Brasil tem menos isolamento social que campeões de vacinação como Reino Unido e Israel

Com imunização ainda lenta, brasileiros vão mais às ruas que britânicos, americanos e israelenses, mostram dados do Google

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São Paulo

Com cerca de 20% da população vacinada contra a Covid e quase 2.000 mortos pela doença todos os dias, o Brasil tem níveis de isolamento social tão baixos quanto países que largaram muito à frente na corrida pela vacinação.

Segundo dados do Google, o Brasil tem hoje cerca de 14% menos movimento no transporte público que no período anterior à pandemia. É a maior movimentação entre 16 países analisados pela reportagem —os 12 com as maiores taxas de vacinação, mais Colômbia, México (por terem perfil semelhante ao do Brasil) e Índia (que vive um surto atualmente).

É uma movimentação maior, por exemplo, que a registrada no Reino Unido (37% menos movimento que antes da pandemia) e nos Estados Unidos (-20%), países onde cerca da metade da população recebeu ao menos a primeira dose.

Também é maior o número de mortes registradas a cada dia. Na semana passada, o Brasil teve uma média diária de 9 mortes a cada milhão de habitantes, contra 0,1 entre britânicos e 1,7 nos EUA.

Isso significa que, para cada vítima britânica, houve 87 brasileiras e que morreram quase seis vezes mais brasileiros de Covid que americanos.

Ainda assim, há mais movimento em bares, shoppings e restaurantes no Brasil que no Reino Unido. Com 55% dos cidadãos vacinados com a primeira dose, os britânicos flexibilizam aos poucos as medidas de isolamento social, atentos à nova variante indiana que já ameaça a reabertura mais abrangente, inicialmente prevista para o meio do ano.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) afirma que distanciamento social e uso de máscaras são fundamentais para o combate ao vírus, especialmente em países que não estão com vacinação avançada.

Outro caso que chama a atenção é o de Israel, líder mundial na imunização e um dos primeiros a começarem a vacinar seus habitantes. Até a última quinta (20), 63% da população havia recebido o imunizante.

No início deste mês, o governo israelense já liberava eventos culturais com até 500 pessoas e removeu parte das restrições ao turismo internacional.

Nas duas últimas semanas, porém, os níveis de movimentação despencaram em razão do conflito com o Hamas.

O governo israelense e o grupo palestino anunciaram um cessar-fogo na última quinta (20), após dez dias de bombardeios. Houve mais de 240 mortos, a maioria deles palestinos.

No período anterior ao conflito, todavia, Israel apresentava movimentação no transporte público 14% menor que o observado antes da pandemia, e 11% menor em locais de lazer.

Números próximos aos que o Brasil registra agora, com porcentagem muito inferior de vacinados: 14% menos movimento no transporte em relação ao início de 2020 e 22% menos frequência em bares, shoppings e restaurantes.

O Google faz esse monitoramento a partir do deslocamento dos aparelhos móveis, como celulares e tablets. Os dados são anônimos, ou seja, não identificam os usuários.

No auge da quarentena, em março do ano passado, os índices no Brasil chegaram a -68%, na comparação com janeiro e fevereiro. Hoje, a taxa de óbitos diária é 140 vezes maior do que naquela época.

Naquele momento, havia maior adesão da população às medidas de distanciamento. Segundo o Datafolha, em abril do ano passado 72% estavam totalmente isolados ou saíam de casa somente quando era inevitável. Na última pesquisa, feita neste mês, o percentual caiu para 30%, o menor na pandemia.

Analistas afirmam que declarações do presidente Jair Bolsonaro com críticas ao distanciamento social, aliadas ao grande número de trabalhadores informais e ajuda financeira insuficiente para a população, são causas para a queda do apoio às restrições.

Já a Índia, que vive momento semelhante ao do Brasil no último mês de março, com nova variante e taxas de mortes em rápida ascensão, tem níveis muito superiores de confinamento.

Em meio à sua pior fase da pandemia até então, com 4.454 mortos e mais de 200 mil novos casos somente nesta segunda (24), os indianos conseguiram reduzir em 66% o movimento em locais de lazer e em 53% no transporte público, sempre na comparação com o início de 2020.

Os índices já chegaram a 88% e 73% em abril do ano passado, ainda no início da crise da Covid.

Embora seja o maior produtor mundial de vacinas, a Índia patina para imunizar sua gigantesca população de 1,4 bilhão de pessoas. Pouco mais de 10% receberam ao menos uma dose do fármaco contra o coronavírus.

Em números absolutos, isso representa 150 milhões de doses aplicadas, ou o suficiente para vacinar 93% dos brasileiros com mais de 18 anos.

Outro país que passa por escalada nos números é o Uruguai, até há pouco um exemplo de sucesso no combate à Covid com poucas medidas restritivas. As mortes pela doença, raríssimas no ano passado, dispararam no início de março.

Hoje, o país tem o maior número diário de mortes do mundo, quando considerado o tamanho da população: são 15 a cada milhão de habitantes (60% mais que a do Brasil atualmente), considerando a média móvel do último dia 20.

Análise genômica mostrou que a maioria das amostras coletadas em maio eram de pacientes contaminados com a variante de Manaus, mais transmissível, segundo alguns estudos.

Assim, os uruguaios vivem uma corrida entre o aumento de casos e a rapidez da vacinação, que tem avançado a passos largos. Os que já receberam ao menos uma dose são 44% da população.

O país tem aplicado imunizantes da Pfizer e da Sinovac, que exigem administração em duas doses. Para obter a imunização esperada, é necessário aguardar duas semanas após a aplicação da segunda dose.

Especialistas têm alertado para o fato de que apenas a vacinação não é suficiente para conter rapidamente a disseminação do vírus.

O governo uruguaio, que tinha chamado a atenção do mundo por ter adotado uma política de “liberdade com responsabilidade”, sem grandes medidas de isolamento, foi cobrado para rever sua posição e endurecer as regras a fim de combater a epidemia.

Em abril, o presidente Luis Lacalle Pou fechou cassinos, academias de ginástica e repartições públicas e proibiu espetáculos e eventos culturais. Também fechou escolas, que retornaram gradualmente às atividades neste mês, após leve melhora nos números da Covid.

Na última semana, o Uruguai apresentava uma redução média de 33% do movimento em locais de lazer e de 28% no transporte público, na comparação com o período pré-pandemia, isolamento maior que o brasileiro.

No auge da quarentena, em abril de 2020, esses índices entre os uruguaios giravam em torno de 60%.

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