Hospitais de SP ainda se preparam para possível surto de coronavírus

Aeroportos não implementam triagem, que pode ter falhas e alto custo, segundo OMS

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O Ministério da Saúde já investiga três casos de suspeita de coronavírus em Belo Horizonte, Curitiba e São Leopoldo (RS) e elevou o risco da chegada do vírus para iminente,  mas grandes hospitais de São Paulo ainda se preparam para receber possíveis casos da epidemia que se espalha pelo mundo. 

A pasta também ativou um centro de operações de emergência para monitorar o registro de possíveis casos. O centro, formado por especialistas em emergência em saúde pública, foi ativado em nível 1 de 3, o que indica um alerta inicial, visando a preparação da rede de saúde. Com o registro do primeiro caso de suspeita em investigação, o nível de alerta passa agora a nível 2 nesta terça (28), de risco iminente.

Nos aeroportos, avisos sonoros sobre os sintomas informam os passageiros sobre os sintomas, e funcionários e tripulantes foram instruídos a reportar casos suspeitos. Também houve pedido para reforçar a limpeza. Segundo a Anvisa, não há necessidade de fazer triagens dos passageiros que chegam ao país.

Folha consultou os principais serviços de saúde do estado de São Paulo, o mais populoso do país, para saber os procedimentos adotados em casos de suspeita de infecção.

Um plano de contingência deve ficar pronto até o fim desta semana no Instituto de Infectologia Emilio Ribas, referência na área. Desde o início do surto, neste mês, duas pessoas chegaram a acessar o centro de saúde por suspeita de infecção, mas eram apenas casos de gripe comum. 

O Hospital Alemão Oswaldo Cruz diz que está em processo de elaboração um fluxo interno de atendimentos médicos e assistenciais para caso o coronavírus chinês se torne uma epidemia no Brasil. 

O Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP afirmou, em nota, que trabalha junto à “Secretaria de Estado da Saúde no estabelecimento de um protocolo de atendimento a casos suspeitos”. O HC diz, porém, que as pessoas não devem procurar diretamente a sua emergência. O encaminhamento para o hospital é feito através de Secretaria da Saúde. 

Maria Luiza Moretti, infectologista do Hospital das Clínicas da Unicamp, disse, em coletiva de imprensa na segunda (27), que o centro de saúde está pronto para lidar com casos de suspeita graças a experiências passadas com a gripe suína H1N1, a Sars (síndrome respiratória aguda grave) e, mais recentemente, com a reemergência do sarampo.

Segundo os especialistas, as pessoas devem ficar atentas às informações sobre sintomas —tosse, febre, dificuldade para respirar— e sobre quem faz parte do grupo de risco —a maior parte dos infectados tem mais de 60 anos e doenças associadas, como diabetes e problemas cardiovasculares— para evitar visitas desnecessárias ao centros de atendimento. 

“Já houve pessoas preocupadas falando que estavam com tosse e que tinham ido passear no bairro da Liberdade [área de São Paulo conhecida pela presença oriental]. Aí não é nem caso suspeito e explicamos para os pacientes que não há casos e transmissão no Brasil”, diz Mirian Dal Ben, infectologista do Hospital Sírio-Libanês. 

A especialista do Sírio-Libanês afirma que caso o paciente se enquadre nos casos de suspeita, o fluxo de atendimento tem início com isolamento, seguido por realização de exames rápidos para descartar outros vírus respiratórios e teste específico para o coronavírus.

Se o caso de coronavírus for confirmado, o hospital manterá o paciente internado em isolamento e os sintomas serão tratados, como com auxílio de suporte ventilatório para ajudar na respiração, em casos em que houver necessidade, atendendo as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde). O hospital Oswaldo Cruz diz ter linha de ação semelhante.

A OMS também indica, já na triagem, a distribuição de máscaras para pacientes com casos de suspeita de coronavírus, o que ajudaria um maior controle sobre a disseminação da doença —tanto Sírio-Libanês como Oswaldo Cruz afirmam seguir o protocolo. 

No Hospital Israelita Albert Einstein, na triagem há um totem no qual o paciente seleciona sintomas. Caso se enquadrem no visto no coronavírus e em outros doenças infectocontagiosas, a pessoa recebe uma senha especial e é recomendada a usar máscara e higienizar as mãos com álcool gel, ambos disponíveis na sala de espera. 

Segundo Mirian Dal Ben, até o momento um único paciente chegou a iniciar o processo de protocolo de atendimento para casos de suspeita de coronavírus no Sírio-Libanês. A pessoa, porém, só estava com o nariz escorrendo, sem febre e não tinha estado nas áreas da China indicadas como de potencial contágio pela OMS.

Recentemente, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo anunciou a criação de um plano de risco e resposta rápida para coronavírus. Anvisa, Instituto Butantan, Instituto Adolfo Lutz, Instituto de Infectologia Emílio Ribas e HC-USP fazem parte do plano. A ideia é observar o cenário internacional e orientar profissionais para garantia de uma resposta rápida, caso seja necessária.

Nesta semana, a OMS passou a considerar que os casos suspeitos podem ocorrer com pessoas que estiveram em qualquer parte do território chinês 14 dias antes do início dos sintomas.

Aeroportos e portos

Na segunda (27), o diretor-presidente substituto da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antônio Barra Torres, disse que não há necessidade de inspeção ou triagem prévia em aeronaves e navios que chegam da China.

Em casos de passageiros com sintomas e histórico de viagem para região afetada, as tripulações devem notificar a suspeita de coronavírus. A seguir, é seguido um plano de contingência que poderá contar com visita de equipe médica, vigilância antes do desembarque, triagem e cadastro de passageiro para monitoramento.

Avisos sonoros sobre sintomas estão sendo emitidos nos aeroportos e, segundo Torres, as equipes nesses locais receberam informações para notificação de casos suspeitos. 

A consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Nancy Bellei, afirma que medidas tomadas em situações de possíveis epidemias precisam ser efetivas, aplicáveis e controladas para serem colocadas em prática. Também é preciso levar em conta se não há desperdício de recursos. Triagens, por exemplo, requerem gastos adicionais.

Segundo a especialista, sem a verificação da execução e efetividade das ações que são implementadas pelos países, as autoridades podem perder a credibilidade. “Em uma epidemia, para você ter parceria com a população, para ter comportamentos nos quais você mitigue a epidemia, é necessário transparência e credibilidade.”

Bellei afirma que o fato de ser verão no Brasil não impedirá o vírus de espalhar, caso chegue aqui. Ainda faltam informações mais robustas sobre o coronavírus para conhecer seu potencial de contágio. “Entre os vírus respiratórios, temos os que circulam o ano inteiro e outros que são mais do outono e inverno”, diz.

Uma das preocupações quanto ao Brasil, afirma Bellei, é a chegada do Carnaval. “O efeito turismo, viagem, multidão e estresse aumenta o diagnóstico de vírus respiratórios.”

Em outros países, o controle é mais rígido. Os Estados Unidos, que já tem cinco casos de infecção confirmados até a terça (28), anunciaram expansão de triagens para voos vindos de Wuhan, que agora serão feitas em 20 aeroportos e fronteiras terrestres. Também há estações de quarentena nesses locais, segundo o jornal americano The New York Times. 

Os países da Ásia, por onde o vírus tem se espalhado com mais força e rapidez, a situação é de maior gravidade. 

Na Tailândia, as autoridades decretaram controles de temperatura corporal obrigatórios para os passageiros procedentes de zonas de alto risco da China. Medidas similares foram tomadas pelo governo de Hong Kong. 

Taiwan emitiu um alerta para os passageiros que viajarem com origem ou destino da província chinesa onde se encontra o foco do problema. O Vietnã reforçou os controles terrestres com seu vizinho chinês.

Grã-Bretanha e Itália disseram que introduzirão um monitoramento aprimorado dos voos a partir de Wuhan, enquanto a Romênia e a Rússia também estão reforçando os controles.

O que a OMS recomenda

Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), um número de casos exportados de coronavírus foi detectado em triagens implementadas por alguns países. Os casos sintomáticos podem ser detectados em screenings de temperatura corporal —exames de laboratório depois confirmam ou não as suspeitas.

O problema é que essas triagens de temperatura podem deixar passar os casos sem sintomas ou que estão "escondendo" a febre durante a viagem, com medicamentos, e podem ter um custo alto. 

A OMS afirma que uma abordagem mais específica, voltada aos voos diretos das áreas afetadas, pode ser mais eficaz e demandar menos recursos. 

Também é preciso levar em conta que o hemisfério Norte e a China estão na temporada de inverno, quando a gripe e outras infecções respiratórias são comuns. Ao decidir implementar a triagem na entrada do país, os países devem levar em consideração que os sintomas sugestivos podem não ser do novo coronavírus e acabar gerando um impacto adicional no sistema de saúde. Políticas nacionais e as capacidades locais devem ser levadas em conta nesse processo de decisão.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.