Presidente da Anvisa diz que 'tudo tem limite' e vai pedir a Bolsonaro veto a prazo de 5 dias para liberar vacina

Mudança foi acrescentada em medida provisória durante durante tramitação na Câmara dos Deputados e aprovada pelo Senado

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Brasília

O diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, afirmou nesta sexta-feira (5) que vai pedir ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que vete o prazo de cinco dias para liberar vacinas aprovado pelo Congresso.

Nesta quinta-feira (4), o Senado finalizou a votação da MP (medida provisória) que autoriza a entrada do Brasil no consórcio Covax Facility, ligado à OMS e prevê regras mais flexíveis para a concessão de autorização de uso emergencial de vacinas contra a Covid-19.

A agência terá um prazo de cinco dias para conceder a autorização a vacinas já aprovadas em outros países. Esse ponto foi acrescentado no texto durante tramitação na Câmara dos Deputados.

Como a matéria sofreu alteração, se tornou um projeto de lei de conversão e, assim, vai à sanção do presidente da República.

Diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres durante reunião extraordinária que liberou o uso emergencial das vacinas do Butantan e Fiocruz
Diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres durante reunião extraordinária que liberou o uso emergencial das vacinas do Butantan e Fiocruz - Divulgação - 17.jan.21/Anvisa

Hoje, o prazo previsto pela agência reguladora é de 30 dias para liberar o uso emergencial de vacina sem a realização de estudos de fase 3 (com humanos) no Brasil. A regra entrou em vigor na quarta-feira (3). Antes, eram 10 dias, mas apenas para vacinas testadas no país.

Com isso, empresas podem, a partir de agora, solicitar o uso emergencial de vacinas com base em dados de segurança e eficácia obtidos em testes em outros países. Neste caso, porém, o prazo de análise passa a ser de 30 dias —e não mais de 10 dias, como era até então.

O presidente da Anvisa disse que enviará um ofício à Casa Civil mostrando ponto a ponto das implicações para que possa subsidiar o presidente para um eventual veto.

Barra Torres afirmou também que o STF (Supremo Tribunal Federal) poderá ser acionado, mas que ainda não é o momento.

À Folha o presidente da agência disse que existe uma participação grande da classe política nas discussões, mas que ultrapassou "todos os limites". Segundo Barra Torres, as decisões precisam ser técnicas.

"Esse é um tempo irreal, nós não sabemos qual é a fundamentação científica desse prazo, de onde saiu e de qual fórum regulatório pertence. Até agora eu não sei, dessa forma acredito que é achismo", disse.

“Tudo tem limite, queremos decisões técnicas para que as pessoas tenham segurança para se vacinar, não decisões políticas. Ontem foi um dia muito impactante”, acrescentou.

A autorização do prazo de cinco dias demanda que a vacina tenha sido aprovada por agências regulatórias de vigilância sanitária de outros países. A proposta lista as agências de países, como Estados Unidos, União Europeia, Japão, China, Rússia e Argentina.

Será possível, dessa forma, agilizar a concessão de autorização para a vacina Sputnik V, do instituto Gamaleya. A vacina do instituto russo se tornou uma nova aposta do governo federal.

​Como a Folha mostrou, os fabricantes da vacina Sputnik V fazem intenso lobby político para pressionar a Anvisa a liberar o uso emergencial do imunizante. A pressão vem incomodando os diretores da agência, diante das ofensivas múltiplas.

A Anvisa já havia manifestado contrariedade em agilizar ainda mais o procedimento.

Uma legislação aprovada em fevereiro do ano passado previa um prazo de 72 horas para que a Anvisa concedesse autorização para uso emergencial para vacinas que já tivessem sido registradas em alguns países - como Estados Unidos, Japão, China, além da União Europeia.

A legislação tecnicamente perderia sua validade em 31 de dezembro, pois estava condicionada ao estado de calamidade pública, que também expirou no fim de 2020.

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski determinou, no entanto, que algumas medidas ligadas à pandemia do novo coronavírus continuassem válidas, o que se aplica a essa legislação

No entanto, a lei em questão citava que seria necessário "registro" - o que significa a autorização definitiva para vacinas. Nenhuma vacina contra a Covid-19 tem essa autorização no mundo. Todas contam com autorização para uso emergencial.

A legislação, na prática, nunca chegou a ser aplicada. Isso porque nenhum laboratório fez uso dela para requerer a autorização para uso emergencial junto à Anvisa.

O texto da medida provisória, por outro lado, vai além da legislação na flexibilização. Isso porque cita que as vacinas necessitam apenas tenham sido autorizadas ou aprovadas no exterior - sem mencionar a palavra registro.

O Congresso propõe também mudanças em uma outra MP para reduzir regras, facilitar a compra e dar celeridade a aprovação do imunizante contra a Covid-19 no Brasil.

Deputados e senadores enviaram 147 emendas com a intenção de que sejam incorporadas ao texto.​ A MP 1.026 foi publicada no Diário Oficial da União no dia 6 de janeiro.

Uma delas seria autorizar a União de assumir riscos sobre eventuais efeitos adversos que a vacina possa apresentar referentes à responsabilidade civil, desde que a Anvisa tenha concedido o registro ou autorizado o uso emergencial.

Além disso, a União poderia constituir garantias ou contratar seguro privado, ainda que internacional, para a cobertura dos riscos que o governo iria assumir.

Essas duas propostas facilitariam a compra de imunizantes da Pfizer, uma vez que o contrato previa que o Brasil fizesse um fundo garantidor em conta no exterior e que fosse assinado um termo que isentasse a empresa de responsabilidades.

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