Falta de ar progressiva é sinal de infecção grave pelo novo coronavírus

Diabetes e hipertensão são as principais doenças associadas à evolução severa da covid-19

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Licio A. Velloso Ronaldo Aloise Pilli Everardo M. Carneiro
Campinas

A rápida disseminação da infecção pelo novo coronavírus levanta questões a respeito da potencial existência de fatores de risco que possam estar associados à evolução desfavorável da doença. A identificação de eventuais fatores de risco pode contribuir para ações preventivas, incluindo a definição das prioridades quando uma vacina estiver disponível.

Para outras doenças infectocontagiosas para as quais há vacina, agências de saúde adotam critérios seletivos para definir prioridades como, por exemplo, profissionais da área de saúde no caso da vacina contra hepatite-B, ou idosos e pacientes com doenças respiratórias crônicas para a vacina contra gripe.

Em artigo publicado em 28 de fevereiro na revista médica The New England Journal of Medicine, a caracterização de 1.099 pacientes com covid-19 fornece as primeiras evidências a respeito dos fatores de risco que podem predispor a uma evolução mais grave da doença.

Os autores pertencentes ao Grupo Chinês de Especialistas Médicos para o Tratamento da covid-19, obtiveram dados de pacientes atendidos ou internados em 522 hospitais distribuídos por 30 províncias chinesas, durante o mês de janeiro de 2020.

A idade média dos pacientes foi 47 anos, sendo 41,9% do sexo feminino. Os sintomas mais comuns foram febre (44% na admissão e 89% durante a hospitalização) e tosse (68%). Diarreia foi uma manifestação incomum, ocorrendo em apenas 3,8% dos pacientes. A manifestação laboratorial mais comum foi a redução do número de linfócitos (um dos tipos de glóbulos brancos) no sangue.

A necessidade de internação em unidade de tratamento intensivo (5% dos casos), a necessidade de respiração assistida (por instalação de tubo traqueal e ventilação mecânica, em 2,3% dos casos) e a evolução para morte (1,4% dos casos) foram os critérios adotados para definir pacientes com evolução muito grave da doença.

Com base nestes critérios, os autores investigaram quais foram as características clínicas ou doenças pregressas que tiveram maior associação com a evolução grave da doença. A idade superior a 65 anos foi um importante fator de risco, pois metade dos pacientes que evoluíram de forma grave estavam nesta faixa etária.

A dispneia progressiva (sensação de falta de ar com aceleração da frequência respiratória) foi a principal manifestação desenvolvida durante a evolução da doença que teve relação com um prognóstico desfavorável, ocorrendo em 54% dos pacientes que evoluíram de forma grave.

Um dos principais resultados apontados pelo estudo diz respeito aos tipos de doenças pregressas que podem ter relação com a evolução grave de covid-19. Dentre os 1.099 pacientes avaliados, 261 (24%) tinham alguma doença prévia, sendo as mais comuns hipertensão arterial (15%), diabetes (7%) e doença coronariana (2,5%). Apenas 1,1% dos pacientes tinha doença pulmonar obstrutiva crônica. Entre os pacientes que não tinham qualquer doença prévia, só 3% evoluíram de forma grave. Entretanto, dentre os pacientes com qualquer doença prévia, 58% apresentaram evolução grave.

Hipertensão arterial foi a doença prévia mais associada à evolução grave de covid-19, estando presente em 36% dos pacientes deste grupo, enquanto diabetes estava presente em 27% destes pacientes. Doença pulmonar obstrutiva crônica estava presente em 10% dos pacientes que evoluíram de forma grave.

Os resultados do estudo lançam um importante alerta quanto a um mau prognóstico de covid-19 quando os pacientes já têm alguma doença pregressa.

Surpreendentemente, hipertensão arterial e diabetes, duas das doenças mais comuns no planeta, muito associadas ao sedentarismo e alimentação inadequada, surgiram como as mais associadas à evolução grave de covid-19. Mais estudos devem definir se tal padrão é comum a pacientes de diferentes etnias e também identificar possíveis mecanismos que expliquem tais associações.

Licio A. Velloso

Professor titular de medicina da Unicamp e coordenador do Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades

Ronaldo Aloise Pilli

Professor titular de química da Unicamp e vice-presidente da Fapesp

Everardo M. Carneiro

Professor titular de biologia e diretor associado do Instituto de Biologia da Unicamp

O Centro de Pesquisa em Obesidade e Comorbidades é um dos Centros de Pesquisa, Educação e Difusão, sendo financiado de forma majoritária pela Fapesp

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.