Relação entre vibração alta e Covid-19 não tem comprovação científica

Não há pesquisa que prove que frequência, ânimo ou sentimentos sejam capazes de evitar a contaminação pelo novo coronavírus

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Texto que circula em sites relacionados a autoajuda ou tratamentos alternativos, redes sociais e plataformas de troca de mensagens como WhatsApp usa informações sem comprovação científica para alegar que a “Covid tem uma vibração de 5,5 Hz e morre acima de 25,5 Hz”. O material também sugere que ânimo e sentimentos são capazes de enfraquecer o Sars-Cov-2: “Para os seres humanos com vibração mais alta, o vírus é uma gripe simples”.

A equipe do Comprova entrou em contato com a psicóloga Eluise Dorileo, autora de um texto publicado em 29 de junho que parece ser uma das fontes do conteúdo que circula atualmente por WhatsApp. Ela admitiu que “não há comprovação, (…) apenas estudos baseados em frequência energética base”. Quando enviamos questionamentos sobre o que é frequência energética base e quem são alguns autores mencionados por ela, escreveu: “Por gentileza, vá pesquisar”.

A pesquisa sobre a frequência de sentimentos e emoções nos levou até o trabalho do autor de autoajuda norte-americano David R. Hawkins. Ele é o criador da escala Hawkins, que classifica sensações como raiva, amor, ódio, paz, orgulho e vergonha em hertz –unidade de medida de frequência na Física. A tabela está no livro Poder vs Força. O trabalho de Hawkins não é reconhecido pela comunidade acadêmica.

Pessoa ensaboa as mãos em pia; lavar as mãos com sabonete continua sendo uma das poucas práticas conhecidas no combate à Covid-19
Lavar as mãos com sabonete continua sendo uma das poucas práticas conhecidas no combate à Covid-19 - Robin Utrecht/ANP/AFP

O texto sobre a relação entre o novo coronavírus e a frequência dos sentimentos não é recente. Em maio, a Abrath (Associação Brasileira dos Terapeutas Holísticos) já havia publicado um alerta nas redes sociais sobre o material.

Na frequência

O texto verificado afirma que é possível evitar o novo coronavírus com emoções positivas. O material sugere ainda que ânimo e sentimentos de “alta frequência” são capazes de enfraquecer o vírus.

Na Física, a frequência representa o número de repetições de um evento (um ciclo, uma volta ou uma oscilação) em determinado intervalo de tempo. A medição é feita em Hz (hertz), que equivale à quantidade de ciclos em um segundo. Ou seja, se uma onda sonora vibra 60 vezes em um segundo é possível dizer que ela vibra 60 Hz.

“Na Engenharia medem-se frequências relacionadas a componentes ou estruturas: máquinas, estruturas civis (edifícios, viadutos, etc.) e até do corpo humano”, explica o engenheiro mecânico Juan Pablo Raggio Quintas, da UFRGS (Universidade Federal Rio Grande do Sul). “Por exemplo, pode-se medir, num estádio de futebol, a frequência natural de um trecho da arquibancada, no corpo humano as frequências do punho de um motorista com o veículo em movimento. Na Engenharia trabalha-se com fatos concretos, que podem ser medidos. Números que representam grandezas físicas: velocidade, aceleração, força, deformações, etc. As emoções não são grandezas físicas”, pontuou.

Para Glaucius Oliva, professor do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo, o texto verificado não tem qualquer base científica. “Usa termos da física para parecer verdadeiro, mas não tem nenhuma evidência experimental. Este assunto vem sendo, inclusive, utilizado por espertalhões inescrupulosos que vendem seus ‘serviços’ de terapia ‘energética’”, alerta.

Em maio, um terapeuta foi acusado de cobrar R$ 2,4 mil por um acompanhamento para evitar a infecção pelo novo coronavírus –foi quando a Abrath alertou: “Estão compartilhando milhares de mensagens falando que padrões vibratórios altos imunizam todos os tipos de doença e a Covid-19, isso é uma informação incorreta”.

O Comprova perguntou para a psicóloga Eluise como a mensuração de sentimento pode ser feita e quais ferramentas são usadas, mas ela não retornou.

Verificação

Em sua terceira fase, o Projeto Comprova verifica conteúdos sobre as políticas públicas do governo federal e a pandemia do novo coronavírus. Nesse contexto, a desinformação sobre o Sars-Cov-2 é perigosa porque pode prejudicar a saúde da população. É o caso do texto que afirma ser possível combater o vírus “vibrando” em altas frequências. Por mais que traga conselhos positivos –como comer bem e fazer exercícios–, o material pode levar uma pessoa desinformada a descuidar de outras medidas que, de fato, são eficientes contra o vírus, como o distanciamento social, o uso de máscaras e a higienização das mãos. A Opas (Organização Pan-Americana da Saúde) , braço da Organização Mundial da Saúde para as Américas, também recomenda cuidados com a saúde mental.

Falso, para o Comprova, é todo o conteúdoinventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.

A investigação desse conteúdo foi feita por SBT e GaúchaAZ e publicada na sexta-feira (21) pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 28 veículos na checagem de conteúdos sobre coronavírus e políticas públicas. Foi verificada por Folha, UOL, Jornal do Commercio e Estadão.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.