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Diretor do Einstein nega que hospital dê cloroquina no início da Covid-19 e diz que medicina virou BBB

Luiz Rizzo diz que há pressão para oferecer a droga e que não vai fazer pesquisa a toque de caixa com resultados dúbios

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São Paulo

"Estamos na época da medicina BBB, feita por votação. Medicina e pesquisa de rede social. Você não consegue mais não dar cloroquina para um paciente meio grave. A família pressiona e, se você não der, no dia seguinte você não é mais o médico.”

O desabafo do médico Luiz Vicente Rizzo, diretor superintendente de pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein, reflete a pressão que as instituições têm sofrido para ampliar o uso da hidroxocloroquina em pacientes com Covid-19.

Ele diz que o Einstein só indica a substância para pacientes graves, internados na UTI. Nega que exista protocolo no hospital para a utilização no início da doença, como afirmaram a médica Nise Yamaguchi, que atende no hospital, e o virologista Paolo Zanotto, da USP. Ambos defendem o uso precoce.

Profissional da saúde segura cloroquina em hospital francês
Profissional da saúde segura cloroquina em hospital francês - AFP

“Nenhuma dessas pessoas [Yamaguchi e Zanotto] que está falando de protocolo do Einstein participa de protocolo nosso. Nem de Covid nem de nenhum dos 711 projetos de pesquisa no hospital. Uma coisa é ser médico no Einstein; outra coisa é ser médico do Einstein”, afirma Rizzo.

Segundo Miguel Cendoroglo Neto, diretor médico e superintendente do Einstein, logo com os primeiros casos atendidos um consenso de especialistas do hospital aprovou o uso da cloroquina e de outras substâncias no manejo do paciente grave.

“Mas entendendo que essa proposta terapêutica é dentro do que a gente chama de off label, não está na bula desses medicamentos, não está nos 'guidelines' das sociedades médicas. A família precisa ser informada sobre o risco de complicação, de efeitos adversos.”

De acordo com ele, 70% dos 30 pacientes internados na UTI estão fazendo uso da cloroquina isolada ou associada ao antibiótico azitromicina.

Os 30% restantes têm alguma contraindicação (problemas cardíacos, por exemplo), mas utilizam outros antivirais. “Dependendo do caso e do perfil do paciente, os médicos lançam mão da terapia mais adequada, como é o tratamento de qualquer paciente grave.”

Ele cita, por exemplo, anticoagulantes, anticorpos monoclonais e o uso de plasma como opções do arsenal de terapias usadas nos casos graves de Covid-19. “Tudo isso a gente está estudando ainda.”

Segundo Cendoroglo Neto, usando todo o conjunto de protocolos, o Einstein tem tido uma resposta muito boa com pacientes graves de Covid-19.

“A gente tem mais de 20 pacientes que foram extubados, que já tiveram alta. Não sei é a cloroquina, o protocolo da ventilação mecânica, nosso corpo médico excelente ou o próprio perfil da população atendida, que tem acesso a recursos, é bem cuidada. Por isso, são necessários estudos controlados e multicêntricos.”

O Einstein coordena o braço de pesquisa com pacientes graves do projeto CoalizãoCovid Brasil, que reúne outros oito hospitais no país.

Um total de 43 pacientes já estão incluídos e outros 70 foram selecionados. A proposta é avaliar a eficácia e a segurança da hidroxocloroquina e a azitromicina.

Além das substâncias, o trabalho deve avaliar desfechos de acordo com diferentes UTIs. A taxa de mortalidade do Einstein, por exemplo, está abaixo de 1%, enquanto a média mundial é acima de 3%.

Segundo Rizzo, embora haja diferenças entre os hospitais (por exemplo, em relação a equipamentos e qualificação de pessoal), é possível fazer os ajustes.

“Em um hospital onde se morre muita gente, o melhor medidor será se ele está vivo ou morto. Num hospital com poucas mortes, será o quão mais rápido ele teve alta.”

Os resultados devem sair em até dois meses —podem ser divulgados antes se os dados se mostrarem muito promissores ou se surgirem efeitos colaterais graves no decorrer da pesquisa.

“Vamos divulgar assim que os dados estiverem validados, e isso será feito fora do Brasil. É uma pesquisa científica mas não com fins acadêmicos. Pelo menos nesse primeiro momento, é para resolver problema.”

Rizzo diz que, como médico, não prescreve e não prescreveria a cloroquina para casos leves. “Não existem dados na literatura para casos leves, nenhum dado confiável. O que tem é um pessoal daqui e de outros lugares dizendo que fez e que deu certo.”

Segundo ele, para os pacientes graves, bem ou mal, há relatos um pouco mais embasados, mas ainda sem evidências sólidas.

“Vamos dar as nossas respostas cedo ou tarde. Não vamos fazer uma pesquisa a toque de caixa, com resultados dúbios para depois sermos cobrados de maneira que não condiz com a reputação do Einstein."

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