus. Rezo todos os dias para que ele viva muito, mais de 50 anos”, afirma a mãe.
O agricultor compareceu ao simpósio acompanhado do irmão. O pai estava doente e a mãe não quis sair de perto do marido. Maria Quitéria conta que Francisco chegou de Maceió animado e chorou ao mostrar o certificado que recebeu.
O cirurgião José Wanderley Neto, do IDC de Alagoas, também foi homenageado no simpósio. Neto foi quem liderou o transplante de Francisco. Ele não esconde o otimismo quanto ao seu paciente e aposta em um novo marco. Para ele, Francisco tem, ainda, mais de duas décadas de vida pela frente, podendo superar o transplantado mais longevo do mundo. “Ele reagiu muito bem e continua reagindo. Superou dois AVCs. É um super-homem”, diz.
Neto diz que o maior desejo de Francisco, na época da cirurgia, era voltar a andar a cavalo. "Nós arranjamos uma foto. Quando ele voltou para casa, com todo o cuidado, o colocamos em cima de um cavalo e ele ficou muito feliz”.
Ao longo de três décadas, Neto e sua equipe fizeram mais de 50 transplantes cardíacos em Alagoas.
Nos anos 1980, transplantes de coração só haviam sido realizados em São Paulo, no Paraná e no Rio Grande do Sul.
O cirurgião agora sonha com a construção do Hospital Professor Zerbini, entidade filantrópica com mais de cem leitos voltada para atendimentos do SUS e idealizada para ser referência em transplantes no Nordeste.
A primeira pessoa a receber um coração transplantado no Brasil foi João Boiadeiro. A cirurgia foi realizada no Hospital das Clínicas da USP. João, entretanto, não resistiu e morreu 28 dias após o transplante. Ele sofria de insuficiência cardíaca.
O primeiro transplante do mundo ocorreu em 3 de dezembro de 1967, pelas mãos do sul-africano Christian Barnard.
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