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Especialistas defendem restrições de viagens na Páscoa e questionam megaferiado

Feriado prolongado se aproxima e acende alerta para possível novo aumento de casos de Covid

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São Paulo

A Páscoa se aproxima e, mais uma vez, cresce o alerta quanto ao possível impacto do feriado nos casos e mortes por causa da Covid. Enquanto em São Paulo o prefeito Bruno Covas (PSDB) decidiu “aglomerar” feriados, especialistas defendem restrições de viagens, campanhas de conscientização e até o cancelamento da data para evitar novas explosões de registros e o agravamento ainda maior da situação.

Nos últimos dois meses de 2020, com o aumento de casos de mortes pelo coronavírus, médicos e especialistas acenderam o alerta vermelho e continuamente avisaram sobre os riscos das festas de fim de ano. Mesmo com medidas pontuais do poder público, como fechamento de praias e vigência de fase vermelha no período, viu-se um acentuado crescimento da pandemia em janeiro e fevereiro.

O mesmo ocorreu no Carnaval, quando, apesar do seu cancelamento, houve empresas que mantiveram o feriado e aglomerações de turistas pelo país.

Na quinta-feira (18), o país completou 20 dias seguidos de recordes na média móvel de mortes por Covid —que chegou a 2.096— e a 57 dias com média acima de 1.000. O Brasil, no momento, responde por 1 a cada 4 mortes por Covid no mundo.

Para tentar diminuir o contágio e aumentar o isolamento social, a aposta da Prefeitura de São Paulo é um feriadão de 10 dias, do dia 26 março a 4 de abril, considerando o final de semana. A cidade, que já registrou a sua primeira morte na fila por UTI, um homem de 22 anos, vê a aproximação do colapso do sistema de saúde.

A ideia do megaferiado é diminuir a circulação de pessoas na cidade. Mas, no pior momento da pandemia no Brasil e sem uma clara política federal de enfrentamento à Covid, especialistas questionam a efetividade da medida.

“Me preocupa”, afirma Raquel Stucchi, pesquisadora da Unicamp e membro da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia). Os dias extras de folga podem servir como um estímulo para festas e deslocamentos para outras cidades, diz a infectologista.

Ethel Maciel, epidemiologista e professora da Ufes (Universidade Federal do Espírito Santo), também se diz preocupada. “Provavelmente vamos deixar de ter alguns locais cheios, como o transporte coletivo, para ter outros locais cheios, o que é igualmente ruim”, afirma.

Segundo Maciel, a medida poderia ser efetiva se a população estivesse mais consciente do quão crítica é a situação. “Não acredito que essa medida seja efetiva com o nível de informação ou desinformação no Brasil”, diz ela.

Pesquisa Datafolha realizada no início da semana e publicada nesta sexta-feira (19) mostrou que cerca de 30% da população defende que é preciso acabar com medidas de isolamento para estimular a economia.

Outro temor de Maciel reside no fato de a a Páscoa ser um feriado religioso e as igrejas constarem no rol de atividades essenciais, o que permite seu funcionamento em fases mais severas de restrições, como as em vigor em grande parte do país.

Os especialistas afirmam que medidas de restrição de viagens entre localidades seriam uma opção para evitar novos surtos. O grande problema é a logística para colocar isso em prática.

Para Julio Croda, infectologista e pesquisador da Fiocruz, apesar de ideal, a proibição das viagens dificilmente ocorrerá porque a medida dependeria de uma ação coordenada do governo federal.

O pesquisador lembra que alguns países, nas festas de fim de ano, chegaram a limitar encontros familiares para evitar uma explosão de casos. Croda afirma que o governo federal deveria estar agindo e passando orientações técnicas para a população, como não se reunir com quem não mora com você. “Somos muito mais permissíveis, o que favorece o que está acontecendo no Brasil”, diz Croda.

O infectologista e membro do Centro de Contingência do Coronavírus do Estado de São Paulo Marcos Boulos afirma que as restrições mais amplas devem atravessar a Páscoa, o que, em teoria, pode ajudar a diminuir os deslocamentos. Mesmo assim, além da restrição a viagens, ele defende um possível cancelamento do feriado.

“Se não teve Carnaval, não pode ter Páscoa”, afirma Boulos.

Já Luis Fernando Aranha Camargo, infectologista do Hospital Israelita Albert Einstein, não vê o cancelamento como uma opção. Segundo ele, as aglomerações desse feriado devem ser mais “caseiras”, diferentemente das festas de Carnaval. Ainda assim, ele diz, há um risco importante nas reuniões familiares.

Além da necessidade de análise técnica para implementar medidas mais rígidas, o infectologista diz que é necessário saber se os governantes estão dispostos a pagar o preço político que acompanha tais ações.

“Esses discursos e essas medidas são muito antipáticos, mas não tem outro jeito”, afirma Rosana Richtmann, médica infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas. “Quando falamos em aglomeração, não estamos falando em multidões.”

Com ou sem restrição de viagens, os especialistas falam em conscientização massiva da população. “Vamos comer chocolate, mas não vamos encontrar as pessoas”, diz Richtmann.

Enquanto isso, ações de comunicação são improváveis de partir do governo federal. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou, na quinta, que entrou com ação direta de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) contra decretos de governadores de restrição de atividades.

Ao mesmo tempo em que o poder central faz pouco quanto a situação que se aproxima, municípios tentar implementar medidas para que a situação já caótica não se aprofunde ainda mais.

Em Campinas, em São Paulo, festas familiares com mais de dez pessoas poderão ser multadas. Socorro proibiu a locação de chácaras para lazer, festas ou eventos que causem aglomeração. Rifaina, na divisa com Minas Gerais, proibiu o uso da marina e até delivery para tentar impedir o aluguel de casas por turistas.

Já os prefeitos do ABC pedem ao governador João Doria (PSDB) por um lockdown na Grande São Paulo. Ao mesmo tempo, o prefeito Bruno Covas afirma que a cidade de São Paulo não tem capacidade de fazer um lockdown devido ao pequeno número de agentes disponíveis para fiscalização.

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