Apesar da falta de evidências científicas em relação ao tratamento e à prevenção da Covid-19, o Ministério da Saúde vai ampliar a oferta de cloroquina e hidroxicloroquina para gestantes e crianças com suspeita da doença no país, informou a pasta nesta segunda-feira (15).
A decisão ocorre no mesmo dia em que a FDA (agência que regula medicamentos nos Estados Unidos) revogou a autorização de uso emergencial do medicamento para tratar Covid-19 naquele país.
Ao comunicar a decisão, a agência dos EUA alegou que, com base em novos dados, não é mais razoável acreditar que a cloroquina e a hidroxicloroquina poderiam ser eficazes no tratamento da doença.
A medida, porém, não muda as orientações para uso do medicamento já aplicadas no Brasil, as quais devem ser agora ampliadas, afirmou a secretária de gestão em trabalho em saúde, Mayra Pinheiro.
Segundo ela, a pasta vai divulgar novas orientações para uso do medicamento como forma de tratamento precoce também em crianças e gestantes.
"Estamos reeditando a primeira nota informativa acrescentando agora o tratamento precoce para dois grupos considerados de risco: gestantes e crianças", afirmou.
De acordo com Pinheiro, a medida ocorre por causa de dados que apontam as gestantes entre o grupo com maior risco de desenvolver doenças graves."Da mesma forma as crianças, que no início julgávamos que seriam menos afetadas", completou ela, citando a possibilidade de ocorrência de síndrome grave entre esse grupo. Ainda há poucos dados, contudo, sobre a frequência desses quadros.
A nova medida também contraria parecer divulgado em maio pela Sociedade Brasileira de Pediatria, que recomendou a médicos que o uso da cloroquina e hidroxicloroquina em crianças ficasse restrito apenas a estudos clínicos controlados, e não como rotina de tratamento precoce, como prevê o Ministério da Saúde.
Questionada, Pinheiro disse que segue as orientações da entidade, mas não respondeu sobre a divergência de diretrizes.
Segundo ela, o documento ainda deixará a decisão sobre a oferta a critério dos médicos. A medida, porém, pode aumentar mais uma vez a pressão para uso desses medicamentos na rede de saúde.
A previsão é que o documento com as novas orientações seja divulgado ainda nesta segunda (15).
O último ajuste nas orientações sobre o uso da cloroquina havia ocorrido em 20 de maio, quando o governo estendeu o uso também para pacientes com sintomas leves de Covid-19. Até então, a recomendação era de uso apenas por pessoas com sintomas graves e críticos e com monitoramento em hospitais, devido ao risco de arritmia e outros efeitos colaterais.
A diretriz anterior da pasta, que estendia a possibilidade de uso da cloroquina para casos leves, já abria espaço para o uso em crianças, mas não havia orientações específicas para esse grupo, o que ocorre agora.
O modelo recomendado pelo ministério prevê indicação conjunta com o antibiótico azitromicina e doses que variam por fase de tratamento e sintomas leves, moderados ou graves.
No caso das crianças com sintomas leves, o uso deve ser recomendado em caso de presença de fatores de risco, como diabetes, hipertensão, obesidade, asma e cardiopatias, entre outros.
A mesma ressalva não consta para casos moderados ou graves, de acordo com apresentação prévia da pasta.
Questionada sobre a nova posição adotada pela FDA, cujas decisões têm sido referência nos últimos anos para outras agências reguladoras no mundo, Pinheiro disse que a pasta não deve mudar suas recomendações.
"Seguimos tranquilos, serenos e seguros sobre nossa orientação", disse ela, para quem os dados e estudos citados pela agência não podem ser usados como referência para análise por terem "péssima qualidade metodológica" ou serem restritos a casos graves.
Ela admite, contudo, que não há dados consolidados que apontem eficácia. "Vamos continuar aguardando que o mundo produza evidências A, o que deve levar algum tempo."
Sem apresentar dados, Pinheiro disse que há uma "constatação" da pasta de que a curva de casos da Covid-19 começou a diminuir desde que houve ampliação do uso da cloroquina, mas que não era possível afirmar com segurança os motivos dessa queda.
Números divulgados pela própria pasta e pelo consórcio de veículos de imprensa têm apontado aumento na curva de casos e mortes em boa parte do país.
Ainda de acordo com a secretária, o ministério também deve utilizar as cerca de 2 milhões de doses de hidroxicloroquina enviados pelos EUA ao Brasil.
O fornecimento do medicamento foi anunciado pelos dois governos no fim do mês passado.
Segundo a Casa Branca, a hidroxicloroquina enviada ao Brasil será usada por enfermeiros, médicos e profissionais de saúde, além de pacientes infectados.
O ministério também anunciou que irá custear leitos "intermediários" para tratamento da Covid, os quais podem ser instalados em UPAs (unidades de pronto-atendimento) e hospitais de campanha.
Os leitos serão voltados a pacientes que não evoluíram para pacientes em estado grave, mas precisam de suporte de oxigênio, informou.
O valor de cada diária deve ser de R$ 467. A pasta não divulgou o total de leitos previstos para serem custeados.
De acordo com o secretário-executivo do ministério, Antônio Élcio, a ideia com a ampliação da oferta é deixar leitos de UTI restritos a casos mais graves.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.