China isola área com 40 milhões para conter coronavírus; 41 já morreram

País fecha o cerco contra epicentro da epidemia às véspera das festividades de Ano-Novo

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Pequim, São Paulo e Paris | AFP

Às vésperas do Ano-Novo Lunar, a China impôs restrições de transporte sobre mais de 40 milhões de habitantes para tentar conter a disseminação do coronavírus que já matou 41 pessoas e contaminou mais de mil pessoas até esta sexta (24). Há o temor de que o vírus se espalhe rapidamente para outros países da Ásia.

As festividades costumam movimentar centenas de milhões de pessoas em cerca de 3 bilhões de viagens.

As medidas de emergência afetam os moradores de 13 cidades da província de Hubei, incluindo sua capital, Wuhan, uma metrópole com mais de 11 milhões de habitantes que é considerada o epicentro da epidemia.

 

O país também anunciou a construção às pressas de um hospital em Wuhan com mil leitos destinado unicamente ao tratamento de pessoas infectadas pelo coronavírus. O estabelecimento deverá abrir suas portas em 3 de fevereiro. 

Em 2003, durante a epidemia do Sars (síndrome respiratória aguda grave) que deixou cerca de 650 mortos, a China construiu um hospital em uma semana.

Nesta quinta (23), pelo menos dez tratores e 35 escavadeiras chegaram ao local para preparar o terreno para construção, segundo o jornal local Changjiang Daily. 

 

Várias atrações turísticas no país foram fechadas para reduzir o risco de contaminação pelo vírus. A Cidade Proibida de Pequim, o antigo palácio dos imperadores, anunciou seu fechamento até nova ordem.

Trechos da Grande Muralha, os túmulos da dinastia Ming e a floresta Yinshan Pagoda também serão fechados a partir de sábado. O Estádio Nacional de Pequim, conhecido como Ninho de Pássaro, construído para os Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, teve suas portas fechadas hoje.

Em Xangai, a maior cidade do país, com 24 milhões de habitantes, o parque da Disney ficará fechado por tempo indeterminado para diminuir o risco de contágio. A cidade está fora da província de Hubei.  

Além da China, nove países já registraram casos do vírus:Taiwan, Tailândia, Japão, Coreia do Sul, Vietnã, Singapura, Nepal, França e EUA.

 

Na quinta, a OMS (Organização Mundial da Saúde) anunciou que, por enquanto, não declarará emergência internacional de saúde pública. Especialistas da OMS disseram que não está claro qual a dimensão do perigo de transmissão do vírus entre pessoas.

O termo "emergência internacional" foi usado apenas para casos raros de epidemias que exigem uma resposta global vigorosa, incluindo a gripe suína H1N1, em 2009, o vírus zika, em 2016, e a febre ebola, que devastou parte da África Ocidental de 2014 a 2016.

O vírus pertence a uma cepa desconhecida até agora de coronavírus, uma família de patógenos que abrange de resfriados comuns até a Sars (síndrome respiratória aguda grave), que matou 349 pessoas na China continental e 299 em Hong Kong em 2002 e 2003.

A doença possui sintomas como coriza, febre e dificuldade para respirar. Radiografias do peito de pacientes infectados apontaram infiltrações nos pulmões.

Não há casos no Brasil. O Ministério da Saúde diz que está em estado de alerta inicial e divulgou recomendação na quinta-feira (23) para que equipes de saúde fiquem alertas a casos de pessoas com sintomas respiratórios e que apresentam histórico de viagens a áreas de transmissão ativa do novo coronavírus registrado na China

 
Um dia antes, a pasta ativou um centro de operações de emergência para monitorar possíveis casos suspeitos. 
 
Até o momento, ao menos cinco casos chegaram a ser informados como suspeitos por secretarias estaduais de saúde, mas foram descartados por não se enquadrarem nos critérios definidos pela Organização Mundial de Saúde para definição de suspeita da doença.  

Quarentenas e cordões sanitários são receitas antigas para grandes epidemias

Foi em resposta a grandes epidemias como peste, cólera e febre amarela que as quarentenas foram inventadas na Idade Média. Agora, a China aplica a medida diante do avanço do novo coronavírus.

As restrições de movimento na região de Wuhan, metrópole de 11 milhões de habitantes do centro da China, afetam o cotidiano de mais de 40 milhões de chineses.

“Fora a época da Sars (síndrome respiratória aguda grave), em 2003, não há nada que possa se aproximar do tamanho dessa operação, com exceção talvez da quarentena de Bombaim, atingida pela peste em 1898”, explica Patrick Zylberman, especialista em história da saúde na Escola de Estudos Avançados em Saúde Pública (EHESP).

Mais recentemente, durante a epidemia de ebola na África Ocidental (2013-2016), medidas de fechamento de fronteiras, contenção e quarentena foram impostas em várias ocasiões.

Assim, os seis milhões de serra-leoneses foram forçados a ficar em casa por três dias em setembro de 2014 e novamente em março de 2015. Esse “confinamento geral” teve como objetivo deter a epidemia.

A quarentena é um isolamento temporário imposto a pessoas, navios ou animais provenientes de um país infectado por uma doença contagiosa, de acordo com a definição do dicionário Larousse. 

Já o cordão sanitário corresponde a postos de vigilância para controlar e bloquear a entrada ou saída de uma área afetada por uma epidemia. 

No caso da epidemia chinesa, um enorme cordão sanitário foi instalado na região de Wuhan.

Foi para se proteger contra a peste bubônica nos séculos 14 e 15 que surgiram as primeiras medidas documentadas de isolamento de navios provenientes de áreas infestadas, em Dubrovnik (Croácia) em 1377 e depois em Veneza (Itália) a partir de 1423. 

A duração imposta do isolamento, 40 dias, determina a palavra quarentena. Os estabelecimentos que acomodam as tripulações confinadas levam o nome de lazareto, uma deformação do nome da ilhota na lagoa veneziana onde os navios atracavam, Santa Maria di Nazaret, ou outra referência ao leproso da Bíblia, Lázaro. 

As quarentenas foram então adotadas regularmente na Europa durante epidemias até a grande pandemia de cólera que atingiu o continente na década de 1830.

O termo cordão sanitário nasceu na França no século 19, quando em 1821 Paris enviou 30 mil soldados para bloquear a fronteira com a Espanha a fim de impedir a propagação de uma epidemia de febre amarela.

Bem antes dessa data, porém, barreiras sanitárias foram estabelecidas durante grandes epidemias de peste, como lembra Tom Solomon, especialista britânico em doenças emergentes da Universidade de Liverpool.

Ele cita o famoso exemplo do isolamento voluntário em 1665 do vilarejo de Eyam (Inglaterra) após um caso de peste para evitar contaminar o resto da região.

No sudeste da França, um “muro da peste” foi erguido em Vaucluse em 1721 por mais de 27 quilômetros para proteger a região do Comtat Venaissin da peste que então se alastrava por Marselha e Provença.

Segundo Solomon, as medidas de restrições ao movimento podem ser contraproducentes, causando pânico e levando as pessoas a fugir a todo custo.

Também podem levar a sérios distúrbios sociais, como ocorreu em Bombaim durante a epidemia de peste no final do século 19, devido às hospitalizações forçadas de homens e mulheres sem distinção de casta, explica Patrick Zylberman.

Mais próximo do nosso tempo, o surto de Sars na China em 2003 levou a distúrbios e manifestações violentas nas regiões de Nanquim e Xangai (leste) após quarentenas brutais, disse Zylberman em seu ensaio “Tempestades microbianas”.

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