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Testes de coronavírus alcançam menos da metade dos profissionais da saúde, indica estudo da FGV

Levantamento online com mais de 2.000 trabalhadores da área aponta falta de equipamentos e de treinamento para enfrentar pandemia

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São Paulo

Mais da metade dos profissionais da saúde do Brasil pode ter ficado sem testes para detecção do novo coronavírus e sem treinamento para trabalhar no combate à Covid-19, indica um estudo divulgado pela FGV nesta quinta-feira (30).

Cerca de 65% dos mais de 2.000 profissionais da saúde de todo o país que responderam a um questionário virtual entre os dias 15 de junho e 1º de julho afirmaram ainda não terem sido submetidos ao teste. Treinamentos específicos para atuação durante a pandemia alcançaram aproximadamente 31% desses trabalhadores.

A testagem em larga escala é apontada por especialistas como uma das principais estratégias para o combate à Covid-19. Somente com a realização do exame é possível saber quem está contaminado pelo novo coronavírus e deve ser isolado para não transmitir a doença.

No caso de médicos e enfermeiros, por exemplo, o teste e o isolamento do infectado ajudam a proteger o sistema de saúde e os pacientes de outras doenças.

Os resultados do levantamento da FGV mostram ainda que a distribuição dos equipamentos de proteção individual (EPIs), necessários para proteger quem trabalha com os infectados, está abaixo do desejado. Em média, metade dos profissionais disseram ter recebido os materiais.

Segundo o Ministério da Saúde, há registro de 216.376 profissionais de saúde infectados por Covid-19 e 189 óbitos causados pela doença até a quinta-feira (29).

A falta de estrutura para quem está na chamada linha de frente do combate à pandemia, como médicos, profissionais de enfermagem e agentes de saúde, faz com que esses trabalhadores se sintam despreparados e desamparados enquanto cuidam da saúde dos brasileiros durante uma das maiores crises sanitárias da história do país.

De acordo com o levantamento, quase 70% dos participantes afirmaram não se sentir preparados para enfrentar a crise, e cerca de 80% dos respondentes disseram que houve piora em sua saúde mental.

A atuação do governo federal na pandemia, que tem uma equipe interina há mais de dois meses no comando do Ministério da Saúde, é mal avaliada pela maior parte dos profissionais. Apenas cerca de 20% dos participantes afirmaram ter uma percepção positiva sobre a ação do governo federal durante a crise.

A construção do questionário e a análise das respostas são de pesquisadores de diversas instituições que atuam no Núcleo de Estudos da Burocracia (NEB), da FGV. O estudo é baseado em uma amostra por conveniência —ou seja, os participantes da pesquisa não foram escolhidos aleatoriamente.

Participaram do levantamento médicos, profissionais de enfermagem, agentes comunitários de saúde e outros trabalhadores da área que tiveram acesso às questões e quiseram respondê-las. Os participantes são de todos os estados do país e do Distrito Federal.

Segundo Gabriela Lotta, professora da FGV especialista em administração pública e uma das responsáveis pela pesquisa, os dados não têm representatividade estatística e não devem ser generalizados para o universo dos profissionais de saúde, mas podem ajudar a estabelecer prioridades de políticas públicas para o combate à pandemia.

“Fizemos a pesquisa rapidamente para influenciar o debate público enquanto ainda temos tempo”, diz Lotta.

“Um questionário online é a única ferramenta viável nesse momento, e ainda assim é um desafio, pois esses profissionais estão exaustos e sem tempo”, diz Michelle Fernandez, professora no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) e uma das autoras do estudo.

Para as pesquisadoras, as respostas apontam caminhos para melhorar a atuação dos governos no combate à Covid-19. Segundo elas, o resultado do levantamento deixa claro que a prioridade é a distribuição mais eficiente de testes e equipamentos para esses trabalhadores.

A disponibilização de treinamentos específicos para o contexto da pandemia e a divulgação clara de informações oficiais da parte do governo também dariam mais segurança aos profissionais, que enfrentam uma crise de legitimidade diante da disseminação difusa de notícias enganosas sobre o novo coronavírus.

As cientistas acrescentam ainda que o suporte à saúde mental dos trabalhadores, com atendimentos online e disponibilização de psicólogos para quem trabalha com a Covid-19, podem ajudar a atravessar esse momento.

A atenção básica à saúde, rede que conta com médicos de família e agentes de saúde e privilegia a prevenção das doenças, tem um potencial ainda não explorado pelo governo federal no enfrentamento da pandemia, na avaliação das pesquisadoras.

“A atenção básica, estrutura capilarizada e que já está pronta, não é considerada um ator estratégico pelo governo. Essas equipes poderiam estar em campo fazendo o rastreamento de casos e o isolamento dos contatos do infectado, por exemplo. Isso daria mais tranquilidade para os outros profissionais, que estão nos hospitais”, diz Fernandez. “Ainda é possível fazer isso, a pandemia não acabou”, conclui.

Em nota enviada à Folha, o Ministério da Saúde disse que enviou aos estados 8 milhões de testes rápidos específicos para profissionais de saúde e segurança e distribuiu cerca de 245 milhões de equipamentos de proteção individual (EPIs). Segundo a pasta, 335 mil trabalhadores da saúde passaram por treinamento para atendimento à população durante a pandemia.

O ministério também informou que criou, em parceria com o Hospital de Clínicas de Porto Alegre, o programa TelePsi, que oferece suporte psicológico e psiquiátrico para os profissionais de saúde do SUS. Aproximadamente 500 antedimentos já foram realizados pela iniciativa.

Erramos: o texto foi alterado

Uma versão anterior do texto dizia que cerca de 35% dos profissionais de saúde que participaram da pesquisa ainda não tinham feito teste do novo coronavírus. O número correto é 65%. 

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