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Fabricantes de vacina contra Covid dizem que quebra de patente não resolveria o problema do Brasil

Butantan e Fiocruz disseram que o importante é investir na produção local para acelerar a aplicação

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Brasília

Fabricantes de vacina no país dizem que a quebra de patentes não seria a solução para aumentar a produção de vacinas contra a Covid-19 no Brasil. Para eles, o que falta é capacidade produtiva, e o mais importante seria investir na produção local.

As declarações foram dadas durante comissão da Covid-19 no Senado nesta quinta-feira (8). O projeto que tramita na Casa estabelece a quebra temporária de patente de vacinas de eficácia comprovada contra a Covid-19 enquanto vigorar o estado de emergência de saúde.

Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, disse que a quebra de patentes não ajudaria o país a ter acesso mais rápido às vacinas porque o problema está relacionado com a falta de capacidade produtiva do país. Outra preocupação é que a ação também daria o direito a quebrar a patente de possíveis imunizantes brasileiros.

“O Brasil não tem uma indústria de biotecnologia desenvolvida, tem algumas iniciativas no setor público e privado. Mesmo se ocorresse a quebra de patentes, não teria como incorporar a produção de muitas dessas vacinas, principalmente as que são mais complexas", disse.

A presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, disse que apoia a quebra de patente, mas que há uma série de complexidades para conseguir produzir as vacinas. Para ela, o importante também é o reforço da produção local através da transferência de tecnologia.

“Com relação às patentes, eu acredito que há de ter uma revisão da lei de propriedade intelectual, mas que nesse momento o importante é fundamental é investir na produção local e com os acordos de transferência de tecnologia. É possível usar mecanismos de licença compulsória em áreas que sejam monopólicas e que prejudicam o acesso."

João Lucas Quental de Almeida, diretor do Departamento de Direitos Humanos do Ministério das Relações Exteriores, disse que a quebra de patente geraria uma desorganização do mercado. Ele afirmou que o ministério está trabalhando junto à OMC (Organização Mundial do Comércio) numa terceira via para procurar laboratórios com produções ociosas que possam produzir vacinas contra a Covid-19.

“A produção seria feita com transferência de tecnologia. Seria uma solução mais rápida e mais efetiva que a quebra de patentes.”

O projeto de lei de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS) prevê que o Brasil deixe de seguir temporariamente algumas obrigações de acordo firmado no âmbito da OMC. Caso aprovado, o país deixaria de seguir cláusulas relativas a patentes, proteção de informações sensíveis, design industrial e propriedade intelectual do acordo conhecido pela sigla em inglês Trips (sigla em inglês para Acordo sobre Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio).

A proposta é muito semelhante à defendida pela Índia e pela África do Sul no âmbito da OMC para que o órgão autorize a quebra de patentes de vacinas contra a Covid-19. O objetivo é tornar a produção de imunizantes mais barata e acessível para nações mais pobres.

Durante a reunião, foi discutida a possibilidade de produzir vacina em laboratórios que fabricam o imunizante em animal.

Representantes do Sindan (Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal) disseram que há quatro fábricas no país com nível de biossegurança próximo ao de laboratórios que fazem vacinas para humanos.

O vice-presidente executivo do Sindan, Emílio Salani, disse que o entendimento de especialistas consultados pelo sindicato é de que não seria muito complexa a adaptação nessas fábricas.

“Na última reunião que fizemos [Anvisa] foi dito que qualquer projeto que chegue na agência será tratado como prioritário. O que precisa realmente é que os detentores da licença, do acesso da tecnologia que interessa possa sentar com o responsável pela área veterinária e tratar do assunto.”

A diretora da Anvisa Meiruze Freitas disse que já notificou as quatro empresas para informar a capacidade e estrutura para uma avaliação prévia, ela está aguardando os documentos.

“A partir desse primeiro mapeamento teremos a ideia da necessidade de adequação.”

Na comissão geral convocada para debater o assunto na Câmara, presidida pelo deputado Aécio Neves (PSDB-MG), especialistas também avaliaram que a quebra de patentes não resolveria a questão, embora a medida tenha sido apoiada pela maioria dos deputados que participaram do evento.

O farmacêutico Tiago Vidal Sá de Moraes, da Bahiafarma, afirmou que a OMC e a OMS (Organização Mundial da Saúde) deveriam criar um comitê para identificar a capacidade produtiva mundial, entender cada tecnologia e saber as necessidades de investimento e quais vacinas precisam ser desenvolvidas.

Sem isso, sem essa coordenação, nós vamos continuar naufragando e vai continuar a lógica do mercado, que é tornar sempre necessária a revacinação pelo surgimento de variantes nos lugares onde não há cobertura de vacinação”, disse.

Na avaliação dele, a licença compulsória não encerra o problema. “Ela não acaba com o problema exatamente por essa necessidade de haver a transferência do conhecimento. É preciso que esse conhecimento chegue até quem hoje tem a capacidade de produzir, a capacidade ociosa de produzir e que possa, de fato, receber essa tecnologia.”

O deputado Aécio Neves defendeu que, em vez de quebrar patentes, elas fossem flexibilizadas temporariamente, “com transferência de tecnologia, mediante, inclusive, pagamento de royalties por doses aplicadas.”

“A nossa tese é intermediária e implicaria em posicionamento menos radical – no lugar da quebra de patentes, a sua flexibilização temporária”, disse.

Já o deputado Alexandre Padilha (PT-SP) defendeu a quebra da patente. “Nós não podemos deixar que quem tenha patente tenha o monopólio da produção, da comercialização, da distribuição seja de medicamentos, seja de tecnologias, de exames diagnósticos e, principalmente, de vacinas.”

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