Mesmo diante do pior momento da pandemia, com registro da primeira morte de um paciente com Covid-19 na fila de espera por um leito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), a cidade de São Paulo não deve decretar lockdown.
Segundo o prefeito Bruno Covas (PSDB), a medida, que foi implantada nas maiores capitais europeias na primeira onda da pandemia e se alastra agora pelas cidades do interior paulista, é inviável na metrópole paulistana.
O motivo: falta de estrutura de fiscalização. “A gente tem mil GCMs [guardas-civis metropolitanos] por dia na cidade. Com esse efetivo é inviável fiscalizar se as pessoas estão saindo ou não de suas casas”, disse o prefeito.
A afirmação de Covas dada em entrevista à GloboNews, na manhã desta quinta-feira (18), contraria o que especialistas da saúde disseram à Folha sobre o tema.
Os profissionais da área da saúde afirmaram que o lockdown, mesmo considerado extremo, é a única saída para São Paulo frear a transmissibilidade do vírus, que ganhou força e tem impactado a saúde dos mais jovens.
“Diante da emergência sanitária em que estamos, só nos resta fechar tudo. Isso já deveria ter sido feito, pois o resultado só poderá ser sentido em duas a três semanas”, afirmou o infectologista Renato Grinbaum.
Por causa do ciclo de contaminação do coronavírus, que leva de 10 a 14 dias, o resultado de quaisquer medidas restritivas só começa a aparecer em cerca de duas semanas.
Para Grinbaum, um lockdown cumprido à risca pode ajudar a retomar algumas atividades econômicas em um tempo menor, evitando o “abre e fecha” que tem desgastado, na opinião do infectologista, a sociedade e a economia.
Além da falta de estrutura de fiscalização, Covas culpa as grandes dimensões da cidade e as regiões de divisa com outros municípios que dificultam o cumprimento do lockdown.
“São 1.700 ruas que começam na cidade de São Paulo e terminam em outra cidade. Ou que o lado esquerdo da via é da cidade de São Paulo e o direito de uma cidade da região metropolitana”.
Por isso, avalia o virologista Maurício Lacerda Nogueira, professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, o lockdown precisa ser, no mínimo, executado em âmbito estadual para ter boa eficácia.
“Temos medidas municipais e até regionais no interior do estado de São Paulo, mas quando uma cidade próxima não adere à restrição, põe a perder o esforço das demais”.
Para Covas, a medida mais viável no momento é antecipar os feriados, a exemplo do que foi feito em 2020, para manter a população dentro de casa.
“Se a gente conseguir nos próximos 15 dias que as pessoas voltem a cumprir os índices de isolamento que tivemos no início da pandemia, a gente já vai sentir uma melhora no número de casos e internações”, afirmou Covas.
Índices do estado
A ocupação dos leitos de UTI (unidades de terapia intensiva) no estado chegou nesta quinta (18) a 90,6%, e dos leitos de enfermaria, 79,3%. Já na região metropolitana da capital esses índices são ainda piores. Ocupação de UTIs em 91%, e de enfermarias, 85,2%.
O índice de isolamento médio no estado foi de 43% na quarta-feira (17) —mesmo índice da capital—, mesmo em meio à fase emergencial, que restringe serviços essenciais e impõem toque de recolher, pouco acima dos 42% registrados na quarta-feira anterior, com medidas menos restritivas.
O isolamento é calculado pelo governo paulista com dados de telefones celulares das operadoras de telefonia Vivo, Claro, Oi e Tim. O governo calcula quanto o telefone se deslocou durante o dia em relação ao período onde ele esteve durante a madrugada. Se esse deslocamento é maior a 200 metros, isso indica que o usuário pode ter saído de casa.
Segundo dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), a média de lentidão no trânsito da capital paulista na quarta-feira foi de 15 quilômetros, e o volume de veículos circulando na cidade foi de 4 milhões. Segundo a SPTrans, 1,51 milhão de pessoas foram transportadas nos ônibus da cidade.
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