É errado comparar letalidade da Covid com reação à vacina

Tuítes que viralizaram enganam ao insinuar que a Coronavac, se aprovada, seria mais perigosa do que a doença

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São Paulo

São enganosos os tuítes que comparam a taxa de letalidade da Covid-19 com a taxa de reações adversas leves registradas nos testes da CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan. As postagens, verificadas pelo Comprova, comparam coisas diferentes.

A letalidade é o número de pessoas que morreram após contrair o novo coronavírus, que, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), é abaixo de 1%. As reações adversas da vacina, que foram registradas em 5% dos chineses que participaram dos testes, tratam da quantidade de pessoas que apresentaram sintomas como dor muscular no local da aplicação ou perda de apetite após receberem o imunizante.

Coveiro usando máscara abre cova na terra, cercado por duas longas fileiras de covas já abertas
Coveiro no cemitério da Vila Formosa, em São Paulo; mais de 159 mil brasileiros morreram pela Covid-19 - Amanda Perobelli - 6.ago.2020/Reuters

Não há registro de morte de nenhum paciente que participou dos testes da CoronaVac, no Brasil ou na China. Entre os 9 mil brasileiros testados, os principais sintomas foram dor no local da aplicação, dor de cabeça e fadiga. Menos de 0,1% teve febre baixa. O imunizante segue na fase três de testes para comprovar sua eficácia em combater a infecção.

Em entrevista, o médico Alexandre Naime Barbosa, professor de Infectologia da Unesp (Universidade Estadual Paulista), e o pesquisador Jones Albuquerque, professor de Estatística da UFRPE (Universidade Federal Rural de Pernambuco), disseram que não faz sentido comparar a letalidade de uma doença com a reação à vacina.

Enquanto qualquer vacina só poderá ser aplicada após a autorização de órgãos sanitários, a Covid-19 pode deixar sequelas persistentes nos pacientes mesmo após a recuperação, como fibrose pulmonar, doenças cardiovasculares, disfunção renal ou hepática, síndrome inflamatória sistêmica, síndrome de Guillain-Barré e trombose.

Comparação

O o infectologista Alexandre Naime Barbosa explicou que não se pode comparar a letalidade do vírus com os efeitos da vacina, já que eles são todos leves. “A letalidade da Covid-19 é de 2 a 3% (no Brasil). Isso significa que duas a três pessoas morrem em cada cem. Já a vacina tem 5% de efeitos colaterais, todos eles leves: dor no local, vermelhidão, febre leve passageira. Comparar mortes com eventos adversos leves é no mínimo ingênuo, pra ser educado”, argumenta.

Segundo Barbosa, também é impossível que a vacina apresente os mesmos sintomas da doença em si. “A vacina não usa o vírus vivo atenuado, e sim pedaços estruturais do patógeno, que vão ensinar o sistema imunológico a reagir”, explica.

Para o pesquisador Jones Albuquerque, a letalidade de uma doença e as reações a uma vacina são fenômenos completamente diferentes. “É como tentar comparar morte por afogamento na praia com a chance de abrir uma Coca-cola e ter uma barata dentro”, avalia. Ele também argumenta que o tipo de reação adversa causada pela vacinação é completamente diferente dos sintomas provocados pela doença.

Verificação

Em sua terceira fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre a pandemia ou sobre políticas públicas do governo federal que tenham viralizado nas redes sociais. Quando a publicação fala sobre tratamentos e de imunização contra o novo coronavírus, a checagem se torna ainda mais necessária porque a desinformação sobre medidas de prevenção e tratamento pode colocar a saúde das pessoas em risco, diante de uma doença que já infectou 5,4 milhões de pessoas no Brasil e já causou a morte de mais de 159 mil brasileiros.

É o caso dos conteúdos verificados aqui, que levantam dúvidas sobre a segurança das vacinas em teste contra a Covid-19. Atualmente, a vacinação em massa é a principal aposta dos cientistas para imunizar a população e encerrar a pandemia. Juntas, as publicações tiveram 3,1 mil interações no Twitter.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que usa dados imprecisos, que foi retirado do seu contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações, ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

O Comprova fez esta verificação baseado em dados oficiais sobre o novo coronavírus disponíveis no dia 30 de outubro de 2020.

A investigação desse conteúdo foi feita por Niara, Bereia, Estadão e Jornal do Commercio e publicada na sexta-feira (30) pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 28 veículos na checagem de conteúdos sobre coronavírus e políticas públicas. Foi verificada por Folha, UOL, NSC, GZH e Correio.

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